Por acórdão datado de 10 de dezembro, a que a Lusa hoje teve acesso, o STJ considera que, no processo, os direitos à liberdade de informação e expressão e à liberdade de imprensa “prevalecem” sobre os direitos dos autores ao bom nome à reputação.
O STJ alude à orientação estabelecida pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, “e que os tribunais nacionais terão que seguir”, segundo a qual as condicionantes à liberdade de expressão e de imprensa “devem ser objeto de uma interpretação restritiva e a sua necessidade deve ser estabelecida de forma convincente”.
“A vinculação dos juízes nacionais à Convenção Europeia dos Direitos do Homem implica uma inflexão da jurisprudência portuguesa, assente no entendimento, até há pouco dominante, de que o direito do bom nome e reputação se deveria sobrepor ao direito de liberdade de expressão e/ou informação”, acrescenta o acórdão.
Em causa estão textos que o jornalista Miguel Carvalho publicou na Visão em 2013, na sequência de uma denúncia ao Instituto do Cinema e do Audiovisual sobre eventuais ilegalidades da cooperativa Cinema Novo e do casal Mário Dorminsky e Beatriz Pacheco Pereira, que dirige aquela entidade, habitual organizadora do Fantasporto - Festival Internacional de Cinema Fantástico do Porto.
Além de Miguel Carvalho, são também visados na ação cível o então diretor da Visão, Pedro Camacho, e a empresa dona da revista nessa altura.
Os organizadores do Fantasporto pediam mais de um milhão de euros de indemnização, alegando que as peças jornalísticas criaram uma “imagem negativa” da cooperativa, fazendo-a “mergulhar” numa “profunda crise”.
Acrescentavam que a reputação de que a cooperativa gozava “nunca será inteiramente recuperada”.
Consideraram ainda que Mário Dorminsky e Beatriz Pacheco Pereira, “principais obreiros do Fantasporto”, viram destruída a sua “boa imagem, fechando-se-lhes o seu mundo de trabalho”.
Na Relação de Lisboa, e após absolvição na primeira instância, os responsáveis pela publicação dos textos tinham sido condenados ao pagamento de 150 mil euros, por danos não patrimoniais.
Agora, o STJ anulou a decisão da Relação e fez prevalecer a sentença da primeira instância, absolvendo os réus.
No acórdão absolutório, o STJ sublinha que “a isenção do jornalista não pode significar a narração acrítica e assética dos factos, desprovida de uma valoração crítica do seu significado político, social e moral, particularmente quando se trata da conduta de titulares de cargos públicos”.
“É hoje pacífico que os jornalistas não têm apenas uma ampla latitude na formulação de juízes de valor sobre os políticos, como também na escolha do código linguístico empregado. Admite-se que possam recorrer a uma linguagem forte, dura, veemente, provocatória, polémica, metafórica, irónica, cáustica, sarcástica, imoderada e desagradável”, lê-se ainda no acórdão.
Comentários