De acordo com fonte oficial da Comissão parlamentar de Cultura, o requerimento para audição da ministra da Cultura “sobre as políticas de devolução de património cultural às ex-Províncias Ultramarinas” foi aprovado com os votos a favor do PS e do Chega e os votos contra do PSD e do Livre.
Na semana passada, o líder do Chega, André Ventura, justificou o pedido de audição com declarações de Dalila Rodrigues, nas quais defendeu a devolução de obras de arte a ex-colónias, antes de ser ministra da Cultura.
Em entrevista ao Observador, em novembro, Dalila Rodrigues, que era então diretora do Mosteiro de Jerónimos e da Torre de Belém, defendeu ser “fundamental assumir o imperativo da restituição de bens apropriados, independentemente das condições da sua receção”, considerando que não se pode “continuar a exercer um poder tutelar sobre os locais de proveniência indevida das peças”.
O Chega pretende que Dalila Rodrigues “explique a sua posição sobre a devolução de obras de arte” às ex-colónias e o líder do partido disse que iria também pedir ao Ministério da Cultura “dados reais e concretos se, até ao momento, houve alguma devolução ou entrega de qualquer obra de arte ou objeto museológico”.
Ventura alegou que, caso se restituam obras de arte às ex-colónias, se estaria “a abrir uma caixa de Pandora” e Portugal também teria de ser “ressarcido de espanhóis, franceses ou outros”.
A discussão e a pressão sobre museus e instituições europeias e americanas para que devolvam património retirado de vários países que estiveram sob o domínio de antigas potências coloniais, como Reino Unido, França, Alemanha e Bélgica, tem aumentado nos últimos tempos.
Em Portugal, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, disse no final de abril que o país deve liderar o processo de assumir e reparar as consequências do período do colonialismo e sugeriu como exemplo o perdão de dívidas, cooperação e financiamento.
No dia 27, à margem da inauguração do Museu Nacional da Resistência e da Liberdade, em Peniche, Marcelo Rebelo de Sousa referiu que, ao longo da sua presidência, tem defendido que Portugal tem de “liderar o processo” em diálogo com esses países.
“Não podemos meter isto debaixo do tapete ou dentro da gaveta. Temos obrigação de pilotar, de liderar este processo, porque se nós não o lideramos, assumindo, vai acontecer o que aconteceu com países que, tendo sido potências coloniais, ao fim de x anos perderam a capacidade de diálogo e de entendimento com as antigas colónias”, alertou.
Questionado pelos jornalistas, o Presidente da República defendeu que o atual Governo deveria continuar com o processo de levantamento dos bens patrimoniais das ex-colónias em Portugal, iniciado pelo anterior Governo, para posteriormente devolvê-los.
Três dias antes, num jantar com correspondentes estrangeiros em Portugal, o chefe de Estado já tinha reconhecido responsabilidades de Portugal por crimes cometidos durante a era colonial, sugerindo o pagamento de reparações pelos erros do passado.
Depois das declarações de Marcelo Rebelo de Sousa, o Governo afirmou, em comunicado, que “não esteve e não está em causa nenhum processo ou programa de ações específicas com o propósito” de reparação pelo passado colonial português e defendeu que se pautará “pela mesma linha” de executivos anteriores.
Sobre a devolução de património com origem nas ex-colónias, em novembro de 2022, em entrevista ao semanário Expresso, o então ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, afirmava que “a forma eficaz para tratar este tema é com reflexão, discrição e alguma reserva”, antes de realçar: “A pior forma de tratar este tema é criar um debate público polarizado”.
Nos últimos anos, têm sido várias as ocasiões em que as autoridades do património portuguesas têm garantido que não houve qualquer pedido de devolução por parte das antigas colónias.
Em 2019, numa altura em que o debate sobre o assunto já estava em curso, em particular a nível europeu, o diretor do Museu Nacional de Etnologia, Paulo Costa, disse à agência Lusa que, até ao momento, não tinha recebido qualquer pedido de restituição de peças dos 80 países que ali estão representados.
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