Numa audição na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias no parlamento, a pedido da Iniciativa Liberal (IL) na sequência da fuga de cinco reclusos da prisão de Vale de Judeus a 07 de setembro, a deputada Mariana Leitão (IL) pediu que se clarificassem “incongruências entre declarações” do ex-diretor dos serviços prisionais, que negou que a fuga se relacionasse com falta de recursos, e dos sindicatos dos guardas prisionais, que a apontam como uma das causas.
Na resposta, o presidente do Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional (SNCGP), Frederico Morais, começou por apontar responsabilidades aos deputados e à Assembleia da República, recordando que já tinha alertado numa audição anterior, no início do ano, para a probabilidade de uma fuga perante o estado dos estabelecimentos prisionais e a falta de guardas.
“Esta casa é também culpada por tudo isto. (…) Nas últimas duas décadas os serviços prisionais foram completamente abandonados”, acusou Frederico Morais, que viria numa intervenção posterior a acrescentar que não queria responsabilizar os deputados diretamente, mas frisar que representam partidos que integram habitualmente governos.
Considerou ainda “lamentáveis todas as afirmações” do ex-diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais, Rui Abrunhosa Gonçalves, que se demitiu na sequência da fuga, e insistiu nas falhas de segurança do estabelecimento prisional (EP) de Vale de Judeus, apontando, por exemplo, que um sistema de deteção de movimentos está avariado há cinco anos e que se estivesse em funcionamento a fuga teria sido evitada.
Já Júlio Rebelo, presidente do Sindicato Independente do Corpo da Guarda Prisional (SICGP), afirmou, por seu lado, que as torres de vigia, entretanto desativadas, deviam voltar a funcionar, explicando numa intervenção posterior que o sistema de videovigilância atualmente em uso devia existir apenas como complementaridade a essas torres, que se cumprissem a função de ter em permanência um guarda armado a vigiar o perímetro do EP, o que funcionaria como elemento dissuasor de eventuais tentativas de fuga.
Criticou o que considerou ser uma “aposta na reinserção social” e um “abdicar da segurança” no sistema prisional, defendendo que prisões e reinserção social devem voltar a ser separadas, exigência na qual foi acompanhado por Frederico Morais, que considerou a fusão materializada na criação da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) como um “casamento com divórcio anunciado”.
Frederico Morais reiterou que os guardas prisionais “não serão bode expiatório” para a fuga de Vale de Judeus e adiantou que não existe nas investigações em curso nada contra os guardas prisionais.
Os dois representantes sindicais insistiram na degradação das prisões, na falta de condições de trabalho para os guardas, na falta de profissionais, apontando necessidades de cerca de mais 1.500 guardas, para ocupar postos de base, mas também de chefias.
Frederico Morais deixou críticas às nomeações de dirigentes para a DGRSP e para a direção das cadeias sem concurso, num processo que classificou como sendo “por lobby” mas deixou sem resposta os deputados que o instaram a ser mais concreto nas críticas.
A Associação Sindical de Chefias do Corpo da Guarda Prisional declinou o convite para estar presente na audição conjunta, considerando que as diferentes responsabilidades no sistema prisional entre guardas e chefias deviam levar a audições em separado.
Cinco reclusos fugiram a 07 de setembro do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, em Alcoentre, no concelho de Azambuja, distrito de Lisboa.
A ministra da Justiça só falou publicamente da fuga três dias depois para afirmar que resultou “de uma cadeia sucessiva de erros e falhas muito graves, grosseiras e inaceitáveis”.
Com base no relatório da auditoria à atuação dos serviços de vigilância e segurança, que foi elaborado pela Divisão de Serviços de Segurança da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, Rita Alarcão Júdice explicou que a fuga dos reclusos “demorou seis minutos” e só foi detetada cerca de uma hora depois.
Os evadidos são dois cidadãos portugueses, Fernando Ribeiro Ferreira e Fábio Fernandes Santos Loureiro, um cidadão da Geórgia, Shergili Farjiani, um da Argentina, Rodolf José Lohrmann, e um do Reino Unido, Mark Cameron Roscaleer, com idades entre os 33 e os 61 anos.
Foram condenados a penas entre os sete e os 25 anos de prisão, por vários crimes, entre os quais tráfico de droga, associação criminosa, roubo, sequestro e branqueamento de capitais.
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