O sismo da madrugada desta segunda-feira, em Sines, pode não ter sido o mais forte, nem o mais intenso dos últimos 60 anos em Portugal, como conta o Público, mas fez soar alarmes e trouxe o tema da prevenção de novo à ordem do dia. À semelhança do que aconteceu na altura dos grandes abalos na Turquia, Síria e Marrocos, no ano passado, o país voltou a questionar-se se está preparado para mitigar um eventual desastre, ou se os edifícios portugueses estão preparados para sismos.

Quando o abalo em Sines estava a acontecer, alguns utilizadores de smartphones Android espalhados pelo país receberam um alerta a dar conta de um “terramoto próximo”. Esta funcionalidade do sistema operativo da Google, que envia alertas quando são detetados sismos de magnitude acima de 4,5 na escala de Richter, rapidamente mereceu a atenção dos portugueses num momento em que até a página do Instituto Português do Mar e da Atmosfera estava em baixo devido ao aumento da procura por informação.

Este alerta da Google chega quase ao mesmo tempo do registo dos sismos e consegue fazê-lo por causa das peças que estão dentro do nosso telemóvel, mas não só: apoia-se também naquilo a que a empresa chama a “maior rede de deteção de sismos do mundo”, que é nada mais do que milhões e milhões de dispositivos a comunicarem com o servidor. Ou seja, se muitos smartphones detetam os sinais típicos de um sismo, é porque algo não está certo e será enviado um alerta aos utilizadores do Android. Mas e se pudéssemos prever os sismos com horas, ou dias de antecedência? Ao que parece, essa já começa a ser uma realidade recorrendo à Inteligência Artificial.

Como saber que um sismo vai acontecer?

A previsão de sismos tem sido historicamente desafiadora. Como conta o MIT Technology Review, por exemplo, em 1985 um grupo de cientistas do Serviço Geológico dos Estados Unidos instalou equipamentos de monitorização sísmica ao longo de uma secção da falha de Santo André, que atravessa o estado da Califórnia. O grupo baseou-se em seis sismos de magnitude aproximada 6,0 na escala de Richter, que tinham ocorrido nessa secção em intervalos relativamente regulares desde 1857, e previu que o próximo sismo de magnitude semelhante ocorreria antes de 1993. No entanto, o sismo previsto só ocorreu em 2004, com uma magnitude de 6,0.

Desde então, a tecnologia evoluiu e surgiu uma nova ferramenta capaz de ir além dos métodos tradicionais de deteção de sismos: a Inteligência Artificial que, pelos vistos, já é capaz de detetar um abalo antes de este acontecer. Exemplo disso é o caso de uma equipa de investigadores da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, que conseguiu prever 70% dos sismos ocorridos numa região da China, com uma semana de antecedência. O estudo, realizado em 2023, durou sete meses e utilizou um algoritmo de IA treinado com cinco anos de registos sísmicos da região.

O sistema previu 14 sismos, cada um dentro de um raio de cerca de 320 quilómetros do seu epicentro. Como em todos os testes, o sucesso nem sempre é garantido e, apesar das previsões acertadas, o algoritmo falhou a previsão de um sismo e previu oito que não ocorreram. Contundo Sergey Fomel, um geofísico desta universidade e membro da equipa de investigação, afirma que “ainda não estamos perto de fazer previsões para qualquer lugar do mundo, mas o que alcançámos indica-nos que o que pensávamos ser um problema impossível é, em princípio, solucionável”.

Na prática, há várias abordagens baseadas em IA que estão a ser postas à prova para melhor compreender como se pode prever um sismo. Por exemplo, a aplicação de machine learning à sismologia está a ser explorada por investigadores na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, para prever a magnitude de um sismo a partir de dados de uma única estação sísmica. Em Harvard, a utilização de neural networks é uma aposta para prever as localizações das réplicas que se seguem ao sismo principal e a California Institute of Technology está a trabalhar com deep learning para identificar ondas sísmicas em dados com altos níveis de ruído.

O machine learning também está a ser utilizado para criar bases de dados mais robustas de sismos ocorridos. No caso do British Geological Survey, os investigadores do serviço determinaram que esta tecnologia pode identificar até 10 vezes mais sismos nos dados sísmicos do que os métodos tradicionais, conta o MIT Technology Review.

Por cá, o uso das novas tecnologias aplicado à sismologia também foi explorado num projeto que juntou a Universidade Fernando Pessoa, Universidade do Porto e Universidade de Aveiro com o objetivo de investigar o papel da Inteligência Artificial na avaliação do impacto de sismos, ou seja, como é que dados recolhidos através de sensores low-cost podem ser usados para treinar algoritmos de Inteligência Artificial a avaliar automaticamente o impacto de sismos em Portugal.

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