Com um nível de eficácia de 90% na etapa intermédia da fase 3, sete dias depois da inoculação da segunda dose da vacina em pessoas que nunca tinham sido infetadas com o vírus SARS-CoV-2, o laboratório farmacêutico afirmou que pretende fornecer 50 milhões de doses ao mundo ainda em 2020 e que pedirá, ainda este mês, autorização para a utilização em situações de emergência nos Estados Unidos.
A Pfizer não forneceu mais detalhes, mas alertou que a taxa de proteção inicial pode mudar até o final do estudo. Albert Bourla, presidente e diretor executivo da Pfizer, afirma que serão revelados mais dados nas próximas semanas e que no final do ano deverá ser possível analisar a informação dos ensaios clínicos.
Como funciona a vacina?
Para a vacina, os cientistas recorreram a uma molécula genética chamada mRNA – RNA mensageiro que contém uma mensagem do código genético do SARS-CoV-2 –, que permite desencadear uma resposta imunitária contra o vírus.
Desta forma, a vacina não contém nenhuma componente viva do SARS-CoV-2, mas sim material genético para ajudar o organismo a produzir a proteína do vírus (spike ou espigão). Ao receber a vacina é expectável que o organismo produza anticorpos contra a respetiva proteína, para que em situações de exposição ao vírus, o sistema imunitário possa reconhecer o mesmo e desencadear uma resposta imunitária.
De acordo com Susana Castro Marques, diretora médica da Pfizer em Portugal, em entrevista à Visão, a produção de anticorpos provocada por esta vacina será três vezes superior àquela que é produzida por pessoas infetadas que recuperaram.
Os ensaios clínicos estão a ser realizados em 43.538 voluntários, dos quais metade foi inoculada com a nova vacina e a outra metade com um placebo.
A vacina foi administrada em duas doses, sendo que a segunda já foi administrada a 38.955 voluntários. Os ensaios clínicos serão terminados quando 164 voluntários tiverem sido infetados com o vírus e aí proceder-se-á à análise dos resultados finais.
Nota: Apesar de animadores, estes resultados são preliminares e não foram publicados em nenhuma revista científica.
A vacina é segura?
A Pfizer e a BioNTech testaram quatro versões da vacina, esta versão BNT162b2 terá sido a que apresentou menos efeitos colaterais.
De acordo com o jornal britânico Mirror, uma das voluntárias do ensaio da vacina, Carrie, de 45 anos, afirma ter sentido dor de cabeça, febre e dores no corpo e afirmou que os efeitos secundários foram mais graves após a segunda injeção.
Já outro voluntário, Glenn Deshields, de 44 anos, comparou os sintomas a "uma forte ressaca" e afirmou que posteriormente realizou um teste de anticorpos, através do seu médico, e o resultado foi positivo, por isso estava confiante que tinha recebido a vacina e não o placebo.
As empresas afirmaram também que, até ao momento, não surgiram "preocupações sérias de segurança", mas que vão continuar a recolher dados.
Segundo explicou Paul Hunter, professor de medicina na Universidade de East Anglia, em Norwich, Reino Unido, ao The Guardian, há alguns efeitos secundários – como os relatados acima pelos voluntários – que são bastante comuns nas vacinas. Explicou, no entanto, que por se tratar de um novo tipo de vacina, que utiliza mRNA e que até agora não foi aprovada para utilização em humanos, não é impossível que alguém possa ser alérgico a um componente da mesma.
Os organismos responsáveis pela regulação dos fármacos vão avaliar continuamente os efeitos e os participantes dos ensaios clínicos serão monitorizados ao longo de dois anos. Para já, um conselho independente de especialistas deverá ainda realizar a análise da informação recolhida sobre a segurança e a eficácia da vacina.
Pode prevenir a manifestação severa da doença e a transmissão?
Ainda não foi possível avaliar se a vacina protege efetivamente contra a infeção por SARS-CoV-2 ou se simplesmente atua sobre o desenvolvimento de sintomas depois de infetado.
O estudo foi concebido para detetar se a vacina pode proteger contra a doença grave de covid-19, segundo a Pfizer, mas os dados ainda não foram publicados.
"O que podemos dizer é que a vacina parou a infeção sintomática clínica, mas há incerteza sobre a infeção assintomática", explicou Hunter, acrescentando que é expectável obter a resposta à questão à medida que se avança na investigação.
"Se está a parar a infeção então, por definição, deveria estar a parar a transmissão de uma pessoa para outra”.
