O acórdão do TRP, datado de 07 de julho e a que a Lusa teve hoje acesso, determinou o reenvio do processo para novo julgamento, tendo por objeto a averiguação de factos que permitam a demonstração, ou não, da existência de dolo, por parte das duas arguidas, que à data dos factos eram gerentes de empresas de publicidade em listas telefónicas.
Os juízes desembargadores concluíram que a factualidade provada é “escassa ou curta” para que através dela se possa concluir que as arguidas “cometeram o crime por que foram condenadas, com dolo, através da conduta omissiva” que o tribunal da primeira instância considerou existir.
“Só a omissão dolosa de dever de vigilância de um dirigente de uma pessoa coletiva o pode responsabilizar pela prática de um crime de burla praticado por um seu subordinado”, lê-se no acórdão.
As duas arguidas foram condenadas em novembro de 2020, no Tribunal de Santa Maria da Feira, a quatro anos e a três anos de prisão, por um crime de burla qualificada.
Ambas as penas foram suspensas por cinco anos com a condição de as arguidas pagarem ao padre pouco mais de cem mil euros a título de indemnização por danos patrimoniais.
O Tribunal deu como provado que as arguidas atuaram, em representação e no interesse das sociedades que legalmente representavam, agindo com o propósito, concretizado, de enganar, como efetivamente enganaram o padre, obtendo à sua custa como representante das paróquias proventos económicos a que sabiam não ter direito.
O processo chegou a ter mais cinco arguidos (três individuais e duas empresas) que chegaram a acordo com o pároco, antes do início do julgamento, para pagar parte dos prejuízos alegadamente causados.
Segundo a acusação do Ministério Público (MP), o esquema durou entre agosto de 2010 e fevereiro de 2011, causando um prejuízo de cerca de 120 mil euros às paróquias de Milheirós de Poiares (Feira) e Macieira de Sarnes (Oliveira de Azeméis), onde o padre exercia funções.
Durante este período, os arguidos terão contactado dezenas de vezes o pároco, convencendo-o a pagar faturas de publicidade em listas telefónicas, inserida à sua revelia e sem a prévia assinatura de contrato publicitário.
A vítima estranhava os contactos porque sabia que não tinha celebrado nenhum contrato de publicidade, mas os arguidos ameaçavam que se não pagasse a dívida esta iria ser exigida judicialmente e o padre, devido ao seu estado de saúde e à sua idade avançada, acabava por fazer o pagamento.
“A Paróquia, como instituição de acolhimento a quem precisa, não se pode dar ao luxo de gastar/esbanjar dinheiro, que é fruto das ofertas dos fiéis, em coisas supérfluas, quando tem tantas carências a quem dar resposta imediata (…). Já gastámos convosco muito para além do nosso parco orçamento. E o povo não nos perdoa!”, escreveu o padre, numa carta enviada a uma das empresas, onde pedia o cancelamento de futuras edições.
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