“Ser mãe é mais do que dar à luz, ser mãe é amar mesmo de colo vazio”, afirmou Suzy Pinho Pereira, especialista em psicologia da gravidez e parentalidade positiva, destacando ser esta a frase que retrata as mães que passam por perdas gestacionais e neonatais.
A psicóloga, também formada em luto, integra o projeto ‘Amor para além da Lua’ e à Lusa destacou a importância de se abordar um tema que, segundo estima a Organização Mundial de Saúde (OMS) afeta anualmente 43 milhões de mulheres, mas que em Portugal “ainda é tabu”.
“Perante a sociedade, um bebé que não chega a nascer não é bebé, não existiu. Mas então, porque é que a mulher sofre tanto? Quando uma mulher diz que está a sofrer porque perdeu o bebé, por vezes, ouve coisas como, ‘mas ainda não era bebé’ ou ‘daqui a nada tens outro, não há problema’. Independente do número de semanas de gestação, é uma perda”, notou.
Retirar “a culpa” que as mães sentem pela perda é a principal missão da especialista, assim como auxiliar no processo de luto.
“Uma em cada quatro gravidezes não passa das quatro semanas de gestação e as mulheres não são preparadas para tal”, confessou, dizendo ser preciso “desmistificar que uma gravidez nem sempre corre bem”.
Foi com o propósito de ajudar as mães que passam por uma perda gestacional e neonatal que, em fevereiro de 2021, Renata Silva e Cláudia Caetano criaram o projeto ‘Amor para além da Lua’. Também elas passaram por esta perda.
“A única hipótese que me foi dada foi se queria ver o meu bebé. Perante aquela pergunta, optei por não ver. Achei que não ia aguentar, mas ninguém me disse que podia ter sido tirada uma fotografia, ou as impressões do pé ou da mão, ou guardar um bocadinho de cabelo. Havia várias hipóteses, mas única coisa que tenho do meu filho são ecografias", contou à Lusa Renata Silva.
A falta de informação em Portugal sobre a morte de um bebé ‘in utero’ ou a interrupção médica da gravidez levaram-nas a lançar uma plataforma com toda a informação sobre o “antes, durante e depois da perda”, que se debruça não só sobre os direitos, mas também sobre as memórias que as mães e pais podem guardar.
“Houve um casal que chegou até nós que me deixou muito sensibilizada porque, ao contrário de mim, a mãe já tinha lido a informação na nossa página, foi preparada e guardou memórias”, adiantou.
A importância de recordar o bebé levou-as as criar “caixas de memórias”, compostas por peluches, velas, mantas, certificado de vida, uma moldura, uma folha para guardar as impressões das mãos e dos pés do bebe, mas também um folheto informativo sobre a perda.
“Lançamos uma campanha de ‘crowdfunding’, sendo que o objetivo é oferecer as caixinhas a custo zero às maternidades e hospitais que assim o queiram”, esclareceu Renata, adiantando que algumas instituições de saúde da região Norte já demonstraram interesse.
Além da partilha de informação e de ciclos de partilha, o projeto ‘Amor para além da Lua’ pretende também sensibilizar as famílias, amigos, assim como os profissionais de saúde.
“Os próprios profissionais de saúde também querem melhorar, mas é preciso sensibilização e formação mais ampla a nível nacional”, acrescentou Renata Silva.
Apesar de três meses após uma perda gestacional a maioria das mulheres ficarem aptas fisicamente a engravidar, nem todas ficam aptas psicologicamente, alertou Suzy Pinho Pereira.
“Nunca conheci nenhuma mãe que ao fim de três meses estava apta a nível psicológico depois de uma perda e é importante explicarmos-lhes que está tudo bem em não estar bem”, acrescentou a especialista, em vespéra de se assinalar o Dia Internacional da Consciencialização da Perda Gestacional e Morte Neonatal.
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