Confirmaram-se as piores previsões para a Seleção Nacional em termos de Campeonato da Europa. Depois de uma derrota (normal) diante a Roménia, os Lobos permanecem no Rugby Europe Trophy, ou seja, a 3ª divisão europeia de rugby.
Cabe agora à Federação Portuguesa de Rugby reorganizar a modalidade e procurar soluções para um futuro que vai continuar a ser pautado em tons cinzentos entre dúvidas e constantes erros seja a nível federativo, seja dos clubes.
Recuemos ao jogo com a Roménia. Saltaram, desde logo, à vista dois fatores, ambos com uma correlação direta: o domínio da Roménia em todos os aspetos do jogo e a falta de igualdade em qualidade de jogo e (in)experiência internacional de Portugal.
Se os “carvalhos” (alcunha associada à seleção romena) apresentaram as suas melhores opções, com a presença de vários atletas que jogam em campeonatos mais competitivos, as cores nacionais alinharam com uma equipa inexperiente, jovem e totalmente “caseira”.
Pedro Bettencourt (Newcastle Falcons da Premiership inglesa), Mike Tadjer (Grenoble), Manuel Cardoso Pinto (RC Diok), José Conde (Alcobendas), Luís Cerquinho, André Aquino, Francisco Domingues (Cisneros), Jean de Sousa (US Montauban), Jacques Le Roux (Moseley), Samuel Marques (Brive), entre outros, não alinharam neste jogo de máxima importância, sem, no entanto, se conhecer as razões desta ausência.
São inúmeros os jogadores portugueses que jogam noutros campeonatos e que começam a dar alguma esperança ao rugby nacional em termos de visibilidade. O sucesso dos atletas, é na sua maioria individual sem descurar, no entanto, a importância dos vários clubes portugueses.
Os clubes formam, moldam as qualidades e dão oportunidade de crescer, mas são os atletas que a nível pessoal arriscam numa saída para fora do espaço nacional em busca não só de uma carreira desportiva mais desafiante, como procuram atingir outro patamar a nível profissional.
Existem também outras duas realidades de jogadores amadores/semiprofissionais/profissionais: os atletas naturalizados que jogaram em Portugal e atuam agora no estrangeiro e os atletas que nunca passaram pelos campeonatos em Portugal, mas representam a Seleção Nacional mediante a sua ascendência.
São, assim, três categorias de atletas lusos que têm dado “toques” na oval em diferentes parâmetros, verificando-se uma evolução acentuada da marca do rugby português nas diversões divisões europeias.
Futuro de Portugal mora num dos topos europeus
Portugal tem, neste momento, a mesma representação de atletas no TOP14 (1ª divisão francesa, considerada a mais rica no Mundo) que a Roménia, por exemplo, com participações de Julien Bardy (Montpellier), Mike Tadjer (Grenoble) e Geoffrey Moise (Pau).
Para o leitor que desconhece a modalidade ou questiona os nomes menos portugueses destes três atletas, é preciso compreender a relação da comunidade portuguesa em França e Portugal. Nas últimas décadas, filhos e/ou netos de ascendência portuguesa têm sido aproveitados para reforçar a Seleção Nacional.
Infelizmente, nos últimos três anos a presença destes atletas lusodescendente tem sido parca, fruto de problemas com as administrações da Federação Portuguesa de Rugby e uma ausência de planeamento para a chamada destes (atletas profissionais ou semiprofissionais são forçados a ficar nos clubes se as Federações não comunicarem a sua decisão de os convocar duas semanas antes, por exemplo).
O distanciamento que tem sido cavado poderia ter sido diminuído em junho passado, caso não se tivesse dado uma das maiores controvérsias dos últimos tempos: a não convocação de Thibault Freitas. O atleta do Rodez (da FED1, 3ª divisão francesa) interrompeu as férias para alinhar por Portugal no encontro com a Alemanha, eliminatória para o Mundial, mas ao chegar aos treinos foi alertado que não seria convocado. Depois de episódios idênticos com Julian Bardy, Samuel Marques, Mike Tadjer, a nova controvérsia só veio criar uma divisão ainda maior entre os profissionais em França e a FPR.
De qualquer modo, é nas duas divisões profissionais francesas onde habitam o maior número de atletas portugueses: Jean de Sousa (US Montauban), Aurélien Beco (Colomiers), Anthony Alves (Aurillac), Samuel Marques (Brive) e José Lima (Carcassone). Lima é, aliás, o atleta com mais sucesso fora de Portugal, tendo já jogado no TOP14, na época de 2017/2018 ao serviço do US Oyonnax. O português formado no CR Évora e trabalhado na AEIS Agronomia é, neste momento, um dos maiores destaques do Carcassone, líder da PROD2.
