Paulo Trigo Pereira, professor universitário de economia, é o principal impulsionador de uma conferência que se realiza na terça-feira, no parlamento, sobre o tema "Assembleia da República: Um sistema eleitoral proporcional e personalizado?"
"Os partidos políticos ainda não assimilaram que é importante uma renovação do sistema partidário, mesmo que modesta, e tendencialmente preferem a manutenção do status quo que já conhecem, pelo que não tem havido suficiente vontade política para essa reforma", sustenta Paulo Trigo Pereira, que, no início da presente legislatura, foi eleito deputado pelo PS.
Na perspetiva do catedrático em economia, o principal obstáculo à reforma da lei eleitoral para a Assembleia da República está na distância dos partidos políticos, face às "aspirações dos cidadãos em relação à sua participação democrática e à escolha dos seus representantes.
"Adicionalmente, a falta de vontade política para a mudança traduz-se na defesa de propostas que são incompatíveis. Sem prejuízo de argumentos que possam ser válidos para a redução do número de deputados dentro dos limites constitucionais (até 180), o que é certo é que insistir na defesa dessa proposta, quando se sabe que ela não gerará consenso e será um obstáculo a qualquer reforma é uma forma de matar o debate à nascença", refere, aqui, numa crítica à posição do PSD desde a revisão constitucional de 1997.
Para a ausência da reforma do sistema eleitoral, Paulo Trigo Pereira aponta os atuais poderes das estruturas intermédias dos principais partidos portugueses em matéria de escolha para dos candidatos a deputados.
"Os partidos estruturaram-se em distritais e concelhias, mimetizando a divisão administrativa e política do país pois deste modo minimizam os custos políticos da tomada de decisão sobre os candidatos aos lugares políticos. Tendencialmente, as concelhias indicam os candidatos autárquicos, e as distritais os candidatos em cada círculo eleitoral, com as usuais exceções da "quota do secretário geral", ou das avocações das decisões pelas comissões políticas nacionais", assinala.
Deste modo, segundo Paulo Trigo Pereira, "se minimizam os custos de transação políticos". "Qualquer tentativa de mudança nos círculos eleitorais tem assim o obstáculo das distritais, sobretudo se perderem poder. Ora, uma alteração da lei eleitoral necessita de ser aprovada na Assembleia da República e os partidos não têm assim grandes incentivos em alterá-la", sustenta.
O docente universitário e ex-membro da bancada socialista contesta a tese de que a existência de círculos uninominais geraria uma situação de ingovernabilidade no país, com a eventual prevalência de "interesses paroquiais" e não do interesse nacional.
"Porém, interessa desde já registar que, com o atual sistema eleitoral, o maior número de vezes que os deputados divergem, no seu sentido de voto, do sentido de voto da direção da bancada parlamentar é precisamente nas questões regionais", contrapõe, dando como exemplos votações em torno de questões como portagens ou prospeção de petróleo.
Em contraponto, para o docente de economia há problemas que se estão a agravar com a manutenção do atual sistema eleitoral.
"Existe uma dimensão em termos de mandatos dos círculos eleitorais que ao longo do tempo se tem tornado mais desigual com a litoralização e a ida para as metrópoles da população. Portalegre, com dois deputados eleitos, desperdiça os votos de todos os que hoje não votam PS e PSD, e induz forte voto útil, algo que já não acontece em Lisboa com os seus 47 mandatos", indica.
Ainda de acordo com o deputado não inscrito, verifica-se "um problema de grande afastamento e mesmo desconhecimento dos eleitores em relação aos seus representantes".
"Em círculos de média ou grande dimensão, os eleitores desconhecem a esmagadora maioria dos candidatos. Tipicamente, votam num partido e a grande maioria conhece o líder partidário e, quando muito, o cabeça de lista no distrito do partido em que vota", advoga.
Paulo Trigo Pereira aponta ainda em Portugal "um problema de fraca renovação do sistema partidário" e critica os obstáculos à iniciativa dos cidadãos em matéria de revisão do sistema eleitoral.
"A iniciativa legislativa só pode pertencer aos deputados na Assembleia da República não tem justificação nem de racionalidade constitucional nem de qualquer outra. A reserva absoluta da assembleia no sentido legislativo nada tem a ver com o direito de iniciativa, que define quem tem o poder de apresentar a iniciativa", argumenta Paulo Trigo Pereira, que tem um projeto sobre esta matéria em análise na Comissão de Assuntos Constitucionais.
"Assembleia da República: Um sistema eleitoral proporcional e personalizado?" é o tema central em discussão no auditório do edifício novo do parlamento, debate que será aberto pelo vice-presidente da Assembleia da República José Matos Correia (PSD) e pela "vice" do Instituto IPP (Institute of Public Policy) Marina Costa Lobo, cabendo o encerramento ao professor universitário Paulo Trigo Pereira.
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