“Abraçámo-nos, e pegou-me logo no brinco e disse ‘ganhámos graças a ti’. A seguir meteu as mãos nas minhas orelhas e há o beijo”. Foi assim que Jenni Hermoso descreveu o momento polémico em tribunal, esta segunda-feira, citada pelo El País.

"Ouvi o que me disse, mas do beijo não escutei nada. Não o vi a gesticular, havia música e ruído de fundo”, afirmou ainda.

Questionada sobre se teria permitido o beijo caso Rubiales lhe tivesse perguntado antes, a jogadora respondeu que “não”. Além disso, quando o tribunal lhe perguntou se permitiu o beijo, Jenni Hermoso voltou a responder que “não”.

"Senti-me desrespeitada. Eu não procurei esse ato. Senti repulsa por esse comportamento", enfatizou. "Senti que estava totalmente fora de contexto. Eu sabia que o meu chefe estava a beijar-me. E isso não acontece, nem deveria acontecer, em nenhuma esfera social".

Hermoso explicou em tribunal que viveu momentos de "sentimentos mistos", uma vez que sentia que tinha sido vítima de algo que "não estava certo", mas também queria aproveitar o sucesso profissional e "celebrar aquele momento".

As acusações

Rubiales, ouvido em tribunal no dia 12, será julgado por coerção sobre Jenni Hermoso, juntamente com o ex-diretor da seleção masculina de Espanha Albert Luque, o antigo selecionador feminino Jorge Vilda e o antigo diretor de marketing da Real Federação Espanhola de Futebol (RFEF) Ruben Rivera.

A acusação considera que o beijo nos lábios dado pelo ex-dirigente da RFEF a Jenni Hermoso, no estádio de Sydney, após a conquista do título mundial pela seleção de Espanha, em 20 de agosto de 2023, “não foi consentido”, classificando-o como “uma ação unilateral e de surpresa”.

O Ministério Público, que em Espanha apresenta alegações antes do julgamento, pediu dois anos e meio de prisão para Luis Rubiales.

Os comportamentos polémicos de Rubiales

Rubiales beijou Jenni Hermoso no estádio de Sydney quando a seleção espanhola estava ser felicitada pela vitória no mundial, num momento transmitido em direto por televisões de todo o mundo.

Pouco antes, as televisões tinham captado outro comportamento do então presidente da RFEF na bancada do estádio que acabou também por dar a volta ao mundo: para celebrar a vitória da seleção, a poucos metros da rainha de Espanha, Letizia, e da infanta Sofia, menor de idade, Rubiales agarrou os genitais.

Perante as críticas aos comportamentos de Rubiales oriundas de diversos setores, incluindo as do primeiro-ministro de Espanha, Pedro Sánchez, o então presidente da RFEF rejeitou demitir-se, mas acabou por deixar o cargo em 10 de setembro de 2023.

Semanas mais tarde, em 30 de outubro, a FIFA suspendeu-o de todas as atividades relacionadas com futebol.

Este caso acabou por ditar e precipitar a queda de Rubiales à frente da RFEF, cargo que ocupou entre maio de 2018 e setembro de 2023 e cuja gestão está sob suspeita por alegada corrupção em vários contratos que a justiça espanhola está a investigar.

A crise na RFEF

A própria RFEF mergulhou numa crise desde a queda de Rubiales, a que já sucederam dois presidentes, também eles envolvidos em processos judiciais por suspeitas de corrupção.

A federação chegou a estar meses sob tutela do governo espanhol, com o objetivo de ajudar “à estabilização” do organismo, com vista à organização do Campeonato do Mundo de 2030, em conjunto com Portugal e Marrocos.

As jogadoras e o #SeAcabo

Quanto a Jenni Hermoso, o caso transformou-a, assim como às restantes jogadoras da seleção espanhola, num símbolo da luta contra o sexismo e a desigualdade de género no desporto.

As jogadoras, que se indignaram por o beijo de Rubiales ter eclipsado o triunfo de Espanha no Mundial de 2023, uniram-se no apoio a Hermoso e chegaram a fazer greve para denunciar violências machistas, discriminação e desigualdade de tratamento entre as seleções masculina e feminina.

O ‘hasgtah’ #SeAcabo (“acabou-se”) que as jogadoras lançaram nas redes sociais na altura tornou-se também ele em Espanha num movimento pela igualdade de género e contra o machismo e a violência sexual.