Iowa, 1 de Fevereiro de 2016. O pontapé de saída de uma campanha com oito meses de duração é dado, como sempre, neste estado do interior norte-americano. Um estado sem tendência de voto claramente definida e em que os candidatos mais apostam para conquistar os indecisos. Nesse dia, Trump perdeu para Ted Cruz na primária republicana. Hillary venceu Bernie Sanders por 4 mil votos, qualquer coisa como 0,3%.
Se Trump era um outsider, depressa se tornou num potencial vencedor. Ele é popular na América e uma figura respeitada pela fortuna que mantém. Tem livros lançados e foi estrela de um reality show, cuja frase icónica era “estás despedido”. Depressa veio ao de cima um discurso anti-imigração e altamente conservador, que chamou a atenção dos americanos. Trump não tinha experiência política em comparação com os seus adversários e isso constituía uma vantagem num sistema com vícios.
Do outro lado, Hillary Clinton apresenta-se com o mais qualificado currículo de todos os candidatos e os americanos conhecem-na desde sempre. Mas o castigo chegou sobre a forma de e-mail, na realidade, de muitos e-mails. O conteúdo estava assinado com um “C” de classificado, mas Hillary utilizou a sua conta de e-mail pessoal para lidar com ele.
Bernie Sanders foi uma surpresa, ganhou milhares de seguidores que apoiavam as suas políticas alternativas, tipicamente de esquerda com inspiração socialista. Disseram-lhe que ele era o rosto de uma revolução política, ele virou-se, sorriu e disse: “Não, não. Eu não, mas vocês [os eleitores] sim, são o rosto desta revolução”. Bernie perdeu as eleições primárias e o Partido Democrata viu reveladas comunicações internas que provavam o favorecimento de Hillary Clinton em prejuízo de Sanders.
A história de um candidato levado em braços e da primeira mulher nomeada por um dos grandes partidos
As convenções dos partidos não foram surpreendentes. Não tiveram momentos de viragem ou grandes imprevistos. Mas, se na Convenção Republicana Trump foi aclamado sem grande oposição, dentro da Convenção Democrata a sombra Sanders não desapareceu.
O senador do Vermont foi até ao fim nas eleições primárias. Foi até ao fim, mas perdeu, e na convenção pediu que os seus delegados votassem em Hillary. Aí, justificou-se dizendo que só um partido unido poderia derrotar Donald Trump, que à época crescia cada vez mais face à instabilidade interna do Partido Democrata.
Hillary saiu de Filadélfia como a primeira mulher nomeada por um grande partido. É histórico. E Sanders passou a participar em atividades de campanha de Hillary, como na passada madrugada.
Uma hostil corrida a dois
Findas as primárias, agora é um contra um. Trump e Hillary focaram-se em se desacreditar um ao outro. O milionário republicano definiu-se como o candidato da “lei e da ordem”, pautou o seu discurso com mensagens anti-imigração, e prometeu acabar com o Estado Islâmico.
Sempre polémico e combativo, Trump adotou uma posição menos hostil quando foi ao “The Tonight Show” de Jimmy Fallon. No programa de televisão, o candidato apareceu com uma postura amigável de um homem de negócios bem sucedido e deixou que Fallon lhe mexesse no cabelo.
Mas aqueles que viram este momento como um “turning point”, depressa se aperceberam que Trump não iria mudar uma vírgula na sua postura e atitude. O candidato republicano centrou as suas atenções no ponto fraco de Hillary: os e-mails. De tal forma que a levou a pedir desculpa e a falar sobre o assunto repetidas vezes.
Hillary, que sempre teve mais possibilidades de ganhar, não precisava de grandes argumentos para mostrar que Trump tinha uma postura que não agradava ao mundo, que não tinha conhecimentos políticos e que o seu temperamento não era indicado para ser ter um arsenal nuclear nas mãos.
Trump foi obrigado a pedir desculpa aos americanos depois da revelação de um vídeo polémico.
Hillary fez questão de pedir repetidamente a declaração fiscal de Trump, tendo revelado a sua. Trump garantiu que só o iria fazer quando ela revelasse o conteúdo dos e-mails classificados que enviou a partir do seu e-mail pessoal. Hillary acusa Trump de estar a querer esconder alguma coisa, ou de, talvez, “não ser tão rico como se pensa”.
Se a posição de Trump já era frágil, a revelação de uma “conversa de balneário” entre Trump e um apresentador de TV tornou as coisas mais complicadas. Trump dizia no vídeo, com mais de 10 anos, que só não se tinha envolvido com uma mulher porque ela era casada, mas ressalva: “Quando és famoso podes fazer o que quiseres, até agarra-las pelas partes intimas”.
Trump foi obrigado a pedir desculpa aos americanos depois da revelação do vídeo, mas várias figuras do Partido Republicano acabaram por lhe retirar o apoio. O próprio candidato a vice-presidente de Trump, Mike Pence, ficou “constrangido” com as palavras do seu braço-direito nesta corrida.
O Partido Republicano já antevê a perda das eleições e aposta tudo em manter o controlo do Senado e do Congresso para evitar que o Partido Democrata tenha uma hegemonia de poder nos Estados Unidos.
Donald Trump pergunta à América o que tem a perder se votasse nele. Barack Obama respondeu a Trump: "Tudo, tem tudo a perder".
As sondagens são unânimes. Aquelas que têm em conta a representação do colégio eleitoral e a representação estadual dão praticamente como certa uma vitória de Hillary e reduzem as possibilidades de Trump a uns escassos 10%.
90 minutos, um árbitro e um frente a frente final
Esta noite há um último debate. Provavelmente Hillary não irá apertar a mão a Trump. O clima está tenso desde o último encontro. E, nestas coisas, às vezes o melhor é mesmo manter a distância necessária para evitar erros desnecessários.
O modelo desta noite é semelhante ao do primeiro debate. Os candidatos respondem à vez às perguntas de Chris Wallace da Fox News. Durante 90 minutos não pode haver aplausos ou barulhos, assim mandam as regras que pedem concentração máxima aos dois candidatos. Mas o barulho vai manter-se fora das portas da Universidade do Nevada, em Las Vegas, onde decorre o debate. Milhões de americanos vão usar as redes sociais, e em especial o Twitter, para comentar cada momento deste último encontro antes da grande eleição de dia 8 de novembro.
Esta noite, Wallace leva para a discussão a economia norte-americana, a dívida, os direitos adquiridos, a imigração, o Supremo Tribunal (sendo que o próximo presidente tem de nomear um novo juiz, depois do candidato de Obama não ter sido aprovado) e temas internacionais.
Os debates chegam esta noite ao fim, mas a troca de acusações não. Restam três semanas. Três semanas que provavelmente não vão mudar o destino de uma eleição, mas que podem influenciar as escolhas e, como diz um provérbio bem português "até ao lavar dos cestos é vindima". Neste caso, até à votação do colégio eleitoral é eleição e o melhor é não arriscar cair em falso.
Donald Trump pergunta à América o que tem a perder se votasse nele. Barack Obama respondeu a Trump: "Tudo, tem tudo a perder". A perder ou a ganhar, certo é que já há quem prometa fazer as mais variadas coisas se o candidato republicano não chegar à Casa Branca.
Faltam 19 dias para as Eleições Americanas.
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