O parlamento angolano discute quinta-feira, em Luanda, duas propostas de lei sobre repatriamento de capitais, com a discussão centrada na possibilidade de legalização de dinheiro obtido e retirado do país de forma ilícita.
Em causa está a Proposta de Lei de Repatriamento de Recursos Financeiros Domiciliados no Exterior do País, de iniciativa do Presidente da República, e que deverá ter o apoio do MPLA, maioritário no parlamento, e o Projeto de Lei do Regime Extraordinário de Regulação Patrimonial (RERP), de iniciativa da UNITA.
Este grupo de personalidades e ativistas angolanos critica a possibilidade de repatriamento de capitais sem perguntas e mantendo a titularidade dos fundos, por ser “injusta e, uma vez mais, beneficiar o infrator”, como explicou Luaty Beirão, um dos porta-vozes.
Num documento subscrito por mais de 300 pessoas, entre advogados, ativistas, estudantes, funcionários públicos e algumas personalidades da vida angolana, que hoje deu entrada no parlamento, dirigido ao presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos, fazem o alerta.
“Uma amnistia contra os crimes praticados não deverá, na nossa modesta opinião, excluir a devolução do dinheiro ilícito ao Estado”, lê-se na carta de alerta, a que a Lusa teve hoje acesso e que pede a “auscultação” da sociedade sobre esta matéria, reclamando opções “mais justas” que “devem ser impostas aos que ilicitamente adquiriram riqueza em Angola e que, entretanto, a guardaram fora de Angola”.
Estes subscritores assumem não se rever em nenhuma das duas propostas sobre a matéria, reclamando que 70% do dinheiro obtido ilicitamente, a repatriar ou já no país, seja revertido a favor do Estado e que o restante seja aplicado obrigatoriamente em projetos de desenvolvimento em Angola, além de afastar os prevaricadores dos negócios com o Estado angolano.
“Não podemos continuar a premiar aquelas que não tiveram remorsos em delapidar o Estado provocando situações calamitosas”, afirmou, por seu turno, Luaty Beirão, numa posição substancialmente diferente das propostas a discutir pelos deputados.
Ambas as propostas sobem à discussão e votação, na generalidade, na reunião plenária, extraordinária da Assembleia Nacional, agendada para quinta-feira.
É o caso da promovida pelo Presidente da República, permitindo repatriar depósitos no exterior sem fazer perguntas sobre a origem do dinheiro e a do maior partido da oposição, prevendo o pagamento ao Estado de uma taxa de 45% sobre o total.
A UNITA foi a primeira a avançar com uma proposta do género, segundo o líder parlamentar.
Adalberto da Costa Júnior afirma que o projeto de lei do RERP, que envolve a regularização de depósitos e património não declarado, foi entregue ao presidente do parlamento quase duas semanas antes de João Lourenço, chefe de Estado e vice-presidente do MPLA, ter anunciado, em dezembro, que estava em preparação regulamentação para permitir o repatriamento de depósitos no exterior sem investigações.
“No modelo anunciado pelo Presidente, quem roubou agora traz e fica com tudo. Não pode ser assim”, afirmou o deputado da UNITA, em declarações anteriores à Lusa.
As receitas provenientes do RERT, a vigorar até 30 de novembro de 2018, devem servir para financiar o Fundo de Erradicação da Pobreza, lê-se na proposta da UNITA a que a Lusa teve acesso.
Na proposta levada a plenária pelo Presidente da República, os angolanos com depósitos superiores a 100 mil dólares (83 mil euros) no estrangeiro e não declarados vão ter seis meses para fazer o seu repatriamento para Angola sem estarem sujeitos a qualquer investigação criminal, tributária ou cambial.
O documento prevê a “regularização de recursos, bens e direitos mantidos no exterior e o seu repatriamento, isentando do pagamento de quaisquer multas ou taxas e exclui a responsabilização criminal”.
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