O que aconteceu? Quem foi o atacante? Perguntas e respostas sobre o tiroteio em Paris
Esta sexta-feira um ataque levado a cabo por um homem, num centro cultural curdo no coração de Paris, fez vários mortos e vários feridos e levou a vários tumultos na capital francesa. Estas são as respostas que existem, até ao momento, sobre o incidente.
O que aconteceu?
Três pessoas morreram e outras três ficaram feridas, uma delas em estado grave, na sequência de um tiroteio na rua de Enghien, no 10.º Bairro parisiense, perto do Centro Cultural Curdo Ahmet-Kaya, no centro da capital francesa.
“Sete a oito tiros na rua, foi o pânico total, ficamos trancados lá dentro [da loja]", disse à agência noticiosa France-Presse (AFP) um lojista de um prédio vizinho que pediu anonimato.
Na rede social Twitter, a polícia francesa pediu aos parisienses que “evitem passar pelo setor” abrangido pelo tiroteio, de forma a, também permitir a intervenção dos serviços de socorro e de emergência no bairro que engloba o Grand Rex e a Porta de Saint-Denis.
Quem foi o autor do ataque?
O suspeito, que foi detido pela polícia e cuja arma foi apreendida, é um maquinista reformado de 69 anos, tem nacionalidade francesa e é conhecido pela polícia por envolvimento em duas tentativas de homicídio em 2016 e 2017, indicaram hoje fontes policiais francesas.
O presumível autor dos disparos era, contudo, desconhecido dos arquivos dos serviços secretos franceses e da Direção-Geral de Segurança Interna (DGSI), disseram as mesmas fontes.
O atacante é um dos feridos graves que resultou do tiroteio.
"O assassino, também ferido com gravidade, foi transportado para o hospital, disse a responsável pelo 10.º Bairro de Paris, Alexandra Cordebard, citada pela agência noticiosa France-Presse (AFP).
O caso está a ser tratado como um ato terrorista?
Até ao momento, o incidente não está a ser considerado um ato de terrorismo.
Foi aberta uma investigação com base nas acusações de homicídio, homicídio doloso e violência agravada. As investigações foram, por enquanto, confiadas à brigada criminal da polícia judiciária parisiense, segundo avançou o Ministério Público de Paris.
O que é que levou a que houvesse vários tumultos na cidade?
Na sequência do ataque, a comunidade curda que habita em Paris, nomeadamente no bairro em que ocorreu o ataque, manifestou-se contra a insegurança em que vive.
Os ânimos escalaram depois da visita de Gérald Darmanin, ministro do Interior ao local, onde apresentou as "sinceras condolências" pelo sucedido e deixou "uma palavra muito especial para a comunidade curda, que passou muitas perdas" .
Segundo o Le Monde, Darmanin destacou a rapidez com que a polícia atuou - “menos de quinze minutos” estava no local para deter o atacamte, que “obviamente agiu sozinho”.
O ministro disse que “não é certo (…) que [o atirador] o tenha feito especificamente para [atingir] os curdos” , mas sim para atingir “estrangeiros”.
Os incidentes começaram a escalar quando a multidão se deparou com um cordão de agentes policiais que protegiam o ministro do Interior francês, Gérald Darmanin, que ali se deslocou para avaliar o andamento da investigação e dirigir-se à imprensa.
As forças da ordem atiraram granadas de gás lacrimogéneo sobre os manifestantes, que, por sua vez, lançaram objetos na sua direção, incendiaram contentores do lixo e erigiram barricadas na rua.
A questão do curdistão turco: qual é o contexto?
Os protestos não foram só dirigidos às autoridades francesas, mas também à Turquia.
Há décadas que os curdos que vivem na Turquia, no chamado curdistão turco, e representam entre 15% a 20% da população naquele país, vivem num contexto hostil.
