“Os carteiros e funcionários das transportadoras também têm famílias e também gostariam, certamente, de se poder resguardar. Numa situação excecional como esta, consideramos de extrema importância sermos solidários”, lê-se na página ‘online’ da Miss Shoelaces & co, que trabalha a partir do Porto.

Foi com esta mensagem que Sónia Teixeira, proprietária da loja ‘online’ onde os atacadores não são “exceção” para um ‘look’ personalizado, avisou os seus clientes de que ia suspender as vendas presenciais e no ‘online’.

“Não achei que fosse coerente manter as vendas ‘online’, porque todas as pessoas merecem ser salvaguardadas e os distribuidores de correio têm um contacto muito próximo com várias pessoas”, afirmou hoje, em declarações à Lusa, Sónia Teixeira.

Desde que optou por suspender as vendas, no dia 13 de março, várias foram as mensagens que recebeu de pessoas a questionarem a sua decisão.

“As pessoas perguntavam-me o porquê, mas a partir do momento em que expliquei, perceberam. Aliás, a notícia do carteiro em Ermesinde contaminado e de 40 colegas que ficaram em quarentena, veio comprovar que a minha decisão não era de todo descabida e mais tranquila fiquei”, admitiu.

Apesar deste ser “um sacrifício” e estar a fazer “um grande esforço financeiro” para manter o seu negócio, de momento, Sónia Teixeira apenas aceita pré-reservas. Sem saber “os contornos” dos próximos tempos, pretende, ainda assim, “alargar a gama de produtos” e dar vida a novas ideias.

“Vamos acrescentar algumas coisas à coleção, desenvolver novas ideias e alargar a gama de produtos da marca. Agora, vai ser na parte criativa que vamos trabalhar até às coisas normalizarem”, garantiu.

À semelhança de Sónia Teixeira, também Ana Aguiar, proprietária da loja de roupa Endhora, decidiu, apesar das vendas serem “90% ‘online’”, fechar o espaço físico, em Braga, e arranjar forma das suas seis costureiras trabalharem a partir de casa.

“Só abrimos se houver alguma emergência, mas, dado que não há, porque não há festas, não estamos a atender ninguém desde a passada quinta-feira”, afirmou à Lusa Ana Aguiar, que viu as vendas “caírem 95% comparativamente ao ano passado”.

Apesar da logística ter “mudado”, uma vez que é a proprietária quem faz a recolha dos vestidos e peças de roupa junto das costureiras e as entrega nos CTT, Ana Aguiar sabe que este “não é um bem de primeira necessidade” e, por essa razão, não está, nem vai, para já, “apostar” nas vendas.

“O meu negócio não é um bem de primeira necessidade, nem de longe, nem de perto, portanto, não vamos estar a apostar sem saber que vamos ter o habitual retorno. Vamos deixar esta crise passar, deixar que as pessoas fiquem mais tranquilas, para podermos voltar a apostar no ‘marketing’”, admitiu.

Se, por um lado, há quem feche as portas e suspenda as vendas, mesmo que ‘online’, por outro, há quem se oriente pelas “regras das transportadoras”, como é o caso de João Figueiredo, fundador da plataforma ‘online’ de venda de roupa e acessórios Minty Square, sediada na Praça Coronel Pacheco, no Porto.

“Estamos a orientar-nos pelo que as transportadoras estão a ditar, enquanto tiverem a funcionar, nós continuamos a trabalhar”, afirmou o fundador da Minty Square, cujos 30 colaboradores estão, desde a semana passada, em regime de teletrabalho.

Apesar da “quebra de 50% do volume de vendas”, João Figueiredo vai continuar, até indicação em contrário, a atividade “remotamente”.

À Lusa, o fundador admitiu, no entanto, “recear” o futuro, especialmente por não considerar “nada de extraordinário” os apoios anunciados pelo Governo às pequenas e microempresas.

"As medidas de apoio às micro e pequenas empresas não são nada de extraordinário, portanto, há aqui bastante receio. Nós vivemos das vendas e, não existindo, torna-se difícil e temos toda uma estrutura e responsabilidade cívica”, salientou João Figueiredo.

Também Filipe Ferreira, proprietário da She by Jlo, sediada em Vila Nova de Gaia e cujo negócio é “totalmente ‘online’”, decidiu que os 11 colaboradores ficariam a trabalhar a partir de casa.

“A quebra nas vendas não foi muito significativa, ronda os 20 a 30%”, afirmou Filipe Ferreira, adiantando não estar preocupado “com o presente”, mas sim, com o que acontecerá daqui a três a quatro meses.

“Preocupa-me mais como é que economicamente o país vai ficar e como é que vamos recuperar. Não o agora, mas daqui a três, quatro meses, até porque estamos a passar por grandes investimentos”, contou.

Apesar de estar a investir em novas instalações e criar um novo ‘site’ para a marca, que requer “trabalhos mais especializados”, Filipe Ferreira admitiu que não vai recorrer a apoios do Governo, uma vez que ainda tem “algum fundo de maneio”.

“O poder de compra é uma coisa que me preocupa, não me tira o sono, como se costuma dizer, mas preocupa”, concluiu o proprietário da She by Jlo, cujas vendas vão continuar a ser asseguradas pela transportadora.

Portugal encontra-se em estado de emergência desde as 00:00 de quinta-feira, depois de a Assembleia da República ter aprovado na quarta-feira o decreto que lhe foi submetido pelo Presidente da República, com o objetivo de combater a pandemia de Covid-19, após a proposta ter recebido pareceres favoráveis do Conselho de Estado e do Governo.

O estado de emergência proposto pelo Presidente prolonga-se até às 23:59 de 02 de abril, segundo o decreto publicado quarta-feira em Diário da República, que prevê a possibilidade de confinamento obrigatório compulsivo dos cidadãos em casa e restrições à circulação na via pública, a não ser que tenham justificação.

Na quinta-feira, o Conselho de Ministros aprovou as medidas que concretizam o estado de emergência, como o “isolamento obrigatório” para doentes com Covid-19 ou que estejam sob vigilância ativa, sob o risco de “crime de desobediência”, a generalização do teletrabalho" para todos os funcionários públicos que o possam fazer, o fecho das Lojas do Cidadão, bem como dos estabelecimentos com atendimento público, com exceção para, entre outros, as mercearias e supermercados, postos de abastecimento de combustível, farmácias e padarias.