“Espero que não seja para sempre, mas hoje é um dia triste”, disse à Lusa José Fiandeiro, salientando que com o encerramento da loja histórica ficam no desemprego ele próprio e dois funcionários, que ali trabalham “desde miúdos” e que agora têm idades entre os 58 e os 60 anos.
Os dirigentes da sapataria Deusa foram avisados na semana passada que teriam de sair, depois de o Tribunal da Relação ter dado provimento a um recurso de uma ação de despejo interposta pelo senhorio, mas pediram “que houvesse mais um tempo” para se organizarem.
“Hoje apareceram sem avisar a dizer-nos para entregarmos a chave, com a polícia, e que iriam mudar a fechadura e foi o que fizeram”, disse José Fiandeiro, salientando que já não abre da parte da tarde.
José Fiandeiro explicou à Lusa que os últimos anos têm sido complicados para a sapataria Deusa, longe dos tempos áureos em que as senhoras faziam filas à porta para comprar sapatos de qualidade.
A empresa entrou em insolvência há uns anos, tendo sido homologado pelo tribunal, em 2018, um plano de recuperação que envolve pagamentos à Autoridade Tributária e à Segurança Social, que estavam a ser cumpridos.
Entretanto, o senhorio do edifício, “um fundo imobiliário estrangeiro”, interpôs em tribunal, em 2019, uma ordem de despejo da loja, o que lhe foi negado em primeira instância, contou.
No entanto, o Tribunal da Relação deu agora razão ao recurso do senhorio, alegando que o administrador de insolvência deveria ter praticado um ato que não praticou, acrescentou o responsável pela loja.
De acordo com este funcionário, o senhorio pretenderá transformar o edifício “em mais um hotel numa Baixa que já não tem comércio nem gente, porque os mais velhos ou morrem ou são empurrados dali para fora”, já que soube que terá dado entrada na Câmara Municipal um pedido nesse sentido.
Agora, com o encerramento, não há hipótese de serem pagas as dívidas ao Estado, “que também perde” neste processo, acrescentou.
A sapataria Deusa, no número 9 da Rua 1.º de Dezembro, foi fundada em 1951 e vendia sapatos de senhora, sobretudo de fabrico nacional, mas depois da reestruturação passou a vender também marroquinaria e acessórios.
A loja tem um baixo-relevo em bronze de uma deusa hindu, explica o ‘site’ das Lojas com História. Além da Deusa propriamente dita, distinguem a loja cadeiras em cabedal branco, um sumptuoso candeeiro e a geometria das caixas de cartão perfeitamente alinhadas nas paredes, muito ao gosto dos anos de 1950.
“Todo o estabelecimento, a forma como a sapataria está construída, é arte que está ali”, disse José Fiandeiro, assegurando que vão ser feitos “os possíveis e os impossíveis para que ela volte a abrir”.
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