Questionado pela deputada do CDS-PP Cecília Meireles durante a sua segunda audição na comissão parlamentar de inquérito à recapitalização e gestão do banco público, José Pedro Cabral dos Santos disse que se tratava de uma situação não "normal" sociedades do tipo pedirem empréstimos tão avultados.
"Não só não era normal como também não houve mais nenhuma instituição que tivesse pedido à Caixa um montante dessa grandeza", afirmou José Pedro Cabral dos Santos em resposta à deputada centrista.
Cecília Meireles disse então se a Fundação José Berardo "era uma instituição particular de solidariedade é porque a sua principal finalidade era solidária", e perguntou se "era habitual" instituições deste cariz "pedirem empréstimos para comprarem ações".
Cabral dos Santos respondeu que não era a si que a deputada deveria fazer a pergunta, mas face à insistência de Cecília Meireles, que abriu o âmbito da sua pergunta a "fundações de grande dimensão", o ex-diretor acabou por dizer que não conhecia "mais nenhuma" que se tenha endividado como a Fundação José Berardo.
"Quando vejo uma fundação com uma conta corrente de 350 milhões de euros para comprar ações, acho estranho", afirmou Cecília Meireles.
Mais tarde, o deputado do PCP Duarte Alves mencionou um documento da direção de gestão de risco da CGD que dizia que "só 2,5% do ativo [da Fundação] é que estava ligado aos fins estatutários", e classificou de "estratagemas" a utilização de várias sociedades para concessão de crédito a Berardo.
Em 2015, segundo uma auditoria da EY à Caixa Geral de Depósitos (CGD), a exposição do banco público à Fundação José Berardo era de 268 milhões de euros, depois de uma concessão de crédito de 350 milhões de euros para compra de ações no BCP, dando como garantia as próprias ações, que desvalorizaram consideravelmente e geraram grandes perdas para o banco público.
Os estatutos da Fundação José Berardo, Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS), consultados pela Lusa e também pela edição do Diário de Notícias da Madeira de 10 de novembro de 1994, indicam que os bens doados pelo empresário terão de "prover à habitação, sustento, educação, saúde e demais despesas, encargos e alimentos do seu fundador, seu cônjuge e descendentes".
Os estatutos indicam ainda que "no caso da fundação se extinguir antes da morte do fundador ou do último dos seus descendentes, os bens afetos à fundação pelo fundador, ou dos que estejam no lugar deles, reverterão para o mesmo fundador ou seus descendentes".
Em 2017, a Fundação José Berardo gastou um milhão de euros em atividades de cariz social, mas tinha um passivo de 998,5 milhões de euros.
De acordo com a Lei-Quadro das Fundações, a Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros tem o poder de extinguir uma fundação "quando as atividades desenvolvidas demonstrem que o fim real não coincide com o fim previsto no ato de instituição".
Questionada pela Lusa em 20 de maio sobre se equacionava tal cenário, a Secretaria-Geral respondeu que "não deixará de considerar todos os mecanismos ao seu dispor resultantes da Lei-Quadro das Fundações".
Em 2018, a Fundação José Berardo não cumpriu o prazo legal para publicitação das contas de 2018 no seu 'site'.
De acordo o Estatuto das IPSS, revisto pela última vez em 2014, "as contas do exercício são publicitadas obrigatoriamente no sítio institucional eletrónico da instituição até 31 de maio do ano seguinte a que dizem respeito", o que não aconteceu no caso das contas de 2018.
Em 04 de junho, a Lusa questionou a Fundação José Berardo sobre o motivo para a não publicitação das contas, mas não obteve resposta. Também contactou a Segurança Social da Madeira, mas não foi possível obter resposta sobre eventuais sanções a entidades que não cumpram este requisito previsto no Estatuto das IPSS.
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