O efeito transformador da pandemia tem sido uma história contada por várias empresas nos últimos anos. Seja na vertente de recrutamento e localização de colaboradores, seja no desenho de novos produtos adaptados às tendências e comportamentos que todos passámos a seguir, muitas foram as mudanças e voltas de 180º dadas por empresas.
Para uma entidade no setor da restauração, a transformação foi ainda mais necessária. Ao longo da última década, a Zomato construiu em Portugal a reputação de app líder na descoberta de restaurantes. Internamente, a empresa passou por várias transições passando de um negócio 100% indiano, para uma operação local autónoma a tentar singrar num mercado onde apesar de existirem mais de 50 mil restaurantes, apenas 2000 a 3000 recebem reservas online regularmente.
"Durante a pandemia, os restaurantes estavam fechados e o volume de acessos à app continuou parecido e nós percebemos que as pessoas vinham à nossa plataforma primeiro e depois encomendavam pelas plataformas de delivery. Éramos como um guia de verificação e, por isso, começámos a prestar mais atenção aos dados", é o que conta Fabiana Lopes, responsável por parcerias e pelo Data Lab na Zomato.
Este novo foco levou a empresa a repensar a forma como trabalhava os seus segmentos B2B e B2C, ainda antes desta fase em que todas as empresas sentem necessidade de mencionar machine learning e inteligência artificial em todas as suas ofertas. No lado do consumidor final, havia a oportunidade de melhorar o sistema de recomendação de restaurantes e ligá-lo à subscrição da Zomato Pro (o serviço da Zomato que dá descontos e permite efetuar pagamentos em estabelecimentos da sua rede). "Nós conseguimos ir um bocadinho mais além e tornar a plataforma mais única para cada utilizador, custom-made", refere a responsável pelo Data Lab. Contudo, era no lado de parceiros, até então menos explorado, que havia espaço para fazer algo de diferente.
Zomato, uma empresa de dados
"A Zomato vai ser sempre uma app de descoberta de restaurantes. Continuamos a acreditar que o mercado português se faz muito à mesa e queremos ser a plataforma que dá essas experiências gastronómicas. Ao mesmo tempo, queremos ser uma marca amiga das outras marcas", partilha Fabiana Lopes.
Esta vontade levou a empresa a desenhar uma nova forma de trabalhar com parceiros e a que o Data Lab fizesse todo o sentido. Por parceiros, entenda-se não exclusivamente os milhares de restaurantes que estão na base de dados da Zomato Portugal, mas principalmente as marcas de consumo que cada vez mais procuram um posicionamento digital diferente e um modelo para terem uma maior presença em vários destes espaços. À primeira vista, este posicionamento não é necessariamente óbvio: podia ser mais fácil só tirar o máximo proveito da rede de restaurantes e ter como principal serviço o fornecimento de "insights" sobre o comportamento de clientes - que tipos de cozinha mais procuram, que tipos de pratos são mais requisitados, qual a despesa média, localizações mais rentáveis, entre outras métricas. Esta oferta existe do lado da Zomato, mas está longe de cobrir todo o potencial que vêem na sua plataforma, dado que olham para as marcas e vislumbram a oportunidade de se tornar uma espécie de parceiro de I&D (Investigação e Desenvolvimento ou mais conhecido R&D). "Permitimos que elas [as marcas] testem hipóteses connosco e que analisem a sua situação face à concorrência", explica Fabiana Lopes.
O desafio para a maior parte das marcas em restaurantes é o facto de estarem dependentes das grandes distribuidoras: têm pouco controlo onde o produto vai acabar e na forma como chega ao cliente final e não têm acesso a muitas métricas relativas à performance dos seus produtos. Na app da Zomato, a situação muda. "Nós analisamos tudo dentro da plataforma: fotos, reviews, temos mais de 70 data points que ajudam marcas a analisar o setor da restauração. Conseguimos perceber qual a região onde existe uma maior penetração de um determinado produto/marca vs o seu principal concorrente e indicar que zonas precisam de um maior foco comercial", de acordo com a responsável da Zomato.
Este tipo de insights permite que a Zomato se torne uma parte fundamental do desenvolvimento de qualquer produto, ajudando marcas a ter uma integração e posicionamento mais eficaz no menú de cada restaurante. Alguns exemplos:
- Se o produto é uma água com gás, no menu de cada restaurante aparece o nome da marca ou a descrição mais genérica? Será que o produto está na galeria de fotografias disponibilizadas pelo restaurante e/ou clientes?
- Se o produto é destinado a cozinha mexicana na Grande Lisboa, a Zomato ajuda perceber se existe mercado para esse produto e o melhor posicionamento.
- Se as marcas estão no processo de desenhar um novo produto, dados como o aumento da procura/lançamento de restaurantes vegetarianos podem ajudar a traçar uma estratégia mais eficaz.
Resumidamente, a Zomato quer desenvolver a mancha digital de cada marca no setor da restauração.
O Futuro da Zomato (e dos seus dados)
A estratégia da empresa passa por integrar na sua aplicação todos os serviços associados ao setor da restauração — o que representa um investimento cada vez maior não só no delivery, mas também na implementação de um sistema de pagamentos. Por um lado, poderá dar uma vantagem competitiva à Zomato face à concorrência, na qual tira proveito do seu catálogo vasto de restaurantes para implementar dois serviços já direcionados para milhares de utilizadores finais, para além da subscrição do Zomato Pro. Por outro, dá-lhe uma riqueza de dados que pode levar a uma experiência de utilização superior, como melhores insights para marcas parceiras definirem a sua estratégia.
"Consigo ser uma melhor plataforma para os utilizadores porque se eu sei o que eles pesquisam, reservam e o que eles pedem de delivery, eu consigo oferecer sugestões com base no que o utilizador procura. A Zomato vai ser completamente diferente de utilizador para utilizador", remata Fabiana Lopes.
Duas marcas que em Portugal já estão a trabalhar diretamente com a Zomato são a Coca-Cola e o Recheio (do grupo Jerónimo Martins), sendo que a expectativa da empresa (e do Data Lab) é conseguirem produzir cada vez mais case studies de sucesso e apoiarem o desenvolvimento do setor da restauração.
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