Quase 15% dos magistrados do Ministério Público têm risco elevado de ‘burnout’ e mais de 70% risco muito elevado para a saúde, segundo um estudo que recomenda mais acompanhamento da medicina trabalho, menos burocracia e reforço de quadros.
As conclusões e recomendações do “estudo sobre condições de trabalho, desgaste profissional e bem-estar dos/as magistrados/as do Ministério Público portugueses/as”, coordenado pelos investigadores Paula Casaleiro e João Paulo Dias, do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra são hoje apresentados numa sessão pública no Centro de Estudos Judiciários (CEJ), em Lisboa, pelas 14:30.
Os resultados preliminares já haviam sido apresentados no congresso do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) nos Açores, no início deste ano, sendo que às conclusões que apontam para níveis elevados de ‘burnout’ (desgaste profissional) e para elevados riscos para a saúde dos magistrados, se juntam recomendações para contrariar esse quadro.
A análise das respostas mostra que 32,7% dos magistrados revelaram um nível de risco “médio-alto” de 'burnout' e 14,8% risco “elevado” (perto de 225 magistrados do MP).
Os magistrados revelaram também fatores de risco psicossociais com “preocupantes riscos para a saúde”, devido às fortes exigências cognitivas (80,6%), ao elevado ritmo de trabalho (80,2%), ao conflito entre trabalho e família (78,7%) e às exigências emocionais (71,3%).
Em termos de indicadores de saúde, esta magistratura revelou valores “muito preocupantes” no nível de stresse (47,8%), destacando-se entre as causas o elevado volume processual (70,4%), a falta de apoio à conciliação entre trabalho e família (64,3%), o impacto das inspeções judiciais ao desempenho profissional (60,7%), a participação nos concursos para movimentos (57,2%) e a falta de oficiais de justiça (55,8%).
Perante os números, o estudo recomenda a “elaboração e implementação de um Plano de Segurança e Saúde no Trabalho (alargamento da medicina do trabalho)” e a “criação de um Gabinete de Saúde Ocupacional sistema de prevenção, deteção e intervenção”.
Sugere-se ainda a criação de um plano para melhorar a conciliação entre a vida familiar e profissional.
Em termos de organização e distribuição de trabalho, o estudo recomenda um “mapeamento de necessidades” e um reforço de quadros do MP, assim como dos oficiais de justiça, e uma avaliação da distribuição de recursos humanos pelos tribunais e serviços, “procurando otimização de recursos e melhor adequação ao volume de trabalho”.
Propõe-se uma redução, automatização e simplificação dos atos administrativos e burocráticos e uma melhoria dos instrumentos de gestão processual, avaliando critérios para acumulação e impactos remuneratórios.
É ainda sugerida formação inicial e contínua sobre riscos profissionais, gestão de trabalho, stress e ‘burnout’, uma revisão dos procedimentos de inspeção do MP, nomeadamente relativos a baixas médicas.
Para combater o quadro de risco de ‘burnout’, o estudo, que resulta de um acordo de colaboração entre o CES, no âmbito do Observatório Permanente da Justiça, e a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), propõe ainda a “autonomia administrativa e financeira da PGR, dotada dos meios necessários, para poder definir, criar e implementar as medidas necessárias para a gestão de recursos humanos e melhoria das condições de trabalho (maiores competências, maior responsabilização)”.
O inquérito decorreu em junho e julho de 2023 por questionário ‘online’, a 1.512 magistrados em exercício de funções nos tribunais, e teve uma taxa de resposta de 21,4%.
Em média, os inquiridos têm 46,4 anos de idade e 14,6 anos de serviço, cerca de 30% está atualmente deslocado da residência para exercer funções e 27,3% acumula funções noutro tribunal, juízo ou serviço para além do local de colocação.
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