“Ameaças e ataques contra minorias étnicas e religiosas são demasiado frequentes na Ásia, inclusive no sudeste da Ásia. Muitas vezes são alimentados através das redes sociais por atores religiosos e políticos irresponsáveis ou por grupos marginais que incendeiam paixões, raiva e violência”, afirmou em Díli.

Numa intervenção num encontro regional sobre diplomacia preventiva e alerta precoce, o Prémio Nobel da Paz disse que a decisão extraordinária do Sri Lanka de bloquear as redes sociais depois dos atentados, “reflete a crescente preocupação global, particularmente entre os governos, sobre a capacidade das redes de propriedade norte-americana de gerar violência”.

O ex-chefe de Estado referia-se aos oito atentados bombistas no domingo passado que mataram, pelo menos, 359 pessoas e provocaram mais de 500 feridos, tendo, segundo a polícia sido detidos já 58 suspeitos.

As autoridades atribuíram os ataques a um grupo extremista islâmico local, o National Thowheeth Jama'ath, embora considerem que o grupo teve apoio internacional.

Numa das medidas anunciadas imediatamente depois dos ataques, as autoridades do Sri Lanka bloquearam os acessos a redes sociais como o Facebook e o Whattsapp.

Ramos-Horta sublinhou que antes das redes sociais, os “líderes políticos, comunitários e religiosos irresponsáveis faziam uso de uma ferramenta mais básica, mas eficaz e disponível, o rádio, para disseminar a desinformação e as mentiras descaradas, alimentando medos e violência”.

Exemplos disso, referiu, são o genocídio de 1994 no Ruanda e os conflitos na Bósnia, “tragédias causadas em parte pelo uso deliberado de ferramentas de comunicação”.

Contudo, sustentou, se uma estação de rádio que esteja a “transmitir mensagens de ódio e violência” pode ser fechada facilmente, “é muito mais difícil para os governos adotarem leis que regulem as redes sociais e que garantam que os seus proprietários estrangeiros, que lucram com elas, e os utilizadores locais são responsáveis pelas suas ações”.

José Ramos-Horta falava em Díli na abertura de um encontro do Fórum Regional da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) sobre sobre o papel da diplomacia preventiva e de alertas prévios na resolução de conflitos, copresidido por Timor-Leste, Indonésia, Estados Unidos e Nova Zelândia.

O encontro de três dias tem como objetivo “aprofundar e melhorar a compreensão dos princípios da diplomacia preventiva” e “explorar formas sobre como a ASEAN pode reforçar a capacidade de impedir a escalada dos conflitos regionais através da implantação de mecanismos de alerta precoce e de resposta antecipada”.

O ex-Presidente timorense disse que na era das redes sociais “um conflito pode ser instantaneamente aceso com a publicação de rumores falsos e incendiários por seguidores de um determinado grupo étnico ou religioso baseado em qualquer lugar” do mundo e que pretendem “instigar tensões e conflitos no seu próprio país ou noutro país”.

“O Facebook e veículos de comunicação similares são facilitadores críticos da crescente onda de racismo e xenofobia, pois fornecem plataformas desimpedidas para demagogos e extremistas para recrutar, instigar e realizar ataques terroristas”, sublinhou.

Daí que, afirmou, é importante rever os mecanismos internacionais e regionais existentes sobre prevenção de conflitos e resolução de conflitos, em especial porque podem não conseguir responder adequadamente a novos focos de tensão e conflito.

Até aqui, destacou, esses mecanismos “giram em torno das causas tradicionais de conflito, nomeadamente, disparidades sociais, desemprego, pobreza extrema, perceção e ressentimento em relação a discriminação ou exclusão real ou percebida, conflitos étnicos ou tribais, conflitos sobre fronteiras e recursos, conflitos resultantes de rivalidades regionais”, entre outros.

“As Nações Unidas e as instituições multilaterais, como a UE, OSCE [Organização para a Segurança e Cooperação na Europa], UA [União Africana], OEA [Organização dos Estados Americanos], Liga dos Estados Árabes e ASEAN, têm ampla experiência e, por vezes, empregam recursos significativos na resolução de conflitos entre Estados. Mas a gama de conflitos intra-estatais e a sua natureza sensível dificultam as tentativas de prevenção e mediação por fóruns regionais e extra-regionais”, frisou.

Na reunião que decorre em Díli até sexta-feira participam representantes dos membros do Fórum Regional da ASEAN, nomeadamente a Austrália, Bangladesh, Brunei, Camboja, Canada, China, Coreia do Sul, Coreia do Norte, Estados Unidos, Índia, Indonésia, Japão, Laos, Malásia, Mongólia, Myanmar, Nova Zelândia, Paquistão, Papua Nova Guiné, Filipinas, Rússia, Singapura, Sri Lanka, Tailândia, Timor-Leste, União Europeia e Vietname.

O encontro conta ainda com representantes do Instituto da ASEAN para a Paz e Reconciliação e do Grupo de Pessoas Eminentes, de instituições e organizações nacionais e regionais envolvidas no alerta precoce e na paz e segurança, bem como daquelas que trabalham com mulheres, jovens e populações minoritárias.