"Se não contrair a infeção por estar imunizado, não me vai conseguir infetar. Mas, se for uma infeção assintomática, ainda existe o potencial de risco de me poder infetar, embora seja quase certo que será muito mais baixo do que se estiver realmente doente clinicamente".
Não é assim, para já, possível assegurar se a vacina será igualmente eficaz em todos os casos da doença – ligeiros, moderados ou mais graves – ou se depois de tomar a vacina se fica apenas assintomático mas com capacidade de transmitir o vírus.
Funciona para os mais velhos?
Os adultos até aos 85 foram incluídos no ensaio, mas os dados segmentados por faixas etárias não foram ainda divulgados. O professor Hunter explicou que a maioria das vacinas não funcionam tão bem em pessoas mais velhas, quanto em pessoas mais jovens, uma vez que nem sempre conseguem desenvolver uma resposta imunológica eficaz a infeções naturais.
Porém, o ensaio clínico deverá permitir tirar conclusões sobre a proteção pela vacina nos mais velhos.
Porque tem uma taxa de 10% de ineficácia?
Stephen Griffin, professor associado da Escola de Medicina da Universidade de Leeds, no Reino Unido, refere que é difícil explicar porque é que a vacina não funcionou em alguns pacientes sem saber quem são.
"A vacina atuará em pessoas diferentes de forma diferente. Assim, é frequente obter-se diferentes taxas de resposta dentro das populações. Pode ser que sejam todos mais idosos, ou pode ser que tenham uma origem racial diferente, ou pode ser apenas que esta coisa só funcione nove em cada 10 vezes”, detalhou.
No entanto, a eficácia de 90% deverá ser suficiente, uma vez que a FDA (Food and Drug Administration), autoridade reguladora nos Estados Unidos, apenas requer uma eficácia de 50% para autorizar a produção em massa de uma vacina contra o coronavírus.
Quanto tempo dura a proteção?
A taxa de eficácia de 90% foi calculada sete dias após a inoculação da segunda dose, mas os resultados são suscetíveis de sofrer alterações com a recolha de dados a longo prazo.
Segundo Beate Kampmann, professora de infeção pediátrica e de imunidade na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, geralmente, para determinar quanto tempo dura a proteção da vacina são necessários estudos de acompanhamento para que sejam detetados os níveis dos tipos de respostas imunes – anticorpos e células T – bem como eventuais riscos de exposição repetida. Assim, não é possível indicar durante quanto tempo a vacina garante imunidade.
Quais são as principais vacinas em desenvolvimento?
A Moderna também tem uma vacina de mRNA que se encontra na etapa de ensaios clínicos de fase 3 e existem ainda outras vacinas diferentes, algumas baseadas em formas atenuadas do vírus.
Depois de o anúncio da Pfizer, também o Fundo de Investimento Direto Russo anunciou que os resultados preliminares da última fase de ensaios da vacina russa Sputnik V apontam para uma eficácia de 92%.
Os resultados preliminares contam com ensaios clínicos em 16 mil participantes a receberem, também, duas doses da vacina, com um período de 21 dias de intervalo.
A fase 3 dos ensaios clínicos da vacina incluem um total de 40 mil participantes e um quarto dos voluntários vão receber um placebo no lugar da vacina.
O país tinha sido o primeiro a registar a vacina contra a covid-19, ainda antes de ter iniciado a fase 3 de ensaios clínicos, que terá apenas começado em setembro. Vários especialistas e a Organização Mundial de Saúde questionaram se todos os procedimentos de segurança estariam a ser seguidos ou se, eventualmente, não estariam a realizar todas as etapas do processo.
Além desta vacina, o conglomerado farmacêutico AstraZeneca também prevê apresentar a eficácia da vacina contra a covid-19 até final do ano. A vacina foi desenvolvida em parceria com a Universidade de Oxford e está nos últimos ensaios clínicos nos Estados Unidos da América, no Reino Unido e em outros países, para determinar a segurança e eficácia.
Na segunda-feira, dia 9 de novembro, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ordenou a suspensão dos testes clínicos com a vacina Coronavac, produzida pela farmacêutica chinesa Sinovac, alegando a ocorrência de um “evento adverso grave” com um dos voluntários da fase três dos ensaios. No entanto, um parecer do Instituto Médico Legal (IML) brasileiro indica que a morte se tratou de um suicídio e não de complicações decorrentes dos testes. A situação ainda está a ser avaliada. A Coronavac também se encontra na fase 3 e trata-se de uma vacina tradicional, em que é administrado o vírus inativado. Os dados provisórios são esperados em novembro.
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