"Sempre considerei que a discrição é bem melhor do que o espalhafato. Tentei dar um contributo útil para o Ministério Público (MP)", começou por dizer Lucília Gago, na primeira entrevista que concede em seis anos. "Desde que iniciei o meu mandato que dotámos o gabinete de imprensa com mais elementos. Nunca pensei que a crítica fosse tão forte neste campo", acrescentou Gago.
"Esse parágrafo é da minha responsabilidade e do gabinete de imprensa, tal como a sua divulgação. Numa operação que envolveu buscas, detenções, na residência oficial do Primeiro-Ministro (PM), houve o cuidado de fazer essa menção", explicou Lucília Gago sobre o parágrafo relativo a António Costa na Operação Influencer.
"Ninguém disse que o PM à data estava indiciado pela prática de um crime. A avaliação do senhor primeiro-ministro é uma avaliação pessoal que não cabe ao MP fazer", acrescentou. "O magistrado que escutou o PM entendeu que não havia indícios e não o constitui como arguido, sendo que o inquérito ainda está a decorrer", afirmou.
"Quando fui à presidência da República, o comunicado já estava feito. O que acontece é que este não pode ser difundido porque ainda havia, nesse momento, uma detenção por consumar. Não iríamos avançar com a divulgação pública de uma operação que ainda não estava completa", explicou sobre a visita a Marcelo Rebelo de Sousa, antes da divulgação do comunicado.
Lucília Gago explicou também que não se "sente responsável pela demissão do primeiro-ministro", explicando que o estatuto de António Costa deve ser o "de testemunha, neste momento".
"Temos magistrados de elevado nível técnico nestas investigações. A competência técnica deles nunca foi colocada em causa", acrescentou a atual PGR. Um conjunto de pessoas entendeu que havia matéria relevante".
Quando questionada sobre as escutas telefónicas ao antigo ministro João Galamba, que se terão prolongado por quatro anos no âmbito da Operação Influencer, a atual PGR considerou que tal “não é desejável, nem é comum”, mas defendeu que se foi decidido manter as escutas foi porque no seu decurso “se foram conhecendo elementos, sendo que o prolongamento destas foi “sujeito, a espaços e a autorização” judicial.
No que toca ao Caso das Gémeas, Lucília Gago recusa fazer comentários sobre o comentário do Presidente da República (PR) e o "maquiavelismo" da instauração do inquérito sobre este caso, mas afirmou que "estas frases, ouvidas por um universo grande de pessoas, causaram algum desconforto a um conjunto de pessoas. Não fui eu que instaurei este processo em específico. Quando fui à presidência da República, não conhecia este inquérito, soube depois. Não existiu nenhum propósito de concertação de datas e claro que não recebi as declarações do PR com agrado".
Em relação à Madeira, onde a Polícia Judiciária realizou, em 24 de janeiro, cerca de 130 buscas domiciliárias e não domiciliárias no âmbito de um processo que investiga suspeitas de corrupção ativa e passiva, participação económica em negócio, prevaricação, recebimento ou oferta indevidos de vantagem, abuso de poderes e tráfico de influência, Gago não acha normal o "tão longo prazo para detenções sem medidas de coação aplicadas", lamentando que esta situação tenha acontecido. "Aquilo que aconteceu neste caso foi excepcional, mas o MP fez o que lhe competia fazer".
A Procuradora Geral da República Lucília Gago termina o mandato nos próximos três meses e em relação ao futuro Lucília Gago afirmou que a entrevista da Ministra da Justiça constitui um mola para as seguintes declarações por sua parte: "essas declarações são indecifráveis porque a senhora ministra diz que o diagnóstico está feito. Também não me disse numa audiência que lhe pedi no início do seu mandato. Depois, são declarações graves por estarem a dizer que o MP tem falta de liderança, falta de capacidade de comunicação e que tem de haver uma restituição de confiança. Isso é muito direto e incisivo. Concluo que estas declarações imputam ao MP tudo de mau sobre o que acontece na justiça".
"Nunca coloquei a questão de uma possível demissão. O meu mandato leva o cunho de rigor, objetividade e isenção. Estou consciente de que há uma campanha orquestrada por parte de pessoas que têm, ou tiveram, responsabilidades de relevo na Nação", atirou Lucília Gago. "Há uma pressão política sobre a justiça".
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