Afinal Porto e Lisboa estão ou não mais inseguras? Câmaras e PSP com versões contraditórias

As duas principais cidades do país registam cada vez mais crimes e as autoridades estão prontas para atuar. Mas afinal o que se está a passar no Porto e Lisboa?
Afinal Porto e Lisboa estão ou não mais inseguras? Câmaras e PSP com versões contraditórias

As preocupações começaram quando os autarcas das duas principais cidades se insurgiram contra a falta de segurança nas cidades e pediram apoio ao governo para colmatar as dificuldades.

Em Lisboa, Carlos Moedas manifestou-se preocupado com a insegurança na freguesia de Santa Maria Maior e defendeu um reforço do policiamento, em entrevista à rádio Renascença.

Assaltos a viaturas e a lojas, consumo de droga em plena luz do dia e agressões físicas foram algumas das situações relatadas pelos moradores de Santa Maria Maior.

Na entrevista à Renascença, Carlos Moedas admitiu que a criminalidade tem vindo a aumentar e mostrou-se disponível para encontrar soluções que ajudem a mitigar o problema, instando também o Governo.

“Pedi ao Governo na altura (do PS) e continuo a pedir hoje 200 polícias municipais, obtive apenas 25. Também precisamos de mais agentes da PSP na rua e isso é uma responsabilidade do Governo”, sublinhou.

O autarca adiantou ainda que vai disponibilizar um edifício para acolher uma esquadra da PSP, na Praça da Alegria.

O presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho (PS), defendeu medidas como a instalação de uma rede de videovigilância, o fim do licenciamento zero, a alteração dos horários dos estabelecimentos comerciais, a proibição da venda de álcool para a rua a partir das 21h00 e o categorização de Santa Maria Maior como uma zona crítica.

Já no Porto, Rui Moreira, defendeu no início deste mês, que existirem "razões objetivas" para falar de um aumento de insegurança na cidade e que esta já "não é apenas uma questão de perceção".

"Estamos objetivamente preocupados com a segurança na cidade. Não é apenas uma perceção de insegurança. Há razões objetivas para dizermos que há um aumento de insegurança na cidade", afirmou Rui Moreira.

"No Porto, em comparação com 2022, a criminalidade geral aumentou 8,4% e a criminalidade violenta aumentou 4,4%", detalhou, lembrando ainda que muitas das queixas não são atualmente denunciadas.

Na Polícia Municipal do Porto existem atualmente 189 agentes, sendo necessário um reforço de 100 agentes. À ministra, manifestou Rui Moreira, foi solicitado que "o contingente que está prometido seja disponibilizado o mais depressa possível".

No entender do autarca, um dos problemas que agrava a falta de efetivos passa pela localização, em Torres Novas, da escola de formação de agentes, defendendo que deveria existir um polo na zona Norte.

Neste contexto e depois de se reunir com a nova ministra da Administração Interna, Rui Moreira, revelou que a adjudicação do contrato para a instalação de mais 117 câmaras de videovigilância na zona ocidental e oriental da cidade está suspensa por faltar um parecer da Comissão Nacional da Proteção de Dados (CNPD).

As novas 117 câmaras de videovigilância vão ser instaladas na zona ocidental e oriental da cidade, nomeadamente, em arruamentos na zona da Asprela, Campanhã, Estádio do Dragão, Pasteleira e Diogo Botelho.

Segundo o autarca, está a ser equacionado o alargamento do primeiro sistema instalado no centro histórico, e composto por 79 câmaras, para a Rua do Loureiro e a Rua Chã, junto à estação de S. Bento, porque lojistas da comunidade do Bangladesh têm referido “que tem havido ali um conjunto de assaltos”.

As principais queixas surgem nesta cidade na freguesia de Ramalde onde se tem registado um aumento da criminalidade, segundo a autarquia.

Neste sentido, Rui Moreira disse estar disponível para avançar com uma terceira fase do sistema de videovigilância, a instalar na zona de Ramalde, a segunda maior freguesia do Porto, mas para isso "é necessário o diagnóstico da PSP da perigosidade da criminalidade associada ao território".

