Em setembro do ano passado, o derretimento de uma geleira, na Gronelândia, desencadeou um deslizamento de terras que, por sua vez, originou um tsunami com cerca de 198 metros de altura. Como consequência, o planeta Terra tremeu durante nove dias e, até há bem pouco tempo, não havia explicação para o sucedido.

Agora, de acordo com um estudo publicado na revista Science, os cientistas dão conta de que a vibração foi apenas mais um alerta para as consequências do aumento das temperaturas globais, causadas pelos humanos, no Ártico.

No momento em que ocorreu o fenómeno, alguns sismólogos acharam que eram os seus instrumentos que estavam avariados ao captar as vibrações do solo.

Stephen Hicks, coautor do estudo e sismólogo no University College London, disse à CNN, que o tremor sentido "não era a rica orquestra de tons altos e estrondosos que se esperaria de um terremoto, mas mais um zumbido monótono".

Numa colaboração entre 68 cientistas, de 15 países, analisou-se os dados sísmicos, os dados de satélite e os dados do solo, além de terem sido simuladas ondas de tsunami, para entender o sucedido.

Mas, afinal, o que aconteceu na Gronelândia?

"Risco em cascata" é o nome que os autores do estudo dão ao fenómeno causado pelas mudanças climáticas.

No estudo, o grupo de investigadores explica que, durante alguns anos, a geleira situada na base de uma enorme montanha com quase 1.210 metros de altura, acima do Fiorde Dickson, estava a derreter.

À medida que o gelo ficava mais fino, a montanha tornava-se cada vez mais instável. A 16 de setembro de 2023, o geleira desabou, lançando rochas e detritos nas águas do Ártico.

O embate desencadeou uma onda que ficou presa no Fiorde, estreito e sinuoso, durante mais de uma semana, balançando-se para frente e para trás a cada 90 segundos. Com o nome de “seiche”, o movimento rítmico de uma onda num espaço fechado já era bem conhecido pelos cientistas, os mesmos só não sabiam que poderia durar tanto tempo.

“Se eu tivesse sugerido há um ano que um seiche poderia durar nove dias, as pessoas balançariam a cabeça e diriam que isso era impossível”, disse Svennevig, um outro especialista que participou no estudo. Os investigadores descobriram que foi esse mesmo seiche que criou a energia sísmica na crosta terrestre.

O desabamento da geleira, o deslizamento de terras e o tsunami, que causaram danos numa base militar abandonada, não deixaram feridos. No entanto, tudo aconteceu numa rota de cruzeiros, que é muito usada. Se alguém estivesse lá na época do ocorrido, “as consequências teriam sido devastadoras”, escreveram os autores do estudo.

Por sua vez, Paula Snook, geóloga de deslizamentos de terra da Universidade de Ciências Aplicadas da Noruega Ocidental, que não participou no estudo, confessa que as recentes avalanches de rochas no Ártico são um "sinal alarmante". "Estamos a descongelar o solo que estava congelado há milhares de anos”, acrescentou.

O leste da Gronelândia nunca tinha experimentado um deslizamento de terras e um tsunami nesta dimensão, o que mostra que o Ártico está a tornar-se propício a estes eventos climáticos. Nas últimas décadas, a região aqueceu quatro vezes mais rápido que o resto do mundo, o que aumenta a probabilidade de os tornar comuns.

“É lógico supor que veremos desabamentos de rochas mais frequentes em encostas à medida que as temperaturas aumentam nas regiões do Ártico”, alertou Lena Rubensdotter, investigadora do Serviço Geológico da Noruega, que também não esteve envolvida no estudo.

Svennevig alertou, no entanto, que noutras regiões como o Alasca, o Canadá ou a Noruega há fiordes semelhantes aquele onde ocorreu o fenómeno na Gronelândia, o que pode significar que o mesmo pode acontecer nestes locais.