As últimas semanas reforçaram, e muito, o capital de Neemias junto das equipas da NBA. Depois de uma terceira época com excelentes números nos Utah State Aggies, e que em março já o colocavam no radar de alguns dos melhores analistas norte-americanos de basquetebol universitário e draft da NBA, o português não tem parado com tantas solicitações para se mostrar «in loco» a potenciais interessados.
No final do mês passado, viajou até Chicago para participar no NBA Draft Combine, um evento anual em que um grupo restrito de jovens talentos tem a oportunidade de ser medido, fazer exercícios de força e agilidade, disputar jogos de 5 contra 5 e conhecer os principais responsáveis das trinta equipas da liga. O poste luso já tinha participado no Combine na sua época de caloiro em Utah State, em 2019, mas sentiu que não estava física e mentalmente preparado para se mudar para a piscina dos grandes.
Voltou atrás para dar dois passos à frente. Regressou à universidade em vez de manter o nome no draft da altura e, este ano, a história foi bem diferente. Neemias foi um de apenas 69 atletas a receber o exclusivo convite da própria NBA, após recomendações das 30 equipas da liga, para estar no Combine e, ao contrário de 2019, estava mais preparado para aquilo que o esperava. Destacou-se nas medições como o jogador mais alto (214,63cm), com a maior envergadura (223,52cm) e o maior alcance em pé (285,75cm), brilhou nos jogos com duas exibições em que pôde mostrar todas as facetas do seu jogo, e acabou por ser chamado para entrevistas individuais por cinco equipas: Portland Trail Blazers, Dallas Mavericks, Los Angeles Lakers, Phoenix Suns e Boston Celtics.
Depois, viveu entre aeroportos e pavilhões e, durante um mês, respondeu às solicitações de equipas da liga que pediram para o conhecer melhor, nas respetivas instalações, em «workouts» privados e mais entrevistas. Milwaukee Bucks, Phoenix Suns, New York Knicks, Toronto Raptors, Sacramento Kings, Philadelphia 76ers, Charlotte Hornets, Los Angeles Lakers e Oklahoma City Thunder receberam o português, num périplo de cerca de 30 mil quilómetros. Para além destas nove formações, também Atlanta Hawks, Detroit Pistons e Boston Celtics mostraram interesse em receber o poste nascido em Lisboa para um treino.
É por isso que estas doze equipas - as nove que promoveram «workouts» e as outras três que manifestaram essa intenção - poderão ser consideradas as mais interessadas no poste luso. E destas doze, os canadianos Toronto Raptors destacam-se. Não só fizeram um «workout» com Neemias em Tampa, na Flórida, há poucas semanas, como o foram observar seis vezes a Utah, na última temporada. E é sabida a aposta recente do conjunto de Toronto em jogadores internacionais, como é o caso do camaronês Pascal Siakam, do britânico OG Anunoby ou do canadiano Chris Boucher, até porque o ainda «general manager» Masai Ujiri tem raízes nigerianas.
Nesta corrida, Neemias tem, no entanto, a concorrência do também poste Charles Bassey, igualmente de origem nigeriana e igualmente seguido em 2020/21 pelos Raptors na universidade de Western Kentucky. Bassey é um dos postes que é apontado ao draft e, na maioria dos «mock drafts», é colocado um pouco acima do português, tal como Day'Ron Sharpe, o turco Alperen Şengün e - claro! - o candidato a top-3 Evan Mobley. Se estes últimos dois estão projetados ao topo do draft, podemos dizer que Day'Ron Sharpe e Charles Bassey serão os principais concorrentes diretos a Neemias Queta e podem servir de barómetro. Ou seja, a partir do momento em que esses dois sejam escolhidos, fica o caminho aberto para Neemias... se nenhuma equipa decidir contrariar as projeções dos analistas da imprensa norte-americana especializada e escolher o português antes dos outros.
Na verdade, de pouco ou nada valem as previsões dos analistas, que muitas vezes desvalorizam jovens que atuam em conferências pouco mediáticas, como Mountain West, onde joga a universidade de Utah State. Há quem diga, por exemplo, que Neemias só não foi o «Defensive Player of the Year» de toda a NCAA em 2020/21 porque os outros três finalistas eram de universidades mais cotadas, uma vez que as estatísticas avançadas mostravam que o português foi o melhor.
