Na quarta sessão do julgamento do processo Football Leaks, no Juízo Central Criminal de Lisboa, o criador da plataforma eletrónica explicou, de forma detalhada, os passos anteriores à sua detenção, em 16 de janeiro de 2019, revelando essa colaboração com o Ministério Público (MP) francês, que recebeu informação de processos investigados.
“Entreguei uma ‘pen drive’ aos procuradores franceses com informação para que eles percebessem o que estava na minha posse. Tive também uma reunião com elementos da equipa especial da polícia francesa sobre o programa de proteção de testemunhas. Combinei com eles que ia resolver a minha vida em Budapeste e, depois, agendava-se uma data para eu ir para território francês”, começou por explicar o denunciante luso.
Estes contactos ocorreram a partir de 2018, quando Rui Pinto contratou o advogado francês William Bourdon para o auxiliar sobre esta colaboração, apesar de já ter havido interesse das autoridades francesas “desde final de 2016 ou início de 2017”, adiantou.
“Os procuradores do MP francês gostaram muito daquela informação preliminar que lhes entreguei e pediram mais. Combinei com o meu advogado uma reunião onde essa informação seria passada. No início de dezembro de 2018, surgiu a segunda vaga de revelações do Football Leaks, abanaram a Europa por completo”, prosseguiu Rui Pinto.
Questionado sobre o motivo que o levou a colaborar com as autoridades francesas, em vez das autoridades portuguesas, Rui Pinto expressou que era sua intenção, desde que chegou a Portugal, fazê-lo, mas recebeu “demasiadas ameaças de morte” e não sentiu segurança: “Eu não confiava nas autoridades portuguesas e os episódios relacionados com o inspetor-chefe Rogério Bravo deram-me alguma razão. Por outro lado, as autoridades dos outros países mostraram sempre mais interesse nestas informações”.
“Estava em prisão preventiva e as autoridades portuguesas não mostraram qualquer tipo de abertura para essa colaboração, porque achavam que tinham tudo controlado. Mal eles sabiam o que viria, meses depois, com o Luanda Leaks. Aí, houve abertura do MP em arranjar uma plataforma de entendimento. Apresentei o meu espírito crítico, alterei a minha postura e o MP também alterou um pouco a sua”, respondeu Rui Pinto.
O denunciante também explicou a forma de acesso à Procuradoria-Geral da República (PGR), tendo dito que acedeu à caixa de correio do antigo diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Amadeu Guerra, para tentar encontrar a fonte judicial de algumas peças jornalísticas acerca da revelação de e-mails do Benfica.
“A revista Sábado fez um artigo que juntou montes de mentiras e acrescentou fontes judiciais. Essa fonte judicial podia ser um inspetor da Polícia Judiciária ou alguém no DCIAP. Queria perceber quem seria a fonte que estava a passar as informações para estes artigos da revista Sábado, mas, infelizmente, nunca consegui lá chegar”, adiantou.
Para Rui Pinto, “a prioridade de Amadeu Guerra era apanhar o ‘hacker’ do futebol”, já que é “adepto benfiquista”: “Os processos onde era suspeito tornaram-se a prioridade dessa equipa. Todos os processos de investigação da corrupção desportiva passaram para segundo plano e, em 2022, nota-se que estão numa gaveta e não há qualquer novidade. Considero que essa equipa especial foi um autêntico ‘flop’, porque apenas mostraram resultados em inquéritos contra mim, no resto não mostraram resultados”.
Rui Pinto, de 34 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto de 2020, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.
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