Para os fãs de futebol, a semana passada foi uma daquelas com inúmeras emoções à flor da pele, a contas com as notícias da Superliga Europeia. É certo que o projeto caiu em 48 horas, mas o falatório em torno do assunto ainda hoje perdura — o grupo KSE e os Kroenke, donos do Arsenal, clube inglês, que o digam. No entanto, os adeptos do FC Colónia, clube da Bundesliga, a liga alemã de futebol, tiveram de aguentar as más notícias com outra ainda aparentemente pior: a morte de Hennes VIII, o bode que serviu de mascote do emblema entre 2008-2019, abatido por questões de saúde. Há dois anos, por causa da artrose, tinha metido os papéis para a reforma e foi substituído por Hennes IX.
É um animal, mas não é um bode qualquer. Tal como explica o The Guardian, que relata a história, é difícil para a maioria das pessoas compreender o que Hennes significa (ou significou) para os adeptos do FC Colónia. É que depois das notícias que davam conta da intenção dos clubes ricos criarem uma liga entre si, que na opinião de quem gosta de futebol distorce o que o torna especial, Hennes VIII representava mais do que nunca aquilo que se sente cada vez mais falta no desporto-rei: algo com que os adeptos se possam relacionar e sentir-se orgulhosos.
O jornal britânico enfatiza o que está aqui em jogo: o FC Colónia não é uma equipa comum. Em 1950, um circo local deu ao novo clube o seu primeiro bode como presente. Hennes Weisweiler, lenda do clube, era na altura o treinador-jogador e não houve surpresa quando o primeiro bode foi batizado com o seu apelido. Desde então, mais de 70 anos depois, o clube e os demais bodes têm sido inseparáveis. Tanto que o animal faz parte do símbolo.
De realçar que, nos anos 60, Hennes chegou a fazer companhia aos adeptos nos jogos fora — e tinha lugar no autocarro da equipa e tudo. Mas os tempos hoje em dia são outros e as mascotes atuais vivem no Jardim Zoológico de Colónia, pelo que não têm o privilégio de viajar tanto como os seus antecessores.
Convém frisar que Hennes VIII era extremamente popular. Num zoo, seria de pensar que e o leão, o aclamado rei da selva, fosse o mais popular, certo? Errado. A realidade é que as famílias preferiam ir vê-lo. E, a cada quinze dias Hennes VIII assistia aos jogos em casa a partir do seu lugar cativo, junto à linha de fundo. (Por razões de pandemia, o seu substituto Hennes IX ainda não desempenha as suas funções.)
Hennes VIII virou mascote do clube em 2008 — tinha um ano de vida. O The Guardian conta que esteve com o clube nos tempos bons e maus da história do clube. Assistiu a despromoções (em 2012 e 2018) e a subidas (2014 e 2019). Mais: quando o Colónia se qualificou para o futebol europeu pela primeira vez em mais de 25 anos, Hennes VIII recebeu o Arsenal, BATE Borisov e Red Star Belgrado na sua segunda casa (entenda-se no estádio do clube) em Müngersdorf.
"Hennes VIII era um bode especial em muitos aspectos", afirmou o vice-presidente de Colónia, Eckhard Sauren, na semana passada. E, de facto, era especial. Os adeptos do Colónia nunca vão esquecer quando, em 2014, conseguiu escapar durante o intervalo num jogo de segunda divisão contra o VfR Aalen. Enquanto os adeptos aplaudiam nas bancadas, Hennes conseguiu evitar ser capturado e causou o caos em campo. Quando finalmente foi apanhado, os adeptos reagiram com apupos. Até hoje, os adeptos de Colónia argumentam que a sua corrida foi mais ágil e dinâmica do que a maioria dos jogadores naquele dia.
Contudo, como acontece com qualquer celebridade, não esteve alheio à controvérsia. Não tanto por ele próprio, mas mais pelo que lhe fizeram. Em 2015, o avançado Anthony Ujah agarrou-o pelos cornos enquanto celebrava um golo contra o Eintracht Frankfurt — o gesto levou a uma chuva de críticas de agências ligadas ao movimento da defesa dos animais.
"Para nós, adeptos [do Colónia], ter uma mascote verdadeira, em vez de uma pessoa vestida com um fato, é único e uma verdadeira mais-valia para o clube. Hennes VIII era uma celebridade local, a sua entrada no estádio era uma tradição muito apreciada", escreveu o jornalista alemão e autor da peça do The Guardian.
"Num mundo de futebol onde o marketing e o lucro são os factores mais importantes, um bode comum e malcheiroso é sempre uma mudança muito bem-vinda. Hennes VIII levou-nos à Europa e recordá-lo-emos sempre. Pode ter sido um bode, mas nós adorávamo-lo", rematou.
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