As opiniões sobre o lugar de Neemias no draft são tão diferentes que há quem admita uma escolha no top-20, como John Hollinger, antigo membro do «front office» dos Memphis Grizzlies e agora colunista do The Athletic, mas também existem casos de especialistas que não colocam Neemias no lote de 60 potenciais escolhidos. Apesar da incerteza, há uma pequena maioria que aponta o poste para a primeira metade da segunda ronda do draft, entre a 30.ª e a 45.ª posições.
Olhando para as escolhas que as tais doze equipas potencialmente interessadas têm no draft - até ao draft ainda pode haver trocas que baralhem isto tudo -, há precisamente 30 hipóteses. Claro que ninguém espera ouvir o nome de Neemias Queta como a 1.ª escolha dos Detroit Pistons ou a 4.ª escolha dos Toronto Raptors e é provável que o top-20 seja demasiado optimista. Assim sendo, sobram duas dezenas de escolhas que nos farão ventilar um pouco mais do que as restantes.
Para além destas, vale a pena recordar que também os Portland Trail Blazers e os Dallas Mavericks entrevistaram Neemias no NBA Draft Combine, mas não têm escolhas no draft. Porquê? Ou contam fazer alguma troca de última hora que lhes permita receber uma escolha neste draft ou apostam que o português não esteja nas 60 escolhas e, após o draft, podem contratá-lo, naquilo a que os norte-americanos chamam de «undrafted players». Há vários atletas que chegaram à liga sem ser via draft. É só mais um dos caminhos possíveis para chegar à NBA.
Neemias está disposto a seguir pelo caminho mais difícil. Está no draft mais talentoso dos anos mais recentes depois de um Combine de 2019 que correu menos bem, de uma lesão que marcou o seu segundo ano em Utah State, de ter jogado numa conferência da NCAA pouco mediática e de ter nascido num país quase desconhecido no mapa do basquetebol mundial, não fosse Ticha Penicheiro e Mery Andrade na WNBA, as seleções nacionais que foram aos Europeus de 2007 e 2011 e alguns sucessos recentes de seleções jovens. Mas, tal como o disse recentemente no podcast Bola ao Ar, sempre acreditou que podia chegar à NBA, mesmo quando se riam dele.
O caminho continuará a ser difícil se Neemias entrar, de facto, na NBA. Numa liga em que se privilegia cada vez mais os jogadores exteriores (bases e extremos) e em que o papel dos postes é mais reduzido e quase unidimensional, a capacidade de passe tão elogiada neste último ano em Utah State pode ser pouco explorada e o português pode ver-se limitado a bloquear e desfazer em situações de bloqueio direto e a viver das sobras que apanhar nas tabelas. Neemias sabe que tem que continuar a evoluir e a moldar o seu jogo de acordo com as tendências atuais da NBA. Desenvolver um lançamento mais afastado do cesto e trabalhar a capacidade de trocar defensivamente para defender jogadores no perímetro é prioritário.
O draft é só mais uma etapa, mas o sonho de Neemias não acaba aí. Se não for escolhido, pode assinar logo nas horas seguintes um contrato «two-way player», que lhe permite jogar numa formação da NBA e na respetiva equipa da G-League (liga de desenvolvimento da NBA). Ou pode chegar a acordo com uma equipa para jogar na Summer League (8 a 17 de agosto, Las Vegas), a liga de verão que serve para jogadores mostrarem o seu valor aos responsáveis das equipas da liga na perspetiva de assinar contrato. E mesmo o contrato pode não ser totalmente garantido. Ou a contratação de um poste na «free agency», pela equipa que eventualmente venha a escolher Neemias Queta no draft, pode mudar tudo.
As possibilidades de entrar na NBA são tantas que não vale a pena especular. Em 2019, ao site Borracha Laranja, Neemias confessava que uma frase do seu antigo treinador Bruno Regalo o marcou. "Dizia que, por mais asneiras que eu faça, no dia seguinte o sol vai nascer outra vez, pelo que vou ter outra oportunidade de ser o melhor que posso ser", revelou. Essa frase ficou gravada na memória de Neemias, mas é a todos nós que devia ser dirigida. O draft não é um fim em si mesmo, mas apenas mais um passo. E para quem saiu do Vale da Amoreira e quer conquistar o mundo, desistir não é opção.
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