Na Acreditar e na comunidade do cancro pediátrico e juvenil é sempre um tempo difícil.
Por um lado, queremos muito celebrar com todos. Por outro, temos a certeza muito pesada de que para alguns não haverá festas, ou porque falta alguém fundamental para que se festeje, ou porque há alguém da nossa casa que está muito doente e não consegue festejar.
Para os primeiros, só podemos desejar que um dia encontrem a tranquilidade possível e ajudá-los nesse caminho, sempre que para eles isso faça sentido. Para os últimos, que este Natal passe bem depressa e que o próximo seja de verdadeira festa. Nós, na Acreditar, continuaremos muito disponíveis para apoiar em todo o tempo que medeia este e o próximo Natal.
No capítulo dos balanços tivemos um ano bem cheio.
A pandemia marcou de forma importante todo o ano e sobretudo os primeiros meses. Algo com o qual nos vamos habituando a viver. A parte mais negativa da pandemia é sobretudo a ameaça reforçada sobre a nossa comunidade: o medo, os atrasos nas idas ao médico que levem a diagnósticos tardios, o adiamento de consultas, o que aumenta a ansiedade, e todas as medidas de contenção que tornam ainda mais pesada a entrada em qualquer serviço médico.
Este medo, que já antes era a constante da vida dos pais, dos doentes e das famílias, é agora maior e tem afectado de forma importante a saúde mental das crianças, dos jovens e das famílias em geral.
Para minorar esse impacto, criámos um novo apoio: uma consulta de psicologia. Este ano, já ajudou muitos pais e muitos jovens a cuidarem sua saúde mental de forma a que esta não venha a ser a sequela difícil no pós-tratamento.
2021 também tem muito a festejar. O trabalho de anos, sobretudo levado a cabo pelos sobreviventes de cancro (os Barnabés da Acreditar) na luta pelo fim da discriminação na área dos seguros e dos créditos, foi coroado de êxito.
O direito ao esquecimento foi aprovado já próximo deste final de ano e com isso todos os sobreviventes deixaram de ter de dizer que tiveram um cancro na infância, podendo assim usufruir de igualdade de condições na compra de uma casa, para a qual estavam obrigados a contratar um seguro de vida, ou na obtenção de outros créditos.
Sabemos que ainda não está tudo garantido. A lei ainda carece de regulamentação que a dotará de eficácia plena, mas o primeiro passo, que consiste na aceitação do princípio da não discriminação, foi fundamental para que em 2022 estes jovens possam vir a concretizar mais desejos e fazer mais planos.
A nossa promessa para 2022 é a de que não deixaremos de acompanhar este assunto de forma a que a lei aprovada possa ser totalmente eficaz e não se fique pelo enunciado de um bonito princípio que apenas sirva para descansar as consciências.
Conjuntamente com os pais em luto e a sociedade, que estes pais conseguiram sensibilizar de forma tão forte, foi alcançada a possibilidade de estes terem mais tempo para organizarem as suas vidas após a morte de um filho.
Esta possibilidade é alargada a todos os pais, sem excepção, e por isso sentimos que foi feita justiça a todos os que sofreram a injustiça de perder o que de mais precioso têm nas suas vidas.
Foi algo muito desejado e alcançado e permitirá que em 2022 e daí em diante nenhum pai tenha de ir trabalhar a correr, escassos 5 dias após ter perdido um filho.
O luto parental foi estendido de 5 para 20 dias, dando algum tempo extra para que estes pais possam começar a reorganização que lhes permita vir a iniciar um processo de luto que, como dissemos, sabemos que pode não ter fim.
Era um desejo de pais que se concretizou em benefício de outros pais.
Desejamos muito que nunca mais nenhum pai precise deste tempo. Um tempo que ninguém quer.
Dia 1 de janeiro cá estaremos a Acreditar com toda a força, força que nos vem das crianças e jovens com cancro, que vamos – pais, barnabés, sociedade civil, o leitor que me está a ler, todos os que podemos agir e fazer a diferença – continuar a mudar o que precisa ser mudado.
Comentários