Numa cimeira marcada por vários impasses, críticas e até abandonos da sala, os países representados na COP29 em Baku, no Azerbaijão, chegaram a acordo sobre o comércio de emissões de carbono e criação de um mercado global regulado para cumprir o Acordo de Paris.

Em causa está, mais especificamente, o artigo 6º do acordo que apela aos países para que cooperem na redução global de emissões de carbono, estabelecendo que um país pode transferir para outro os créditos de carbono que ganhou reduzindo as suas emissões.

Na prática, isto significa que os países que libertam pouco dióxido de carbono (C02) podem vender licenças de emissão a quem mais gera, sob a gestão das Nações Unidas, com garantias e registo.

E essa é uma das razões de insatisfação - mas não a única.

Para a Greenpeace, os mecanismos acordados no mercado de carbono “são uma farsa”, ao permitir que a indústria fóssil compense novas emissões.

A Greenpeace sublinha que a decisão final não representa qualquer progresso na exigência de abandono progressivo dos combustíveis fósseis e não tem qualquer decisão no sentido de cobrar  impostos sobre a indústria fóssil. O acordo sobre os mercados de carbono permite, precisamente, que estas empresas comprem o direito de continuar a poluir, alertou a organização.

Kelly Stone, analista senior de políticas da ActionAid USA, também apontou o dedo aos mesmos problemas, sublinhando que o acordo contorna o financiamento climático em favor do “greenwashing”, e afirmando que “os mercados de carbono que permitem a compensação — que são essencialmente licenças para continuar a poluir — não são ação climática”.

Em Portugal, a associação ambientalista portuguesa Zero alinha com a ideia de uma cimeira dececionante. Presente em Baku na conferência, a Zero lamenta que o acordo de financiamento de 300 mil milhões de dólares anuais (cerca de 287,86 mil milhões de euros, ao câmbio atual), dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento, não tenha sido consensual, com vários países a não se poderem manifestar.

“Os interesses dos combustíveis fósseis tiveram uma forte influência na COP29, com uma pressão evidente para preservar os lucros exorbitantes do petróleo e do gás, refletida no resultado final, que deixou muito a desejar”, diz a Zero em comunicado, afirmando que a Arábia Saudita, por exemplo, enfraqueceu o consenso alcançado no ano passado no Dubai sobre a eliminação gradual dos combustíveis fósseis.

A associação portuguesa frisa que os Estados Unidos, “e outros países cuja prosperidade está vinculada a economias baseadas em combustíveis fósseis”, não se comprometeram a fornecer recursos suficientes para ajudar as nações de baixos rendimentos na transição para fontes de energia limpa.

“Mais uma vez, os países mais vulneráveis são deixados a pagar o preço dos impactos das alterações climáticas, enquanto os países desenvolvidos se esquivam às suas obrigações”, diz a associação.

Em síntese, diz a Zero, as negociações terminaram “num infeliz clima de controvérsia e apreensão”.

Países mais ricos entre as críticas e a satisfação por "uma nova era"

Uma das críticas à COP29 veio de França, através da ministra da Transição Ecológica de França, Agnès Pannier-Runacher, que disse que o acordo alcançado em Baku para o financiamento do clima é dececionante e "não está à altura dos desafios". A ministra foi mais longe e afirmou que a conferência foi marcada “por uma verdadeira desorganização e uma falta de liderança da presidência do Azerbaijão”.

Ainda assim, Agnès Pannier-Runacher elogiou a componente referente ao à venda de licencças de emissão, designado mesmo de “um acordo histórico, após nove anos de negociações, sobre um quadro voluntário de mercado de carbono, com o desejo de garantir a integridade ambiental”, e que “poderá permitir um verdadeiro desenvolvimento dos mercados internacionais de créditos de carbono”.

O comissário europeu Wopke Hoekstra alinhou também pelo elogio no que respeita ao mercado de carbono, saudando o acordo acordo de Baku como “o início de uma nova era”.

“Trabalhámos arduamente com todos vós para garantir que há muito mais dinheiro sobre a mesa. Estamos a triplicar o objetivo de 100 mil milhões de dólares, o que consideramos ambicioso. É necessário, é realista e é exequível”, afirmou o comissário europeu responsável pelas negociações sobre o clima e representante da União Europeia (UE) na cimeira.

O Presidente dos Estados Unidos saudou como um "passo importante" o acordo alcançado que prevê um financiamento anual de pelo menos 300 mil milhões de dólares (288 mil milhões de euros) para os países em desenvolvimento. Um número que é contestado como satisfatório pela Greenpeace que afirma que fica muito longe dos mil milhões de dólares (960 mil milhões de euros) exigidos pela sociedade civil e que não são totalmente financiados publicamente.

A reunião da COP29 como ponto principal da agenda a definição deste novo montante de apoio cujo acordo final foi saudado pelos países mais ricos e lamentado pelas organizações de defesa do clima.

*Com Lusa