Distribuídos por vários países, sendo que grande parte pela Arménia, Turquia, Irão, Síria e Iraque, de maioria muçulmana sunita, sem um Estado próprio, em 1978 Abdullah Ocalan fundou o PKK, partido que defendia precisamente um Estado independente curdo na Turquia e que, seis anos depois, levou ao início de uma luta armada que terá vitimado mais de 40 mil pessoas.
Nos anos 1990, o partido recuou nas reivindicações, pedindo maior autonomia cultural e política, mas continuou a lutar.
Em 2013, foi acordado um cessar-fogo, à porta fechada, com o Governo turco. Mas o entendimento não durou mais de dois anos, depois de um atentado suicida atribuído ao Estado Islâmico - grupo terrorista contra o qual os curdos foram protagonistas na frente de guerra - que matou 33 jovens ativistas, perto da fronteira com a Síria. O PKK, na altura, acusou as autoridades turcas de ter agido em cumplicidade com o autoproclamado Estado Islâmico e respondeu com ataques a soldados e agentes turcos.
Desde então, que a paz foi sempre uma miragem, com o partido a ser considerado uma organização terrorista.
Na sequência do ataque de hoje, o Presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, acusou a Europa de rejeitar migrantes da Síria e África mas permitir a entrada no espaço europeu de cidadãos turcos acusados de terrorismo ou de golpes militares no seu país.
“O efeito negativo das vagas de ódio, produto de um ponto de vista perverso dirigido aos muçulmanos, permanece na nossa vizinhança. A atitude da Grécia chegou a um ponto de brutalidade”, disse o chefe de Estado turco na abertura de um congresso judicial em Istambul dedicado ao mundo islâmico.
Erdogan acusou os países europeus de acolherem requerentes de asilo do ilegalizado Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), a guerrilha curda da Turquia, e da confraria do predicador exilado Fethullah Gülen, a quem atribuiu o fracassado golpe de Estado de 2016.
“Convertem as suas portas em muros para sírios, iraquianos e africanos, mas franqueiam a entrada aos terroristas do PKK e aos gulenistas”, insistiu.
Recorde-se que, também recentemente, o PKK e os seus aliados das YPG são acusados por Ancara de terem ordenado o ataque que, a 13 deste mês, matou seis pessoas e feriu outras 81 em Istambul.
Ambos negaram qualquer envolvimento no ataque.
O que é o Centro Cultural Curdo Ahmet Kaya?
O Centro Cultural Curdo Ahmet Kaya é uma associação cujo objetivo é "promover a integração gradual" da população curda residente em Ile-de-France.
Ahmet Kaya refere-se ao cantor turco/curdo que foi ostracizado e perseguido pela justiça turca por crer promover a cultura curda, o que o levou mesmo ao exílio em Paris.
Como reagiu a comunidade curda?
Em conferência de imprensa, um porta-voz da comunidade curda residente em Paris disse que o seu povo está constantemente "sob ameaça" e acusa os "serviços de segurança que não estão a proteger os curdos".
O mesmo porta-voz pede ao governo Francês que pare de colaborar com a Turquia naquela que chamou de "perseguição ao povo curdo" e lembrou que "o seu povo, homens e mulheres, lutaram corajosamente contra o Daesh" e nunca foram reconhecidos.
O mesmo diz que tem de "haver vontade política" em França para que haja mais segurança junto da comunidade e questiona "porque razão os serviços secretos não sinalizaram este atacante?".
"Estamos revoltados porque alertámos as autoridades francesas várias vezes", disse o porta-voz, acusando o "envolvimento dos serviços secretos turcos" em alegados "homicídios cometidos contra a comunidade curda nos últimos dez anos", em território francês.
O que disse Emmanuel Macron sobre o sucedido?
O presidente Emmanuel Macron classificou o ataque de "odioso", que atingiu os "curdos da França" no "coração de Paris" e enviou "condolências às famílias da vítimas" deixando também um "reconhecimento às forças da ordem pela coragem e por manterem o sangue-frio".
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