Para o próximo ano já há palavras/conceitos que se dão como inevitáveis, e provavelmente outros vão surgir sem os termos previsto. A revista “The Economist” elaborou um lista de 23, garantidos. Como se trata de uma publicação semanal de grande fiabilidade, mas cuja assinatura custa um balúrdio, e portanto é inacessível ao comum dos sequiosos pelo futuro, tomamos a liberdade de ir buscar 13 dessas novidades.
Se quiser ver lista completa, está aqui.Também procuramos traduzir as expressões, que nascem sempre em inglês, mas poderão ter outra tradução em português. O admirável mundo novo não pára, mesmo nestas praias!
eSIM
Toda a gente sabe o que é - e possui - um SIM no seu telemóvel, aquele cartão personalizado que armazena os chamados módulos de identidade, o número, contactos e chamadas. A nova tecnologia eSIM substitui o cartão físico por uma série de códigos digitais que podem ser transferidos de um telemóvel para outro. O processo existe desde 2017, mas a decisão da Apple de o utilizar nos telemóveis a partir do 14, vai com certeza ser adoptada pelos outros fabricantes e, consequentemente, pelas operadoras, já no próximo ano.
Hidrogénio verde, azul e castanho
O hidrogénio é aquele elemento químico semelhante a Deus; está em toda a parte mas ninguém o vê. Constitui 75% da massa elementar do Universo, mas na Terra não se apresenta em estado puro - o chamado “plasma”. Sendo um dos componentes da água, pode ser obtido por eletrólise, separando-o do oxigénio, mas este processo é demasiado caro (consome muita energia), pelo que o melhor é “fabricá-lo” a partir dos hidrocarbonetos presentes no gás natural. Ora, esse fabrico pode ser mais ou menos limpo, daí os diferentes hidrogénios.
O “verde”, obtido por electrólise, é o mais limpinho e por isso o preferido pelos cientistas europeus, mas também tem sido produzido em quantidade na Austrália e na Índia. O mais sujo é o castanho, extraído a partir de carvão ou lignite, o que liberta grande quantidade de dióxido de carbono. O azul também é retirado do gás natural, mas recolhendo o dióxido de carbono em grutas, o que o torna mais verde. O problema óbvio é garantir que essas grutas estejam convenientemente seladas. Há ainda outras “cores” a considerar, como o rosa, que usa a energia nuclear para fazer a electrólise.
Criptografia pós-quântica
Para perceber esta novidade é preciso saber o que quer dizer mecânica quântica; pois bem, é o estudo dos sistemas físicos cujas dimensões são próximas ou abaixo da escala atômica, tais como moléculas, átomos e outras partículas sub-atómicas, ou seja, de dimensões infinitésimas. Os computadores a esta escala ainda não existem, mas estão quase a existir. Quando isso acontecer, poderão decifrar a encriptação que garante comunicações seguras (“encriptado de ponta a ponta”, lá garante o WhatsApp) e protege dados confidenciais. Este ano já foram definidos novos padrões de criptografia, para evitar preentivamente que os novos computadores, previstos para 2023, vejam desvendar os segredos de todas as empresas e “agências” que querem continuar a operar sigilosamente. E as conversas do WhatsApp, claro.
Realidade mista
Em termos políticos, nestes últimos anos ficamos a saber o que é a realidade alternativa e também que a realidade não é real. Em termos tecnológicos, já temos a realidade virtual, VR (que é gerada digitalmente) e a realidade aumentada (AR), que mistura a virtual com a real. Este novo conceito, “mixed reality”, ou XR, permite que os elementos virtuais e reais interajam entre si. Sabe-se que várias tecnológicas, em particular a Apple, estão prestes a lançar óculos que juntam a três realidades - talvez fosse mais adequado chamar-lhes “visões”. Prepare-se para o “realityOS”! Em termos políticos, não se espera nenhum conceito novo do real, uma vez que a realidade já é tão ficcional que não precisa de aperfeiçoamento.
Chaves de passe (Passkeys)
Não há quem não se passe com as dezenas de palavras-passe que é preciso ter para aceder a tudo - computadores, telemóveis, programas, publicações pagas e gratuitas e mais um par de botas. Portanto é uma boa notícia saber que os grandes decisores informáticos - Apple, Google/Android e Microsoft - vão acabar com as palavras passe e substitui-las por sistemas biométricos que são impossíveis de descobrir e não é preciso recordar. O reconhecimento facial ou por impressão digital já existe para desbloquear telemóveis e em certos serviços, como o eBay, Paypal, (Millennium em Portugal), mas a tecnologia vai alargar-se a programas, apps e páginas da internet.
Como cada app, página da Internet ou tudo o mais, gera uma chave de passe exclusiva, é muito mais difícil ser descodificada por terceiros. Também acaba com o compreensível acto de escolher a mesma palavra passe para tudo, ou palavras passe intuitivas (tipo, ano do nascimento ou nome do marido). Olhos abertos e mãos lavadas é tudo o que se precisa para entrar. (Por acaso, já vi filmes em que o mau da fita tira a impressão digital do bom desmaiado, ou, num roteiro mais “hardcore”, arranca um olho ao morto para abrir a porta do cofre).
Escalada vertical e/ou horizontal
Estamos no domínio da terminologia militar, uma ciência em transição devido à invasão da Ucrânia. Guerras convencionais deste tipo, na Europa, com frentes de combate de mil quilómetros, tanques, artilharia, etc, não aconteciam desde 1945, e nunca tinham sido seguidas em tempo real, ao vivo e a cores. O termo tem a ver com o modo como o conflito vai escalar. Se for na horizontal, quer dizer que se amplia a área geográfica. Se for na vertical, representa mais e/ou novos tipos de armas. Podem acontecer as duas ao mesmo tempo e qualquer delas é um desastre anunciado.