Em relação à Premiership (principal divisão inglesa de rugby) só em 2017, pela primeira vez, um jogador português (Diogo Hasse Ferreira, dos Sale Sharks) pisou os relvados deste campeonato. Desde então, tem crescido o “rosters” de atletas portugueses nas duas primeiras divisões profissionais inglesas reforçadas com Francisco G. Vieira (Rotherham Titans, em 2017/2018 na Championship), Rui D’Orey Branco (Richmond, em 2018/2019 na Championship) e Pedro Bettencourt (Newcastle Falcons, em 2018/2019 na Premiership). A exemplo dos seus “pares” em França, Pedro Bettencourt também não entra nas contas do selecionador Martim Aguiar desde maio de 2017.
Nas divisões inferiores inglesas jogam ainda os universitários Simão Van Zeller e Luís Filipe Miguez. Ambos os atletas estão há dois anos em Inglaterra como amadores saltitando entre o rugby universitário e a National 2/3 (4ª e 5ª divisão). Numa divisão acima está Jacques Le Roux, um dos poucos atletas naturalizados convocado para o embate com a Alemanha, em junho.
O crescimento espanhol é positivo para os atletas nacionais?
A presença portuguesa é também notada nos campeonatos secundários como o espanhol ou holandês. O internacional Francisco Domingues rumou para Espanha como estudante e atua desde há três anos pelo Cisneros, clube da 1ª divisão, e, tal como Pedro Bettencourt, não é chamado às convocatórias de Martim Aguiar desde 2017.
Em Espanha estão também José Conde que assinou pelo Alcobendas como profissional, André Aquino, Carlos Sottomayor e Luís Cerquinho (os dois últimos no Cisneros), e João Dias (RC Publenou da 2ª divisão espanhola).
O crescente desenvolvimento do campeonato espanhol tem proporcionado presenças na Challenge Cup (Liga Europa do rugby). Dos 12 emblemas que atuam na Liga Heineken (divisão maior de Espanha), nove são totalmente profissionais, dois oscilam entre o profissionalismo e semiprofissionalismo e uma é completamente amadora (precisamente os Cisneros de Domingues, Aquino e Cerquinho).
Na Holanda joga apenas um português, o internacional Manuel Cardoso Pinto, bicampeão europeu de sub-20 (2017 e 2018). O português alinha como semiprofissional no RC Diok.
40 jogadores pelo mundo
Se até 2015, poucos foram os atletas portugueses que tiveram a oportunidade de jogar fora do contexto nacional com destaque para Gonçalo Uva, Vasco Uva, Tiago Girão, Pedro Cabral, Duarte Cardoso Pinto ou José Pinto, hoje a realidade é outra.
Em resumo, 30 atletas portugueses jogam entre as primeiras e terceiras divisões europeias (o número sobe para 40 a nível mundial), e curiosamente apenas um - Rui D’Orey Branco - foi convocado para o tal jogo com a Roménia. Abre-se, assim, uma clara discussão em relação se vale a pena ou não esta aposta dos jogadores em sair do território nacional.
O fator estudantil tem sido relevante, como é o caso de Simão Van Zeller, Luís Miguez, João Dias, João Francisco Lima (no Brasil durante 7 meses), Manuel Dias (Argentina). Há quem aproveite os estágios e programa Erasmus e arrisque em campeonatos completamente diferentes, exemplo encontrado no internacional português Bernardo Seara Cardoso ou dos irmãos João e Manuel Dias (este último a jogar na América do Sul).
Por outro lado, existe também o fator de desafio: José Maria Vareta, emigrou para a Austrália e Duarte Diniz esteve, durante 2018, oito meses em terras australianas.
Curiosamente, nas últimas 10 convocatórias finais para jogos, Portugal só fez uso de 10% desses atletas no total, um número irrisório e que prova que existe um problema logístico entre a Federação Portuguesa de Rugby, os clubes onde os atletas jogam e os próprios atletas.
A falta de algum profissionalismo em termos técnicos na camada sénior da Seleção Nacional (apesar de toda a estrutura ser totalmente profissional em termos de condições de trabalho) tem prejudicado, de certa forma, os resultados de Portugal nos jogos mais importantes a nível europeu e mundial, tendo falhado novamente o acesso ao Mundial de Rugby 2019 e a duas subidas de divisões à Championship.
A Alcateia lusa necessita de perceber a necessidade de trazer estes atletas a jogar fora-de-portas para junto de si, de forma a ombrear com as outras nações europeias que têm melhores condições estruturais (a liga romena é 50% profissional), populacionais (na Geórgia o rugby é a modalidade nº1) e logísticas (a Espanha consegue “convencer” sempre os melhores atletas de fora).
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