Pelosi e Costa, dois líderes “sem rebuço”

“Rebuço”. Para além de ter uma sonoridade engraçada, é uma palavra que fica no ouvido. É provavelmente com esse fim que António Costa a tem usado ao longo da pandemia.

O dia que o país temia chegou hoje. Foi dito ao longo dos meses que Portugal não aguentaria outro confinamento, mas, para usar outra expressão que se entronizou nos ditos populares, (re)entrámos na época do “aguenta, aguenta”.

Perante o estado de emergência sanitária, foi hoje revelado que, a partir de 15 de janeiro, ou seja, próxima sexta-feira, o país entra no segundo confinamento, estando a decisão sujeita a revisão a 30 de janeiro.

Perante a brutalidade da situação, António Costa lembrou a advertência que fez a 30 de abril, quando apresentou o plano de desconfinamento: Nunca terei vergonha ou qualquer rebuço para dar um passo atrás".

E não só não teve, como hoje atestou, como o país também teve de dar o dito passo atrás. Mas a situação não é, claro está, idêntica à que vimos em março.

Se por um lado, os números da pandemia são muito piores — hoje batemos mais recordes negativos, com 156 mortos e 10.556 novos casos —, por outro as medidas também não são as mesmas, tendo-se gerado alguns consensos quanto ao que funciona ou não numa pandemia.

Um deles — que terá feito suspirar de alívio muitos pais e pedagogos — foi o de manter todos os estabelecimentos de ensino (creches, escolas e universidades) abertos sem exceção, sublinhando-se a necessidade de "não voltar a sacrificar a atual geração de estudantes". Para que tal aconteça com o mínimo de riscos possível, vai ser lançada uma "campanha de testes antigénio para detetar casos de infetados".

Essa foi a grande novidade. De resto, poucas inovações, à exceção da duplicação das coimas previstas para a violação das normas relativas à pandemia: teletrabalho obrigatório, dever de recolhimento, proibição de eventos públicos e uma série de espaços encerrados.

A respeito deste último ponto, há uma longa lista (sublinhe-se o “longa”) de estabelecimentos que vão poder manter atividade, se bem que António Costa pediu às pessoas que se fixem na regra de "ficar em casa" e não nas exceções.

Com estas medidas tão necessárias como impopulares, o primeiro-ministro defendeu assim a sua falta de “rebuço” para fazer o que é necessário, mas não foi o único líder a mostrar vontade resoluta neste dia.

Do outro lado do Atlântico, Nancy Pelosi liderou o processo na Câmara dos Representantes dos EUA para fazer história, se bem que pelas piores razões. Ao fim de duas horas de votação, os congressistas da sua bancada democrata, assim como 10 representantes do lado republicano, votaram para colocar Donald Trump de novo sob processo de impeachment, fazendo dele o primeiro Presidente de sempre dos EUA a ser sujeito a tal procedimento por duas ocasiões distintas.

A justificação para tal é bem conhecida — o atual Presidente dos EUA foi acusado de incitar a invasão do Capitólio dos EUA levada a cabo pelos seus apoiantes e que resultou em cinco mortos. “Sabemos que o Presidente dos EUA incitou esta insurreição, esta rebelião armada, contra o nosso país. Ele deve ir embora. Ele é um perigo claro e presente para a nação e para todos nós”, disse Pelosi, na declaração inicial do debate no Congresso.

Mas se as causas são conhecidas, as consequências nem por isso. Tornado lei o artigo de impeachment para Donald Trump, falta agora o Senado conduzir o julgamento político para condenar ou absolver o atual presidente dos EUA. Em 2019, recordemo-nos, Trump esteve na mesma posição, mas se o impeachment passou na Câmara dos Representantes, esbarrou no apoio maioritário republicano no Senado, tendo sido absolvido.

Não é certo que o mesmo vá acontecer desta vez, já que o partido Republicano mostra sinais de descontentamento com Trump, mas esse nem sequer é o aspeto mais bizarro desta contenda. É que, com o atual Presidente dos EUA a sete dias de terminar o seu mandato e de passar a tocha a Joe Biden, a sessão do Senado, que só deverá ser iniciada no dia 19, visará destituir ou não um presidente que já nem sequer estará no cargo.

Mesmo perante esse cenário, o processo não perderá ainda assim importância: se Trump for condenado, nunca mais poderá concorrer a cargos políticos federais, ou seja, esfumar-se-ão as suas aspirações de voltar a candidatar-se à Casa Branca. A arquitetura legal de condenar o presidente que já não o será é que promete causar confusão. Como aconteceu tantas vezes ao longo deste caótico mandato, estamos perante o desconhecido

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