Regasificação
O termo em inglês é “regasification; esperemos que apareça uma versão portuguesa menos desagradável. Quando um gás é comprimido a baixa temperatura, torna-se líquido, e o termo é, evidentemente, liquidificação. Quando depois é descomprimido e aquecido à sua temperatura normal, volta a ser gás. Nada disto é novidade, mas nunca tinha sido tão intensamente comentado pelos leigos da química. Estamos a falar do agora famoso GNL, o gás natural liquefeito, que será a salvação energética da Europa no próximo ano. Ao comprimir a gás natural a -162º Celsius, o volume reduz-se 600%, tornando viável metê-lo em navios-cisterna, que o descarregam em terminais especiais onde se faz a expansão. Para ser mais rápido, os próprios navios têm descompressores que o transferem para o cais já pronto para as canalizações terrestres. Todos os países costeiros da Europa estão a construir terminais e a Alemanha encomendou cinco navios especiais. Quando finalmente houver um gasoduto entre Barcelona e Marselha, ao fim de anos de oposição francesa, e quando Sines acordar para o progresso, o gás liquefeito pode ser embarcado nas Américas e chegar até aos países nórdicos num ápice e a bom preço. Quanto aos ingleses, não sabemos se se juntam ao Continente ou preferem brexitar a possibilidade.
Aridificação
É uma espécie de desertificação mais fraquinha e mais lenta, mas não menos preocupante. Aplica-se também a áreas geladas, como o cume do Kilimanjaro ou do monte Fuji. Nem é preciso dizer que se trata dum efeito do aquecimento global e está a decorrer sobretudo no Sul da Europa, na costa da Austrália, Sul da África e costa Oeste dos Estados Unidos. Menos água, mais fogos, campos menos produtivos e cidades mais insuportáveis, é o que temos pela frente. E ninguém faz nada, embora todos digam que estão muito preocupados.
Emissões de nível 1, 2 e 3
Trata-se dum afinamento do nível de emissões de combustíveis fósseis, destinado a apertar a legislação - ou seja, fazer os poluidores pagar taxas proporcionais ao estrago que provocam na atmosfera. A poluição Nível Um é provocada pela actividade industrial e os veículos; o Nível Dois cobre as emissões das geradoras de energia; o Nível Três fica para as petrolíferas, que são as responsáveis por atacado e, apesar da conversa promocional de que estão a pensar muito no ambiente, continuam a bombar e destilar combustíveis fósseis. Isto vai servir de alguma coisa? Prognósticos, só em 2024.
Combustíveis sintéticos e eléctricos
Aqui, as palavras que vão pegar são em inglês, pela sua simplicidade e universalidade: synfuels e e-fuels. Os sintéticos são substitutos dos petrolíferos convencionais, produzidos com outras matérias-primas. Quais, não sabemos, mas existem. Os alemães, durante a II Guerra Mundial, faziam gasolina sem usar petróleo, e nestes 70 anos com certeza que houve progressos. Não é o rei Carlos III que tem um Aston Martin abastecido por resíduos de soro de leite e mosto do vinho?
Quanto aos eléctricos são, evidentemente, provenientes do vento e do sol. A electricidade assim gerada é usada num processo de electrólise que separa o hidrogénio do oxigénio e depois o hidrogénio é misturado com dióxido de carbono, dando como resultado um combustível mais limpo e neutro em carbono. Os e-fuels são perfeitos para veículos mas também podem chegar aos navios e aviões.
Geração virtual (de electricidade)
O termo é um bocado enganador, tal como o dinheiro virtual (os famigerados bitcoins), mas refere-se à energia solar produzida domesticamente e que pode ser adicionada à rede quando a propriedade gera mais do que consome. Somando uma grande quantidade de pequenos produtores pode obter-se o equivalente a uma central geradora virtual. O sistema já está a funcionar em muitos países, inclusive Portugal, e deve crescer regularmente, de ano para ano, à medida que mais proprietários (rurais, presume-se) aderem.
Vertiporto
Esta é facil de perceber: trata-se de um aeroporto para carros voadores, helicóperos, aviões que descolam verticalmente e drones. O vertiporto será uma mistura de aeródromo, posto de abastecimento e paragem de veículos aéreos de transporte colectivo. Pode ainda ser integrado num interface de transportes (“hub”) que inclui veículos colectivos convencionais, como autocarros e comboios. É facil de imaginar, a Estação de Sete Rios com um vertiporto em cima, não é?
Energia solar espacial
Como muitas vezes acontece, esta ideia nasceu na ficção científica; foi proposta por Isaac Asimov em 1941. Trata-se de captar energia solar em satélites, que a enviam para a Terra sob a forma de microondas. Há pesquisas a decorrer em vários países (os do costume: Estados Unidos, Alemanha, Reino-Unido, China e Japão). Tecnicamente está ao nosso alcance, o problema é o custo do enviar os satélites para o espaço a um preço competitivo com as actuais fontes de energia. Mas os satélites estão cada vez mais baratos e a electricidade convencional cada vez mais cara...
E pronto, aqui estão as realidades possíveis para 2023.
Já agora, numa outra ordem de ideias, podemos falar da “palavra do ano” de 2022. Como sempre, foi apurada pelo Dicionário de Oxford, depois de uma consulta a que responderam centenas de milhares de leitores. E é intraduzível: goblin mode. Lliteralmente, um goblin é um duende. Quer dizer “um tipo de comportamento descarado de preguiça indulgente, desleixada ou gananciosa, que rejeita as normas sociais ou as expectativas”. Difícil de perceber, mas percebe-se muito bem.
Provavelmente também se aplica a 2023...
Comentários