Este sistema de videovigilância entrou em funcionamento em 22 de junho de 2023 e já permitiu preservar imagens relativas a 910 processos-crime, a maioria das quais (592) ocorridas este ano.

O que diz a PSP?

No caso das autarquias, ambas confirmaram ao SAPO24 que registam o aumento da criminalidade baseando-se no Relatório Anual de Segurança Interna 2023 (RASI) que revela efetivamente que, “o número total de participações criminais registadas em 2023 (…) foi de 371.995, mais 28.150 participações que no período homólogo de 2022”.

Quanto à prevenção e investigação da criminalidade grave, violenta, altamente organizada e complexa, o Sistema de Segurança Interna verificou “uma subida face ao ano anterior, tendo-se registado 14.022 participações de criminalidade violenta e grave, representando um aumento de 5,6 por cento”.

De acordo com o RASI, nas questões de criminalidade sexual, “o maior número de inquérito iniciados está associado aos crimes de abuso sexual de crianças, de violação e de pornografia de menores”, sendo o perpetrado, “na sua esmagadora maioria, por indivíduos do sexo masculino contra indivíduos do sexo feminino, que se prevalecem do relacionamento familiar, em particular com vítimas entre os 8 e os 13 anos”.

O Relatório Anual de Segurança Interna destaca também o aumento da violência associada a grupos juvenis e jovens motivada por rivalidades entre grupos oriundos de diferentes zonas ou bairros da área metropolitana de Lisboa.

“No que respeita à criminalidade grupal foram efetuadas 2.048 detenções (+13,1 por cento). Relativamente à violência efetuada no âmbito grupal, tem-se assistido, no período pós-confinamento, a um acréscimo na conflitualidade e no nível de violência empregue”.

Já a delinquência juvenil, que compreende crimes praticados por jovens entre os 12 e os 16 anos, registou um aumento de 8,7 por cento, num total de 1.833, número mais alto desde 2017. Os suspeitos são jovens com idades compreendidas entre os 15 e 25 anos de idade, sendo um fenómeno que tem tido uma considerável expressão na Área Metropolitana de Lisboa.

“Continuam a verificar-se algumas dinâmicas associadas a rivalidades entre grupos oriundos de diferentes zonas ou bairros da área metropolitana. Esses conflitos costumam ser referidos em músicas e videoclips de subculturas musicais que apresentam referências hiperlocais e hiperpessoais (especificamente a uma área geográfica, ocorrência em particular, indivíduo ou data específica)”, lê-se no documento, que salienta também “o papel desempenhado pelo digital, nomeadamente as redes sociais, que se apresentam como extensão do grupo e do próprio bairro".

Relativamente à delinquência juvenil, o RASI dá conta que ao longo dos anos de 2022 e 2023, foram realizadas algumas investigações e operações levadas a cabo pelas forças e serviços de segurança, mas mesmo assim deve existir “um número considerável de cifras negras (crimes não reportados)".

"Nota-se ainda uma tendência de episódios (alguns não denunciados) junto de estabelecimentos de ensino, provavelmente porque os autores conhecem algumas rotinas das vítimas e os estabelecimentos que frequentam”, salienta o relatório, que sublinha que existem grupos associados ao tráfico de droga, nomeadamente os grupos que se dedicam à venda a retalho, com uma presença mais localizada junto dos principais pontos de venda das duas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.

Nas escolas, a Segurança Interna observou “um aumento global de ocorrências em ambiente escolar e de ocorrências de natureza criminal”, nomeadamente furtos, roubos e tráfico de estupefacientes de menor gravidade.

“Nesta matéria específica realizaram-se ações de policiamento e de sensibilização junto de escolas, abrangendo a prevenção rodoviária, o bullying, maus-tratos, os abusos sexuais e os direitos das crianças”.

O RASI de 2023 revela também haver um aumento de 19,4 por cento dos crimes ligados ao tráfico e consumo de estupefacientes, face ao ano anterior. O documento dá igualmente conta de um "aumento substancial” da atividade criminosa de tráfico de droga e quantidades apreendidas.

