"Se a pausa não for muito prolongada, retomaremos o ritmo que estávamos a ter com a vacina da AstraZeneca e recuperamos muito rapidamente esta pausa, que é uma pausa de cinco, seis dias… o que for necessário para se esclarecer a dúvida que existe neste momento", disse em entrevista à agência Lusa o vice-almirante Henrique Gouveia e Melo.
Relativamente à decisão da suspensão da vacina disse: “Não tenho de estar de acordo, nem deixar de estar de acordo. É uma decisão de duas autoridades: a autoridade de saúde, que é a Direção-Geral da Saúde (DGS) e a autoridade do medicamento, que é o Infarmed. A minha função, enquanto coordenador do plano, é adaptar o plano às circunstâncias que existem neste momento”, afirmou, acrescentando: “Tenho de respeitar as orientações desses órgãos”.
Questionado sobre a mudança em apenas 24 horas da decisão de DGS e Infarmed sobre a segurança da continuidade da administração da vacina desenvolvida pelo laboratório sueco e a Universidade de Oxford, o coordenador da ‘task force’ defendeu que a explicação cabe a essas duas autoridades.
“Não sou eu que tenho de explicar isso. Quem tem de explicar é a DGS e o Infarmed. No entanto, posso dizer que há uma instabilidade na informação e havendo instabilidade na informação e havendo novos dados, as decisões, muitas vezes, não podem ser mantidas. Mesmo que seja de um dia para o outro”, observou.
Com cerca de 400 mil vacinas da AstraZeneca recebidas, 230 mil já administradas e 170 mil guardadas em armazém, o responsável pelo plano de vacinação manifestou a confiança num esclarecimento rápido da situação, que possa ocorrer “em cinco, seis dias” e respetiva retomada da vacinação nesse mesmo período.
O almirante garantiu, no entanto, que a decisão de Portugal passou por uma “pausa” e não uma suspensão.
“Não é uma suspensão, é uma pausa. Não há nada que indique que vá haver uma suspensão da vacina. Há uma pausa para avaliar os dados de forma cautelar, evitando continuar a vacinar enquanto não se tiver uma certeza maior sobre o que aconteceu e os casos que foram descritos como sendo casos graves de reação, que não se consegue perceber se é reação ou não à vacinação. Enquanto isso não estiver clarificado, a vacinação foi posta em pausa”, explicou.
Henrique Gouveia e Melo reiterou que a vacina da AstraZeneca “é uma vacina segura”, à semelhança do que referiu já hoje o primeiro-ministro, António Costa, e lembrou que “há países que não pararam e continuam a vacinar, países com sistemas muito fortes” ao nível da regulação e investigação em saúde.
“Tenho a expectativa que seja uma pausa curta, uma pausa cautelar e que logo que estejam reunidas as condições para o nosso regulador e a nossa DGS se sentirem confortáveis com as investigações que, entretanto, vão ser discutidas na EMA [regulador europeu] se reinicie o processo normalmente, porque a vacina é uma vacina segura, tudo indica que é uma vacina segura. E os dados são dados que de forma muito difícil têm uma relação de causa efeito com a vacina”, frisou.
Contudo, o coordenador admitiu consequências negativas para o processo de vacinação em curso se a pausa se prolongar por muito tempo, ao reconhecer que, além do assumido atraso na vacinação dos docentes e auxiliares do pré-escolar e primeiro ciclo prevista para este fim de semana, “afetará necessariamente o mês de abril”, levando a primeira fase, que terminaria “em meados de abril”, a acabar “uma semana depois”.
Portugal seguiu na segunda-feira o exemplo de mais de uma dezena de países, entre os quais Espanha, Itália, França e Alemanha, e suspendeu “por precaução” a administração da vacina contra a covid-19 da AstraZeneca. A decisão foi anunciada pela DGS e pelo Infarmed e surgiu após vários países europeus também já terem suspendido a administração desta vacina devido a relatos de aparecimento de coágulos sanguíneos em pessoas vacinadas.
Henrique Gouveia e Melo admite “perigo” de reforço de movimentos antivacinas
A suspensão temporária da administração da vacina contra a covid-19 da AstraZeneca e Universidade de Oxford pode levantar o “perigo” de reforçar movimentos antivacinas em Portugal, reconheceu hoje o coordenador da ‘task force’.
O vice-almirante Henrique Gouveia e Melo assumiu não ter conhecimento até ao momento da recusa de pessoas em serem vacinadas, independentemente do fabricante, e considerou que se “as que há, porventura, são residuais”. No entanto, não descartou que as dúvidas agora existentes em torno desta vacina possam ter um efeito de contágio sobre o plano de vacinação.
“Há sempre esse perigo. Claro que temos de temer a criação de dúvidas no espírito das pessoas que faça que possam ter um maior receio no processo de vacinação como um todo e, em especial, de uma determinada vacina”, disse o responsável pelo plano, sem manifestar reservas para qual dos “dois pratos da balança” pende a sua análise.
“Num prato existem algumas dúvidas que devem ser esclarecidas, mas do outro há um benefício extraordinário e esse é claro: a vacinação salva milhares de pessoas. Portanto, do outro lado temos uma dúvida e do outro lado temos uma vacina que salva milhares de pessoas. Quem vai tomar a vacina deve ponderar se prefere estar do lado em que há milhares de pessoas a serem salvas ou de uma dúvida que, se calhar, é uma dúvida que nem tem relação causa-efeito”, sublinhou.
O país tinha inicialmente uma previsão de receção de 4,2 milhões de vacinas da AstraZeneca no segundo trimestre, que foi entretanto revista em baixa para 1,4 milhões e cuja concretização “ainda assim está a ser discutida”, segundo Henrique Gouveia e Melo.
Apesar das dúvidas em torno de um prazo para o fim da suspensão da administração, o coordenador da ‘task force’ considerou que a situação vai passar ao lado do atual desconfinamento.
“Não creio que vá comprometer o processo de desconfinamento. De qualquer forma, a proteção dos professores [poder ser] uma semana atrasada, pode ter algum impacto, mas não julgo que seja muito significativo. Não vai comprometer o desconfinamento, não me parece que haja essa relação de causa-efeito”, notou, aludindo à inoculação com esta vacina de docentes e auxiliares do pré-escolar e 1.º ciclo que estava agendada para este fim de semana.
[João Paulo Godinho e Luísa Meireles (texto)]
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