Bob Marley, em 1979, compôs e interpretou Zimbabwe, canção que galvanizou tanta gente pelo mundo e que centrou esperanças no exemplo deste pequeno país cheio de recursos agrícolas e minerais.
Em 1980, na sequência de uma cruel guerra civil, Mugabe, com 56 anos, tomou o poder no que era até então a Rodésia, governada pela minoria branca em absurdo apartheid, idêntico ao da vizinha África do Sul. Prometeu reconciliação e pragmatismo.
Mugabe tinha sido educado em escolas de missionários jesuítas e fez a universidade em Fort Hare, na África do Sul, pela qual passaram líderes de movimentos de libertação africanos, como Mandela, Nyerere e Kaunda. Ativista na guerrilha contra o poder regional branco encabeçado por Ian Smith, Mugabe aparecia como o intelectual. Passou 10 anos nas prisões sul-africanos e voltou à liberdade, em 1974, como líder.
Usou Moçambique como base e, hábil a negociar, conseguiu apoios internacionais para forçar a independência da Rodésia. Mugabe foi impulsionador, nos Acordos de Lancaster House, de uma nova constituição que fixava a soberania para o país independente que deixava de ter o nome com origem num deplorável expoente do colonialismo britânico em África, Cecil Rhodes. O país passava a chamar-se Zimbabwe, teve as primeiras eleições livres em 1980, e o movimento ZANU, de Mugabe, triunfou. Chegou ao poder como primeiro-ministro, passaria a presidente em 1987. Nessa época, já havia muitas suspeitas em torno do clã Mugabe, com histórias de traições e vários casos de militantes adversos mortos em circunstâncias estranhas. Os adversários, reais e imaginados, eram vistos como inimigos. Mesmo assim, Mugabe impôs-se como um herói dos movimentos de libertação africanos. Ele tinha vencido o poder branco, encimado na África Austral por Ian Smith, após uma guerra civil generalizada que custou mais de 30 mil vidas.
Mugabe construiu esta imagem de herói africano ao chegar ao poder no novo país e impulsionou políticas sociais e de reconciliação racial. Porém, não tardou a aparecer o lado vilão, que o colocou como déspota criminoso. O homem cultivado, que parecia civilizado, passou, progressivamente, de herói revolucionário a responsável pela miséria do país.
É reveladora a história contada pelo britânico The Times, sobre o festim dos 85 anos de Mugabe. Foi em 2009. O Zimbabwe, com 16 milhões de pessoas, já agonizava numa gravíssima crise económica e o sistema de saúde colapsado pelo disparo de casos de cólera, malária e SIDA.
Apesar desta tragédia em terra de pobreza, fome e doença, Mugabe quis ter uma sumptuosa festa de anos. O The Times contou que encomendou 2.000 garrafas de champanhe Moet Chandon, 8.000 lagostas, acompanhadas por 100 quilos de gambas e 4.000 porções de caviar; 3.000 patos, 3.000 tortas de chocolate, 8.000 caixas de chocolate Ferrero Rocher. Tudo em honra dele próprio, Robert Mugabe, e da mulher, conhecida como Gucci Grace pela devoção que tinha pelo luxo.
Esta festa tornou-se metáfora de uma tragédia africana: salvadores da pátria convertidos em tiranos causadores da miséria do povo.
Mugabe traiu o ideal de emancipação de que era portador ao chegar ao poder em 1980. Adotou um sistema corrupto e autoritário totalmente indiferente às reivindicações da sociedade civil que oprimiu e da oposição que fez por dizimar. Tornou-se uma caricatura do ditador africano. Houve outros assim. África, o continente do futuro, merece estar livre de personagens deste tipo.
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