As declarações de Guterres na abertura da reunião do Conselho de Segurança da ONU dedicada ao conflito em curso no Médio Oriente tiveram o efeito de uma pedrada no charco.
O secretário-geral da ONU condenou inequivocamente os “atos de terror” e “sem precedentes” de 7 de outubro perpetrados pelo Hamas em Israel, dizendo que “nada pode justificar o assassinato, o ataque e o rapto deliberados de civis”.
mas (e é um grande mas...)
Guterres disse ser “importante reconhecer” que os ataques do Hamas “não aconteceram do nada”, frisando que o povo palestiniano “foi sujeito a 56 anos de ocupação sufocante”.
“Viram as suas terras serem continuamente devoradas por colonatos e assoladas pela violência; a sua economia foi sufocada; as suas pessoas foram deslocadas e as suas casas demolidas. As suas esperanças de uma solução política para a sua situação têm vindo a desaparecer”, prosseguiu Guterres.
Mas o líder da ONU fez a ressalva: “as queixas do povo palestiniano não podem justificar os terríveis ataques do Hamas”, frisando ainda que “esses ataques terríveis não podem justificar a punição coletiva do povo palestiniano”.
Não há, todavia, ressalvas que cheguem e a reação de Israel foi imediata.
O chefe da diplomacia israelita, Eli Cohen, dirigiu-se diretamente ao secretário-geral das Nações Unidas (ONU) para lhe perguntar "em que mundo vive". “Sem dúvida, não é no nosso”.
Ao mesmo tempo, o embaixador israelita na ONU, Gilad Erdan, denunciava na plataforma X (antigo Twitter) o “discurso chocante” de Guterres, a quem acusou de ver a situação de “uma forma distorcida e imoral”.
Na mesma rede social, Erdan exigiu a demissão de Guterres, alegando que este "demonstra compreensão pela campanha de assassínio em massa de crianças, mulheres e idosos, não está apto para liderar a ONU. Peço-lhe que renuncie imediatamente”.
“Não há qualquer justificação ou sentido em falar com aqueles que demonstram compaixão pelas mais terríveis atrocidades cometidas contra os cidadãos de Israel e o povo judeu. Simplesmente não há palavras”, acrescentou.
Horas mais tarde, Gilad Erdan avançou que "obviamente, o nosso Governo [Israelita] terá de reavaliar as relações com a ONU e os seus funcionários que estão estacionados na nossa região".
Com menos repercursão, mas igual sentido foram as declarações de Macron, que no encontro de hoje com líder palestiniano, Mahmoud Abbas, disse que “uma vida palestiniana equivale a uma vida francesa que equivale a uma vida israelita”.
“Vejo e oiço o sofrimento da população civil em Gaza, e, para França, nada pode justificá-lo”, disse ainda Macron, quando Abbas lhe pediu para trabalhar no sentido de "fazer parar a agressão" à Faixa de Gaza.
Emmanuel Macron voltou a instar ao relançamento de um processo de diálogo político entre Israel e os palestinianos e ressalvou que o futuro dos palestinianos passa por uma luta “impiedosa e sem ambiguidades contra o terrorismo”.
Mas acrescentou: “não haverá paz duradoura sem o reconhecimento do direito legítimo do povo palestiniano a um território e a um Estado" e "não haverá paz duradoura se o povo palestiniano e as suas autoridades não reconhecerem o Estado de Israel e a importância da sua existência e da sua segurança”.
Ninguém coloca em causa o direito de Israel se defender, mas com milhões retidos em Rafah com acesso limitado a ajuda humanitária cresce a pressão sobre o país liderado por Benjamin Netanyahu.
*Com Lusa
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