No mundo da música e do entretenimento, para os músicos e promotores os dias andam sempre à frente do calendário.

“Já estamos a trabalhar há 6 meses a edição de 2023 do NOS Alive”, anunciou Álvaro Covões, diretor da Everything is New, promotora responsável. “Agora não vou dizer nomes”, acrescentou em conversa com o SAPO24 à margem de uma conferência que decorreu ontem no Monsantos Open Air, em Lisboa, ao lado de Dino Santiago, evento relacionado com a edição de 2022.

O artista português de ascendência cabo-verdiana estreia-se no recinto do passeio marítimo de Algés depois de ter tudo agendado em... 2018. É a tal questão de calendários. “Venho a fazer um warm up desde 2016, depois de uma confirmação em 2018. Tracei com o meu manager um caminho gigantesco de estar no NOS Alive”, adiantou Dino Santiago. “Nada paga a plateia cheia a cantar canções que deixam de ser tuas e passam a pertencer à imensidão de pessoas que as canta”, aludiu aquele que será um dos nomes a atuar no palco Heineken (7 de julho).

“Há muitas pessoas com bilhetes há mais 900 dias”, revelou Álvaro Covões. “A edição foi posta à venda em setembro de 2019”, relembrou sem quantificar o número. “É difícil”, disse, relembrando um detalhe. “O festival esteve parado três anos e não dois”, sublinhou.

Mas esta antecipação de compras não é caso único. “Temos um concerto dia 5 - Fat Freddy's Drop - no Campo Pequeno com vendas abertas em novembro de 2018. Foi sendo adiado e acontece em 2022”, frisou.

“As pessoas querem ouvir e ver mais música portuguesa”

Questionado pelo SAPO24 se o número inusitado de bandas portuguesas se deve a uma espécie de almofada de apoio criada por causa da pandemia, Álvaro Covões refere que "é uma aposta na qualidade. As pessoas querem ouvir e ver mais música portuguesa”.

E aproveitou o embalo. “A música não tem género e, pessoalmente, quando se vem falar em quotas na cultura é um disparate. Até o homem-elefante tem direito a trabalhar no circo”, argumentou.

Sobre os nomes prestes a subirem aos diversos palcos em Algés garantiu: "não escolhemos nem por género nem por nacionalidade. Programamos o que as pessoas querem e estão a ouvir e aquilo que está a dar, passa na rádio e é mais recente”.

Continuou no tema de escolhas. “No Coreto, durante anos fazíamos um dia só com mulheres. Era por estética e não por política”, garantiu. “Este ano temos três. Tudo português”, assegurou.

“Finalmente as mulheres estão a entrar na música”, atirou. Puxou da memória para sustentar a afirmação. “Fiz com a EDP um programa de novos talentos, Espanha, Portugal e Brasil, e o prémio era vir a Portugal ao NOS Alive. No brainstorming final contava duas ou três mulheres entre os 8 finalistas. E hoje em dia continua...”

O festival das 96 nacionalidades

O NOS Alive é considerado o festival mais internacional de todos. “96 nacionalidades até há uma semana”, anunciou Álvaro Covões. “25 mil estrangeiros e 70 mil portugueses em termos de unique visitors (visitantes únicos)”, indicou. “Mas não é um número final”, alertou. “Numa edição de três dias temos 165 mil espectadores, mas podemos ter 20 mil estrangeiros”, exemplificou o diretor da promotora de espetáculos e eventos.

Em relação a expectativas para a edição de 2022, espera “esgotar o terceiro dia e ter 47 mil pessoas no primeiro dia”, diz, esperançado. “Não sabemos é os No Shows – pessoas que compraram há mais de 900 dias e não sabemos se vem ou não. Se se lembram que têm bilhete”, sorri.

E também é tempo de relembrar as 14 edições passadas. “São 14 edições em 16 anos. Tivemos tantos momentos memoráveis. Quando falamos em causa própria somos uns vaidosos, mas é muito difícil. Momentos históricos... há os que eu gosto, Gossip, Florence and the Machine, Radiohead, Pearl Jam, tanta coisa boa”, confidenciou.

Um desejo chamado Tom Waits e o teatro à espera de espaço

À pergunta quem gostaria de ter e quem tentou e não conseguiu, Álvaro Covões não hesitou na resposta. "Não podemos idealizar um cartaz e tê-lo. Estamos sempre dependentes dos artistas, disponibilidade essa dependente de duas coisas: o disco — o trabalho que lançou e vai para a estrada — e a logística. Entra em digressão e começa pela América ou está na Europa, na Finlândia, e não vem a sul”, detalhou.

“Há um nome que nunca veio a Portugal e toda a gente gostaria que é o Tom Waits, mas não sei se ainda faz espetáculos. Mas já tentei”, revelou. “Uma vez estava a fazer circuitos de teatros de ópera e o São Carlos estava em obras e quem lá estava não iria autorizar de qualquer forma”, lamentou. “Por exemplo, o Iggy Pop tocou em Madrid no teatro Real”, comparou.

O NOS Alive mudou ao longo dos anos. Inovou e alargou espectros. “Muito importante, quando lançámos o palco Comédia diziam, inclusive os comediantes, que as pessoas iam para ouvir música. Mas disse: temos de entrar num mundo novo. É bom para a indústria juntar comediantes”, relembrou.

À comédia juntou outra aposta: Fado. “Temos a única casa de fados ambulante do país e podemos montar onde quisermos. Tem o naming EDP. É um conceito para 450 pessoas de pé”, frisou Álvaro Covões. “O problema do NOS Alive é ter uma oferta tão vasta”, rematou.

Sempre de olhos no que pode apresentar de novo e inovador, o diretor da Everything is New admitiu ainda faltar algo em Algés. “Se tivesse mais espaço... era engraçado ter teatro”, revelou, embora admita que a existência de mais metros quadrados não é tarefa fácil. “Ter mais espaço? Tudo é possível”, suspirou.

Um mar de possibilidades que espera ter no mundo que construiu. “Um dia este país vai ter uma estratégia e aí o país dará um tratamento diferente aos eventos, em especial, os nacionais. Na Web Summit é toma lá não sei quantos milhões, a chave da cidade, e connosco é só dificuldades...”, finalizou a conversa.