Para o Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados, a transferência de Neto de Moura, decidida pelo Tribunal da Relação do Porto, vai manter o problema, uma vez que o juiz desembargador terá que apreciar em recurso processos de divórcio e de regulação das responsabilidades parentais.
“A simples mudança para uma secção cível equivale a manter o problema de fundo: se o problema está, como parece, numa certa compreensão da vida e da realidade por parte do Desembargador Neto de Moura, em particular nas questões de índole familiar e conjugal, não faltarão ocasiões para essa compreensão vir novamente ao de cima, reacendendo toda a polémica”, sublinha o Conselho Regional do Porto da Ordem, hoje em comunicado.
No seu entender, “há o sério risco de a comunidade, em cujo nome os tribunais aplicam as leis, entender que essa solução é guiada pelo simples intuito de proteger o desembargador Neto de Moura do clamor que as suas decisões têm causado na comunidade, ficando tudo o mais por analisar e resolver”.
Para o Conselho Regional do Porto, a questão que se coloca no plano da cidadania e da justiça é bem clara: “Saber se a comunidade pode conviver com decisões e entendimentos como os expressos pelo desembargador Neto de Moura”.
Salienta ainda que, em regra, “o problema não está na lei, mas no modo como a mesma é (mal) interpretada e aplicada em muitos processos (que não apenas os do Desembargador Neto de Moura)”.
O Conselho Regional do Porto espera que se aproveite o “caso Neto de Moura” para repensar questões tão sérias como o acesso à magistratura judicial, a progressão na carreira, a fiscalização e a inspeção dos Juízes, a sua formação contínua.
“Enfim, tudo quanto contribua para uma autêntica legitimação dos Tribunais e dos Juízes, o que também permitirá enfrentar casos patológicos, que, sendo embora excecionais, não podem ser tolerados, nem tratados de modo displicente, gerando incompreensão na comunidade”, salienta o comunicado.
Neto de Moura, que se encontrava na 1.ª secção criminal, tem sido criticado por decisões judiciais em casos de violência doméstica.
Num dos casos, o juiz desembargador Neto de Moura foi autor de um acórdão em que minimizou um caso de violência doméstica pelo facto de a mulher agredida ter cometido adultério.
No acórdão, datado de 11 de outubro de 2017, o juiz invocou a Bíblia, o Código Penal de 1886 e até civilizações que punem o adultério com pena de morte, para justificar a violência cometida contra a mulher em causa por parte do marido e do amante, que foram condenados a pena suspensa na primeira instância.
“O adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher”, lê-se na decisão do tribunal superior, também assinada pela desembargadora Maria Luísa Abrantes.
Na sequência deste caso, o Conselho Superior da Magistratura instaurou um processo de inquérito, tendo deliberado aplicar ao juiz a sanção de advertência registada.
Num outro caso noticiado mais recentemente surgiram críticas à decisão do juiz desembargador Neto de Moura de mandar retirar a pulseira eletrónica a um homem que foi condenado pelo crime de violência doméstica, depois de ter rompido o tímpano à companheira com um soco.
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