É comum dizer-se que futebol é muito mais que um jogo e é verdade. É união, é amor incondicional, é uma experiência transcendente para muitos e é, acima de tudo, ódio gratuito. Em apenas poucos dias, tivemos vários casos:
- A pancadaria e destruição causada pelos ingleses na final do Euro, depois de terem perdido contra a Itália. Há um vídeo dos adeptos ingleses a agredir gratuitamente adeptos italianos ao saírem do estádio. Não se via uma saída tão complicada do Euro desde o Brexit.
- O racismo dos adeptos ingleses ao insultarem os jogadores negros da própria selecção por falharem as penalidades.
- O ódio dos sportinguistas para com o João Mário, por ter trocado o Sporting pelo rival Benfica.
No primeiro caso, é normal. São ingleses e os adeptos ingleses são os melhores e os piores do mundo. Os ingleses conseguem ser dos países mais evoluídos do mundo, mas quando misturam futebol e cerveja retrocedem um ou dois estágios de evolução humana, tornando-se neandertais com um atraso. Se alguém agredisse pessoas assim na rua indiscriminadamente sem estar relacionado com futebol, a justiça teria a mão mais pesada, mas como é futebol “Oh, já se sabe, emoções ao rubro, deixai-os, coitados, perderam e estavam exaltados.”. Depois vêm queixar-se de terrorismo.
O segundo caso, infelizmente, também é normal. Ir para o Instagram de um jogador de futebol deixar emojis de macaco é só triste. Podemos argumentar que no futebol ofende-se tudo e todos e que, por isso, os insultos racistas não devem ser levados a sério porque são apenas mais um. Percebo o argumento, mas é parvo. Aliás, quando o argumento para desculpar o ódio é “Mas também odiamos e insultamos os que não são pretos!”, está tudo dito. Era o mesmo que o Hitler dizer “Eu não tenho nada contra os judeus, especificamente, eu também extermino ciganos e homossexuais!”.
O terceiro caso, também mais que normal e sempre aconteceu, especialmente desde que os ordenados dos futebolistas passaram a ser milionários. Acontece em todos os países, o Figo que o diga. Acontece com todos os clubes, o João Moutinho que o diga. Para começar, não sei para que é que os sportinguistas ficam tristes pela saída do João Mário. Foi dos jogadores mais criticados durante a época toda e que travava o jogo e jogava sem vontade. Depois, só faz falta quem quer ficar. O Sporting foi campeão porque tinha jogadores com o dobro da vontade dos outros, ficar com um jogador que prefere ir para outras paragens não vale a pena; por isso nem podemos falar em roubo do Benfica, pode ter sido um favor.
Por falar em roubo, os benfiquistas têm o presidente em prisão domiciliária e tiveram uma época desastrosa depois do maior investimento de sempre vêm cantar de galo por terem “roubado” um jogador ao Sporting. Eu percebo-vos, durante anos, nós, sportinguistas, também nos agarrávamos ao facto de jogarmos com muitos portugueses e da formação. Um gajo tem de se agarrar ao que tem em cada momento da vida. Podemos argumentar que o João Mário não foi leal e que nem dirigiu uma mensagem aos adeptos e que contribuiu para uma marosca (quiçá ilegal) para prejudicar o Sporting. Está tudo certo, é um profissional com exposição mediática e é passível de ser criticado e assobiado em campo. No entanto, sou uma pessoa simples: se vais para as redes sociais de um jogador chamar-lhe nomes e desejar a sua morte e à família porque mudou de clube, seja ele qual for, és um burgesso, grunho, burro de todo o tamanho.
Não percebo tanto ódio até porque isto do Benfica roubar o João Mário é como assaltarem-te a casa, deixarem o dinheiro e as jóias intactas e levarem-te um balde de lixo. Agora, o João Mário podia ter sido mais grato e ajudado mais o Sporting? Claro, bastava exigir "Só vou para o Benfica se contratarem também o Rosier, Battaglia e o Luiz Phellype". Os jogadores são profissionais e vão para onde têm melhores condições. Imaginem alguém ficar indignado porque um consultor informático saiu da Novabase e foi para a Deloitte. É a mesma coisa. “Ah, mas o futebol é difer…” Xiu. É a mesma coisa. Tenham juízo. Se vos pusessem um décimo dos milhões à frente trocavam o clube do vosso coração pelo rival e até faziam uma tatuagem do símbolo do vosso novo clube ao fundo das costas e embalsamavam a vossa mãe para ser a nova mascote. “Nem pensar eu seria sempre fiel ao meu clu…” Xiu. Tenham juízo.
Há um par de anos um sábio disse: "No futebol de hoje, os únicos que têm amor à camisola são os que têm de a comprar: os adeptos". Esse sábio era eu. É uma grande frase, eu sei. De nada. Podem partilhar com uma imagem a preto e branco com a cara do Morgan Freeman e dizer que é do Nelson Mandela.
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