Na 21.ª sessão do julgamento no Tribunal Central Criminal de Lisboa, o empresário, que está a ser ouvido na condição de testemunha, tem estado a explicar ao Ministério Público e ao coletivo de juízes os moldes da atuação da Doyen no mercado de transferências de jogadores, tendo assegurado que os tipos de contratos habitualmente estabelecidos com os clubes salvaguardavam o fundo de eventuais perdas de investimento.
“A Doyen não perdeu dinheiro. Com este tipo de negócios não perdia nunca”, atirou Nélio Lucas, em resposta sobre os riscos que recaíam sobre o fundo de investimento, sublinhando: “O risco da Doyen era o jogador não ser transferido e a valorização resumia-se ao juro, nunca mais de 10% ao ano”, acrescentou, após detalhar que a Doyen contratualizava a mesma percentagem de uma futura transferência em relação ao valor inicialmente investido.
CEO da Doyen entre 2011 e 2017, Nélio Lucas declarou que o fundo de investimento sediado em Malta “praticamente” não falava com os jogadores e que a “contraparte sempre foram os clubes”, recusando qualquer propriedade sobre os passes dos jogadores. Nesse sentido, observou que a Doyen preconizava contratos ‘TPI’ [third part investment] e não ‘TPO’ [third part ownership, na sigla em inglês], como veio a ser mais tarde proibido pela FIFA.
“Os jogadores nunca foram do fundo, eram dos clubes. Passavam a ser ativos dos clubes e os passes pertencem aos clubes. O nosso interesse era na revalorização, nós investíamos nos direitos económicos, que estavam associados ao direito federativo, o passe. O ativo é sempre do clube, nós temos a possibilidade de receber a valorização e o jogador não tinha qualquer obrigação contratual connosco”, vincou.
Diretamente questionado sobre a ligação ao Sporting e os negócios que existiram com o clube de Alvalade, nomeadamente dos jogadores Marcos Rojo e Zakaria Labyad, Nélio Lucas salientou que o emblema ‘leonino’ estava numa situação “extremamente complexa em 2012”, que “precisava de realizar capital” e que foi o Sporting, no tempo da presidência de Godinho Lopes, a procurar a Doyen para fazer negócios.
No caso em concreto de Rojo, que viria a originar um litígio entre o Sporting, já no mandato de Bruno de Carvalho, o antigo administrador da Doyen frisou que o fundo de investimento adiantou 75% do investimento de quatro milhões de euros na contratação ao Spartak Moscovo e que ficou responsável pelas três primeiras prestações, cabendo aos leões a quarta e última tranche. “Quando o Sporting deixa de ter o jogador nem tinha pagado a prestação”, notou.
Rui Pinto, de 31 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.
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