"Foi horrível, horrível. Nunca vi um acidente tão grave, uma tragédia tão triste aqui em Vinhedo. Nunca imaginei que ia ver uma coisa assim", diz, tremendo, Lourdes da Silva Astolfo, que mora a alguns metros de onde o avião caiu na cidade, situada cerca de 80 quilómetros a noroeste de São Paulo.

Esta mulher, de 67 anos, que mora com o filho e o marido, estava prestes a sair de casa quando ouviu um estrondo e sentiu como se fosse um tremor. De repente, viu o avião quase em cima dela. Segundos depois, no meio de gritos, sentiu o impacto e viu uma espessa coluna de fumo a subir.

"Nós ficamos perdidos, perdidos. Aí, começámos a ligar para todo o lado, a pedir socorro", relata.

"Parece que fiquei sem chão" no momento do impacto, lembra, embora de seguida tenha percebido que a sua casa estava intacta. "Foi tão triste que nem consegui dormir", explica, a chorar.

O avião caiu no jardim de uma das dezenas de casas, muitas com piscina, da Residencial Recanto Florido, um condomínio situado numa área arborizada, distante do centro de Vinhedo, cidade com 76.000 habitantes.

A aeronave devia aterrar no aeroporto internacional de Guarulhos após a decolagem, duas horas antes, em Cascavel, no Paraná.

O avião caiu de barriga, mas com a velocidade e a força do impacto, ficou "achatado", com os passageiros presos nas ferragens, muitos "carbonizados" pela explosão que se seguiu à queda, explicou a tenente do Corpo de Bombeiros de São Paulo Olivia Perroni Cazo, que está entre os 200 efetivos que participam do complexo trabalho de recuperação dos corpos.

Cerca de 20 cadáveres já foram retirados das ferragens e estão a ser transferidos para o Instituto Médico Legal (IML) da cidade de São Paulo.

Desde que ocorreu o acidente, após o meio-dia de sexta-feira, na rua estreita que passa em frente ao condomínio, o movimento de patrulhas, veículos dos bombeiros e camiões não para.

A chuva não impede que alguns moradores de bairros vizinhos se aproximem para ver o que se passa ou perguntar o que se sabe sobre o acidente.

Vinhedo
Vinhedo A police forensic truck leave the Recanto Florido Condominium, where an airplane crashed with 61 people on board in Vinhedo, Sao Paulo State, Brazil, on August 10, 2024. An airplane carrying 57 passengers and four crew crashed on August 9 in Brazil's Sao Paulo state, killing everyone on board, local officials said. The aircraft, a French-made ATR 72-500 operated by the airline Voepass, was travelling from Cascavel in southern Parana state to Sao Paulo's Guarulhos international airport when it crashed in the city of Vinhedo. (Photo by NELSON ALMEIDA / AFP) créditos: AFP or licensors

"A sensação foi de terror, de pânico, impotência por não conseguir fazer absolutamente nada"

Os moradores do condomínio, ao contrário, estão, na sua maioria, resguardados nas suas casas.

Roberta Henrique, presidente da associação de moradores, sublinha a importância de respeitar a privacidade e a segurança de quem vive perto de onde ocorreu o acidente. Lembra que este é um momento "muito trágico" e que "apanhou todos de surpresa", deixando os moradores "assustados, psicologicamente abalados".

"A sensação foi de terror, de pânico, impotência por não conseguir fazer absolutamente nada para ajudar e simplesmente tentar salvar quem conseguia correr", diz à AFP.

"Realmente não estava ao alcance de ninguém fazer absolutamente nada. Essa foi a maior tristeza", acrescenta.

Alguns moradores, no entanto, cederam os jardins das suas casas para o trabalho logístico dos bombeiros, policiais e legistas. Vários também colaboram oferecendo bebidas ou algo para comer, conta Henrique, um morador de 38 anos.

Mas o cenário da tragédia, que se reduz ao perímetro do jardim de uma casa, está alargado a todos, inclusive jornalistas. Perante a insistência de um fotógrafo, um dos polícias que vigia a entrada do condomínio, diz: "Só tem ferros e corpos ali e, acredite em mim, você não vai querer publicar isto".