Fez esta semana 25 anos que Shaquille O'Neal se estreou na NBA. Dezanove épocas, seis equipas e 1.207 jogos depois, Shaq "viajou" 11.252 vezes para a linha de lançamentos livres e só marcou cerca de metade (52.7%). A pouca eficácia da lenda dos Los Angeles Lakers levou a que os adversários adoptassem uma estratégia para capitalizar essa lacuna: o "Hack-a-Shaq. Não havia jogos em que não se repetissem as faltas sobre o "The Big Aristotle" para o levar propositadamente para a linha de lance livre.
A expressão "Hack-a-Shaq" sobreviveu até aos dias de hoje. Não só por causa de O'Neal, que se retirou após a temporada 2010/11, mas também porque a estratégia tem sido usada com outros jogadores que revelam muitas dificuldades na altura de executar aquele que deveria ser o lançamento mais fácil do basquetebol. E se Shaq até concretizava mais de metade dos seus lançamentos livres, o mesmo não se pode dizer de outros postes, como Ben Wallace (já retirado), DeAndre Jordan ou Andre Drummond.
Na lista dos piores lançadores de lances livres da história da NBA, Shaq é 7.º, o mítico Wilt Chamberlain é 5.º e os já citados Wallace, Jordan e Drummond ocupam o pódio, mas apenas este último consegue a "proeza" de falhar mais de 60% dos seus lances livres. Até ao início desta temporada, nas cinco épocas que o poste dos Pistons leva como profissional, soma uma percentagem medíocre de 38.1% (683 convertidos em 1793 tentados).
É o pior lançador da história da NBA e um dos maiores alvos de chacota da liga.
No entanto, 2017/18 está a revelar um novo Andre Drummond. Nos primeiros onze jogos da temporada, o gigante de 2,11 metros marcou 30 dos 47 lances livres que tentou, para uma percentagem impressionante-pelo-menos-para-ele de 63.8%, incluindo uns fantásticos-para-quem-quer-que-seja 14 marcados em 16 tentados (87.5%) na vitória do passado dia 3 de Novembro sobre os Milwaukee Bucks de Giannis Antetokounmpo.
"É uma mudança da noite para o dia. Tem sido um processo excitante ver a evolução, após horas incontáveis no pavilhão a treinar lances livres. Trabalhei na mecânica do lançamento e trabalhei no aspecto mental, portanto é excitante chegar aqui", disse recentemente Drummond, que alterou por completo a forma de lançar ao cesto, este ano. Nas épocas anteriores, o poste lançava praticamente de pé, com o corpo hirto, e a força do "tiro" a sair exclusivamente dos braços. Esta época, o processo de lançamento começa com um agachamento total e a posterior subida do corpo até ao ponto mais alto, num movimento fluido que termina com a rotação do pulso da mão lançadora.
A mudança foi aconselhada pelo preparador físico Idan Ravin, com quem Drummond trabalhou no verão e com quem já tinha trabalhado antes de entrar na liga. Isolou-o durante a "off season", autorizou que tivessem acesso ao pavilhão apenas a mãe e um amigo de infância do atleta, e moldou-o. Sobretudo na parte mental. "Toda a gente dizia que ele não era capaz e até a equipa tinha desistido e já defendia que ele lançasse de baixo para cima. Mas eu vi-o a marcar 90% dos lances livres, este verão. Confiança é algo que tem, agora", afirmou Ravin em entrevista à ESPN.
Um dos mais entusiasmados com a evolução de Drummond é - claro! - o treinador dos Pistons, Stan Van Gundy. Agora já não precisa de retirar o poste de campo no último período, altura em que as equipas contrárias usavam o "Hack-a-Shaq" - neste caso, o "Hack-a-Andre" - para obrigar Van Gundy a substituir a sua maior estrela. E o acerto tem sido tão consistente que, aquando de um lance livre para os Pistons após falta técnica de um adversário, numa partida desta temporada, os seus adjuntos o aconselharam a escolher Drummond para ser o lançador de serviço. Van Gundy recusou a ideia, mas ainda pensou duas vezes.
Na última época, a NBA mudou as regras, não permitindo faltas intencionais nos dois minutos finais dos jogos. Mas o poste da formação de Detroit já não precisa de ter medo de ter a bola na mão, seja em que altura for. Não tem medo de sofrer faltas. Não se livra da bola. Este ano quer a bola na mão e, mais do que nunca, está a jogar de forma agressiva, pois sabe que, se sofrer faltas, vai castigar os oponentes na linha de lance livre.
Com Drummond mais confiante, os colegas estão mais confiantes e a equipa ganha mais. Actualmente, têm oito vitórias em onze jogos e ocupam o 2.º lugar da classificação da conferência Este. E todos dizem que, afinal, o maior reforço dos Pistons não é Avery Bradley, ex-Celtics, mas sim um renovado Andre Drummond.
Ricardo Brito Reis é jornalista desde 2004 e tem experiência profissional em rádio, imprensa e televisão. Actualmente, é comentador de basquetebol na SportTV, função que acumula com o cargo de gestor de conteúdos e redes sociais da Federação Portuguesa de Basquetebol. Fundou o site Borracha Laranja e é ainda co-autor do podcast MVP. Paralelamente ao Jornalismo, é treinador de basquetebol de Grau II e conta com passagens por clubes como Odivelas Basket, Atlético CP, NB Queluz e Sport Algés e Dafundo.
Comentários