Vivemos numa bolha. Não há mal nisso, cada um constrói as suas referências, rodeia-se do que considera essencial e de quem gosta. Talvez tenhamos dificuldade em valorizar a bolha onde nos metemos porque, próprio da condição humana, não resistimos a fazer comparações e há sempre alguém que consideramos menos e que tem mais do que nós. A isto também se chama inveja e ela abunda por aí. Outra característica pouco digna do ser humano é este prazer em espiar a miséria alheia, e não em nos congratularmos com a sorte de alguém, não sabemos festejar com alegria o sucesso do Outro. Do que gostamos mesmo é poder sofrer por via indireta, para manter um discurso de “ó, coitado, que horror”, um exercício coletivo de expressão de uma bondade que, bem vistas as coisas, não existe.

Quando chegamos a esta época natalícia estas coisas passam a não ter peso algum, a toxicidade do comportamento indevido é perdoada sabe-se lá porquê. É Natal. Tudo passa e tudo é válido. Uma das coisas que a pandemia trouxe à minha vida foi a capacidade de selecionar, ou se preferirem, de peneirar os afectos. Este ano foi espelho disso mesmo: poucas pessoas me aborreceram pela simples razão de que escolhi muito bem as pessoas com quem quero estar, com quem quero gastar energias. Tenho amigos que são um sustento incrível, são um consolo, são alegres e capazes de festejar o sucesso alheio. Têm aquilo que se designa como “inveja da boa”. No final do ano, em tempo de balanço, concluí que não quero muitas mudanças em 2023. Estou bem assim. 

Os meus amigos são poucos, mas bons, e são a minha gente. Posso ligar a dizer: vou aí comer uma sopa. Posso escrever uma mensagem fora de horas, por estar triste com alguma coisa. Sei que terei sempre retorno, terei sempre uma resposta coberta de carinho. Não é fácil ter amigos, as relações dão trabalho e nós, seres humanos, somos diferentes. Encontrar um caminho de alegria com outras pessoas, e assumir as diferenças com naturalidade, parece-me a coisa mais óbvia de se fazer. Ajuda muito não viver deslumbrada com as amizades, como porventura sucedia na adolescência. Assim, neste Natal, desejo-vos amigos, dos bons, daqueles que nos abraçam e não têm medo de dizer: adoro-te. Se conseguirem ter esta riqueza na vossa vida, garanto-vos que já ganharam.