“Sombras das sombras” compila poemas selecionados a partir de sete obras do vencedor do Prémio Princesa das Astúrias das Letras 2017, escritas entre 1982 e 2009, e é o mais recente título da coleção de poesia da Tinta-da-China, coordenada por Pedro Mexia, que a editora publica numa versão em português e polaco.
“Poeta lúdico e grave, espiritual e cético, legível e enigmático”, é como Pedro Mexia classifica Zagajewski; “místico da imaginação liberal” é como lhe chama o crítico norte-americano Adam Kirsch, no prefácio a esta edição.
Para Kirsch, a obra de Adam Zagajewski responde à pergunta: “Pode um poeta moderno escrever poesia mística convincente?”
Exilado durante muitos anos, o poeta polaco começou por escrever poesia comprometida, oposicionista, mas “foi evoluindo para uma atitude meditativa, irónico-metafísica, atenta a pequenas epifanias e aporias”, descreve Pedro Mexia.
Adam Kirsch detalha que Zagajewski emergiu como poeta e polemista destacado em 1974, com a publicação de um manifesto que atacava a literatura descomprometida das décadas anteriores.
Contudo, a sua obra foi evoluindo num sentido de “fuga deliberada à poesia politicamente comprometida”, com a antítese entre política e poesia, coletivo e privado, a tornarem-se “o assunto principal” da sua obra de maturidade.
Zagajewski é um poeta místico, mas sem “uma doutrina, um sistema, nem sequer uma única verdade”, tendo-se tornado um “poeta moderno representativo: um místico da imaginação liberal”, afirma Adam Kirsch.
E explica: “A sua visão do místico não implica uma exigência existencial avassaladora. Contenta-se com ver os contornos de algo mais elevado assomando através das coisas deste mundo, sem exigir que se revele completamente”.
O sinal mais claro deste apego do poeta ao mundo é a sua escrita, marcada por uma melancolia “temperada por absurdos breves e memoráveis”, que contrariam a regra de que “a mística e o humor raramente combinam”.
A combinação está patente no excerto de um texto evocado por Adam Kirsch, em que Zagajewski escreve: “o que são as igrejas barrocas? Ginásios/ de luxo para santos atléticos”.
Poeta, romancista, tradutor e ensaísta, Adam Zagajewski, nascido em 1945, em Lwów, costuma dizer que todo o grande poeta vive entre dois mundos – o tangível e o imaginário, o da história e o dos sonhos — e que, dos acordos e desacordos entre ambos, surgem, após árduas negociações, os poemas.
Considerado um dos mais famosos poetas polacos contemporâneos, fez parte da chamada Geração de 1968 ou New Wave, e criou dois dos principais ‘slogans’ deste grupo: “Powiedz prawde” (“Diz a verdade”) e “Mow Wprost” (“Fala”).
Adam Zagajewski tem visto as suas obras literárias traduzidas para várias línguas e serem reconhecidas internacionalmente, através de diversas distinções, entre as quais o Prémio Literário Internacional Neustadt, o Griffin Poetry Prize e o Prémio Princesa das Astúrias, este último atribuído em junho deste ano.
Na altura, o júri do prémio considerou que o escritor contribui “de maneira extraordinária e a nível internacional, para o progresso e o bem-estar social através do cultivo e do aperfeiçoamento da criação literária em todos os seus géneros”.
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