Com o subtítulo “Da coligação à ‘geringonça’”, o segundo volume de “Quinta-feira e outros dias” será publicado em 23 de outubro e apresentado no dia seguinte pela presidente da Fundação Champalimaud e antiga ministra da Saúde de Cavaco Silva, Leonor Beleza, de acordo com uma nota de imprensa divulgada hoje pela Porto Editora.
“O Governo PSD/CDS-PP passou por crises políticas graves, que exigiram da minha parte uma intervenção ativa, mas completou o comando da legislatura, assegurando o cumprimento dos compromissos assumidos pelo Estado. O país evitou um segundo resgate financeiro, reganhou o acesso aos mercados de financiamento externo e reencontrou uma trajetória de crescimento e criação de emprego. O Governo de coligação foi derrotado no parlamento após as eleições legislativas de outubro de 2015, sendo substituído por uma solução política inédita na nossa democracia, popularmente apelidada de ‘geringonça’”, lê-se na sinopse do livro, agora divulgada pela Porto Editora.
Na nota de imprensa são também revelados excertos de alguns capítulos, como sobre “a demissão irrevogável” de Paulo Portas, em 2013, do cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros, uma decisão de Cavaco Silva classifica como “um completo absurdo”.
“Fazer um comunicado anunciando a demissão em cima da posse da nova ministra das Finanças [Maria Luís Albuquerque], que teria lugar uma hora depois, parecia-me uma infantilidade pouco patriótica. Visava, propositadamente, destruir a credibilidade da nova titular da pasta, quer no plano interno, quer no plano externo. Absolutamente inaceitável”, escreve Cavaco Silva, que ocupou o cargo de Presidente da República entre 2006 e 2016.
Antes, no capítulo 11.º, Cavaco Silva fala sobre o processo de escolha de Joana Marques Vidal, em 2012, recordando que previamente à ‘luz verde’ para a sua nomeação, ouviu-a, procurando saber o que pensava sobre o funcionamento do Ministério Público.
Nessa conversa, o antigo Presidente da República revela como ficou surpreendido com a franqueza de Joana Marques Vidal (que irá abandonar o cargo na sexta-feira), que disse ser uma pessoa de esquerda e “vista como não alinhada com o Governo” então em funções.
Sobre “o parto do XXI Governo”, a geringonça, o antigo chefe de Estado, recorda a “posição dominante do PS desde os tempos da liderança de Mário Soares” sobre a impossibilidade de entendimentos com o PCP e o BE.
“Os líderes do PS com quem trabalhara como Presidente da República, José Sócrates e António José Seguro, haviam sido sempre categóricos na afirmação de que o PCP e o Bloco de Esquerda eram partidos em quem não se podiam confiar, empenhados em criar um clima revolucionário no país e minar os alicerces da nossa democracia de tipo ocidental”, refere Cavaco Silva, lembrando que também António Costa, já depois de ter sido eleito secretário-geral socialista, dissera-lhe, a propósito das opções estratégicas no plano externo, que entendimentos com comunistas e bloquistas “seriam impossíveis”.
No capítulo seguinte - o 22.º intitulado “um primeiro-ministro entre dois fogos”, Cavaco Silva conclui mesmo que “o primeiro ano do Governo do PS presidido por António Costa não foi bom para o país”, tendo-se construído uma “narrativa culpabilizadora” do executivo anterior liderado por Pedro Passos Coelho.
Repetindo uma expressão que ainda enquanto Presidente da República chegou a utilizar, Cavaco Silva refere que, tal como ele próprio antevira em dezembro de 2015, “no campo económico a realidade derrotou a ideologia”, com custos para todos os portugueses.
“A ostensiva retórica do ‘virar a página da austeridade’ permitiu iludir durante algum tempo, mas não todo. No princípio de 2017, já muitos tinham percebido que, virada a página apenas para alguns, a austeridade continuava patente na ausência de investimento público, nas cativações, na deterioração da qualidade dos serviços públicos e nos impostos, com a carga fiscal a crescer para níveis nunca vistos”, lê-se no 22.º capítulo.
Nas 536 página do segundo volume das suas memórias, Cavaco Silva fala ainda “o compromisso de Salvação Nacional”, “a dívida pública e os masoquistas”, “o período pós-troika e o Tribunal Constitucional”, “o orçamento do Estado para 2013 e os humores na coligação”, a privatização da TAP e a não privatização da RTP, as Forças Armadas, entre outros temas.
O primeiro volume de “Quinta feira e outros dias” foi lançado em fevereiro de 2017.
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