“Muitas das medidas que se tomaram excecionalmente para a pandemia deviam passar estruturais para resolver os problemas sobretudo na área dos recursos humanos, que é o principal défice. E, mesmo assim, se calhar não chegava”, afirmou João Oliveira.
Em declarações à Lusa sobre as dificuldades que o IPO enfrentou durante a pandemia, apesar de as paragens impostas na atividade assistencial (cirurgias, consultas e tratamentos) não terem abrangido os institutos de oncologia (Lisboa, Coimbra e Porto), João Oliveira lembra que o esvaziamento de pessoal é geral em todos os serviços públicos, mas na saúde “nota-se demasiado”.
“Nota-se demasiado o esvaziamento de competências técnicas por falta de competitividade com o setor privado”, afirmou o responsável.
As consultas, tratamentos e cirurgias não diminuíram nos IPO tanto como nos hospitais gerais, mas ainda assim sofreram uma redução, que João Oliveira justifica com a diminuição da referenciação dos centros de saúde e com o facto de alguns profissionais terem ficado também infetados com o novo coronavírus.
“Sobretudo nos meses de abril e maio tivemos de diminuir a atividade por causa da infeção de alguns profissionais”, explicou o responsável, sublinhando: “Não é preciso estarem muitos infetados porque o pessoal já é muito à conta e, por isso, a falta de poucas pessoas tem uma repercussão muito grande”.
E exemplificou: “A falta de um assistente operacional, que não é um profissional tão diferenciado como outros que cá temos, é capaz de parar metade de um do bloco operatório” e “nalguns laboratórios, a pessoa que lava os tubos de ensaio, as pipetas, às tantas é mais indispensável, por ser a única”.
Reconhece que ao longo do ano passado foram tomadas algumas medidas de emergência para o recrutamento que surtiram efeito, mas diz que, nalguns casos, houve dificuldade de encontrar pessoas disponíveis, por falta de profissionais de algumas especialidades e porque as condições, “mesmo as que eram melhores, eram melhores transitoriamente”.
“O que aconteceu durante o ano de 2020 mostra bem que o tipo de organização do Serviço Nacional de Saúde é muito mais adequado a dar respostas a grandes problemas de saúde e que, portanto, não é a mesma coisa ter pessoal no serviço público ou ter pessoal nos serviços privados, sobretudo em termos daquilo que se consegue fazer”, considerou.
Defende que “o pessoal nos serviços públicos é mais bem aproveitado” e sublinha a forma como está idealizado um serviço como o Serviço Nacional de Saúde (SNS), destacando a integração dos cuidados primários e hospitalares e a possibilidade de funcionarem em rede, transferindo doentes de um lado para o outro.
“Os hospitais funcionam de forma combinada, fazem parte da mesma instituição, que é o SNS, não são peças separadas”, afirmou.
Podiam estar mais ligados e funcionar melhor em rede? “É verdade, mas mesmo sem estar a ser aproveitado ao máximo, só pelo facto de estar organizado assim, conseguiu resolver os problemas de emergentes de uma pandemia”.
“O tipo de organização que o SNS tem e o facto de as suas finalidades serem de serviço público, e não de lucrar com a prestação de cuidados, faz com que tenha como objetivo imediato e único resolver os problemas” e não avaliar se, do ponto de vista económico, isso compensa.
E a resposta seria ainda melhor se a gestão dos seus recursos humanos não tivesse de funcionar tão no limite, afirmou.
João Oliveira disse que, em termos de funcionamento, os preceitos exigidos pela pandemia - como a testagem de quem entra, de quem é operado e de quem faz tratamentos – envolvem uma logística que “consome muito pessoal, além dos gastos em meios de proteção individual, que são maiores”.
“Há um grande consumo de pessoal pois há muito mais a fazer para poder tratar as pessoas”, disse, exemplificando que, no IPO de Lisboa, alguns espaços deixaram de ter condições para determinados atos, por causa das exigências da pandemia, e que foram necessárias obras.
Hoje “tudo consome mais trabalho e mais esforço dos profissionais, que, apesar de tudo, responderam de forma extraordinária e foram incansáveis”.
“Conseguimos dar resposta, mas não se aguentam níveis de esforço e de utilização de recursos humanos estes durante muito tempo sem que se reconheça que os serviços públicos de saúde têm de ter redundâncias de pessoal, em quantidade e em qualidade”, sublinhou.
João Oliveira defende ainda que esta redundância é necessária para que os serviços de saúde possam ter elasticidade suficiente para responder às flutuações de procura, para não estarem sempre nos limites da resistência dos profissionais, para não se repercutir sobre a qualidade dos cuidados prestados aos doentes.
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