“Ele nunca estava satisfeito apesar do sucesso”, disse o cineasta Ron Howard em entrevista à Lusa, referindo que foi esse foi um dos pontos que mais o surpreendeu durante a realização do filme “Jim Henson Idea Man” (“O homem das ideias”, em tradução livre).
“Ele estava sempre a batalhar, sempre a correr riscos”, continuou. “Mas isso queria dizer que estava sempre a desiludir-se a si próprio. Às vezes o público não respondia a um projeto que significava muito para ele e no qual trabalhara muito”.
Apesar da sua alegria e amor pela vida, “havia uma corrente subterrânea de frustração ao nível criativo que o impulsionava”, descreveu o cineasta. “Senti que isso era ao mesmo tempo relacionável e comovente”.
Criador de personagens icónicas como o Sapo Cocas, Miss Piggy, Gonzo, Urso Fozzie, Conde de Contar, Monstro das Bolachas e Poupas, entre muitas mais, Henson alcançou o sucesso inicial no final da década de 1950, com um programa diário de cinco minutos na NBC. Mas precisou de duas décadas para conseguir fazer a sua série “The Muppets Show”, ou “Os Marretas”, que todas as estações rejeitaram durante anos.
“Era um grande artista, experimentava e corria riscos com filmes experimentais e pensamos nele como alguém que só teve sucessos, mas não reconhecemos quão irregular foi o caminho”, frisou Ron Howard, realizador de “Frost/Nixon”.
O novo filme desvenda esses segredos com recurso a fotos, vídeos e textos cedidos pela família e entrevistas com aqueles que trabalharam e privaram com ele.
Ron Howard, cineasta galardoado com dois Óscares pelo filme ”Uma Mente Brilhante”, embarcou no projeto durante mais de dois anos. Foi a família de Henson que o contactou inicialmente.
“Reconheci que eles queriam um cineasta que chegasse e interpretasse esta história com verdade”, afirmou. “E mostraram-me horas de imagens de arquivo fantásticas”.
Tanto Jim Henson como a sua mulher Jane Henson, sem a qual não teria sido possível a criação dos fantoches-marionetes que deram origem aos Marretas (“muppets”, em inglês), não gostavam de dar entrevistas, pelo que são os filmes de arquivo que revelam mais sobre eles.
“Vemos muito das suas personalidades nestes filmes experimentais, velhos anúncios publicitários e coisas que são incríveis e criativamente reveladoras”, explicou Ron Howard.
Foi isso que atraiu o cineasta para o projeto. “Senti que tínhamos muito para partilhar com as audiências para lá dos personagens que conhecemos tão bem”.
Howard queria ainda contar a história da família e o seu contributo para a obra prolífera de Henson, apesar da sua morte precoce aos 53 anos. “Só estive com ele uma vez”, referiu o cineasta, considerando que foi o trabalho com “Rua Sésamo” que teve mais impacto nele.
“Ele adorava o que fazia e precisava de criar. Essa criatividade inquieta e a forma como definiu a família e o seu trabalho era aquilo que eu queria partilhar com as audiências”, referiu Howard.
Uma das revelações do documentário é que Henson teve um projeto para abrir discotecas, que não chegou a realizar-se. “Ele queria fazer espetáculos na Broadway, queria discotecas. Adorava música e estava constantemente a escrever e a desenhar”, disse Howard. Tudo isto contribuiu para a estética dos Marretas e dos outros personagens criados por Jim Henson, que continuam a ser extremamente populares.
“Mais que qualquer outra coisa, admiro os riscos que ele tomou e o querer sempre conectar as suas ideias com a audiência de uma forma que permitia às pessoas sentirem a verdade do mundo de uma forma divertida e às vezes hilariante”.
As fotografias, os pensamentos escritos e os vídeos desenterrados pela equipa de Ron Howard ajudam-nos a compreender “o que foi preciso para criar estes personagens monumentais que nos tocaram a todos”.
“Jim Henson Idea Man” foi mostrado no festival de cinema de Cannes, que decorreu nas últimas duas semanas. em França, e estreia-se na sexta-feira, 31 de maio, na plataforma de ‘streaming’ Disney+.
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