Contactada pelo SAPO24 a PSP sublinhou que ambas as autarquias remetem o aumento da criminalidade para este relatório, no entanto, de acordo com números que "reportam ao presente ano", não registam um aumento da criminalidade, em especial nas freguesias apontadas como problemáticas pelas autarquias (Santa Maria Maior e Ramalde).

Numa nota, a PSP realçou que, segundo a análise dos dados estatísticos que tem, na freguesia de Ramalde existiu, “de facto, um aumento da criminalidade geral”, mas “a criminalidade violenta e grave diminuiu, o que importa sublinhar publicamente”.

Por outro lado, na freguesia de Santa Maria Maior, em Lisboa, “tanto a criminalidade geral como a criminalidade violenta e grave diminuíram, comparando com o período homólogo do ano transato”, acrescentou.

A PSP, a autoridade competente para policiamento em Lisboa e no Porto, assegurou que analisa, “diariamente, os indicadores estatísticos na sua área de responsabilidade” para “orientar os seus recursos de acordo com as áreas mais afetadas por determinados tipos de fenómenos criminais”.

Na nota, a PSP assegurou ainda que “tem consecutivamente, sempre que possível e com o balanceamento de meios, incrementado o policiamento nas cidades de Lisboa e do Porto, e em concreto nestas duas freguesias”.

“É também importante esclarecer que o sentimento de segurança não se obtém exclusivamente com mais polícias na rua, sabendo-se que a presença sistemática de policiamento ostensivo pode ser avaliado, em termos de sentimento de segurança, de forma contrária - se há polícia é porque há insegurança”,considerou.

A PSP defendeu ainda que “é também importante detetar, analisar e intervir junto de diferentes problemas socioculturais e económicos existentes nestes e noutros territórios, procurando responder de forma integrada e permanente nas diferentes fragilidades locais”, realçando que contam ”com o apoio de todas as entidades com responsabilidade” nestas matérias.

Esta análise da PSP "é feita com base na criminalidade denunciada, ou seja, nas denúncias recebidas (haja ou não procedimento criminal por parte das vítimas), e com base nos crimes dos quais a PSP tem conhecimento (ainda que por terceiros)", esclarece a autoridade.

"Se ocorrerem crimes dos quais a PSP não tem conhecimento, tal contribui para as cifras negras, razão pela qual é fulcral que a sociedade civil tenha consciência do papel que tem na denúncia da criminalidade e, consequentemente, no planeamento de medidas a implementar para a diminuição da mesma e aumento do sentimento de segurança", referiram ao SAPO24.

O que está a fazer o governo?

Confrontada com este problema a ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, prometeu que as ações de policiamento vão "continuar a ser reforçadas" nas cidades do Porto e Lisboa, sublinhando que o número de operacionais vai aumentar ainda este verão.

A ministra disse que este reforço é parte do programa “Verão Seguro 2024”, que começou em 15 de junho.

“Vão ser destacados mais elementos a acrescentar aos operacionais que já são afetos” ao Porto e a Lisboa e “vão decorrer ações de policiamento a pé”, que é a “vertente em quais pessoas se sentem mais seguras”.

A ministra respondia aos jornalistas à margem da entrega de equipamentos e viaturas para a Guarda Nacional Republicana (GNR) e de equipamento para os polícias portugueses destacados para os Jogos Olímpicos de Paris, na Escola da Guarda, em Queluz, Lisboa,

Margarida Blasco explicou que as forças de segurança vão recorrer aos formados dos “três ou quatro últimos cursos”.

“São 800 pessoas para distribuir por todo Portugal e os seus pontos mais críticos”, detalhou.

Margarida Blasco garantiu que o Governo tem mantido o contacto com “os presidentes das câmaras e com as autoridades locais e com as associações”.

A ministra sublinhou ainda que “a PSP também estará presente” nos aeroportos e que essa “é uma função que vai ser bastante necessária com o reforço do turismo que nesta altura do ano sempre acontece”.

*Com Lusa

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