A CNN internacional (canal 156 em Portugal) exibirá o frente a frente com a duração de uma hora e meia, excepcionalmente cedo. Normalmente os candidatos à presidência esperam ser nomeados pelos seus partidos antes de debater. Mas nestas eleições de novembro, que segundo as sondagens serão muito acirradas, debatem mais cedo de modo a evitar fazê-lo durante o verão.
Os adversários são os dois candidatos mais velhos da história e um presidente contra um antecessor que nunca reconheceu a derrota em 2020 e que também foi considerado culpado num caso de pagamentos ocultos a uma atriz pornográfica.
"A grande questão é qual parte do público (além dos fãs de política) prestará atenção a um debate tão cedo", disse Donald Nieman, analista político e professor de história na Universidade de Binghamton, no estado de Nova Iorque.
O aborto, o estado da democracia e os conflitos além das fronteiras, como as guerras na Ucrânia e entre Israel e o grupo palestiniano Hamas, são questões que preocupam os eleitores.
Forte animosidade
Mas o que mais preocupa o eleitorado, segundo algumas sondagens, é a inflação, a segurança na fronteira com o México e o fluxo de migrantes, que Trump promete cortar pela raiz se voltar à Casa Branca com deportações em massa, porque acredita que eles "envenenam o sangue" do país.
Os dois homens, que expressam forte animosidade política e pessoal, preparam-se de formas diferentes para este primeiro confronto.
O presidente democrata, de 81 anos, partiu para a residência rural de Camp David para se preparar para o debate, que ocorrerá sem público e com regras rigorosas. O microfone do candidato será cortado quando não for a sua vez de falar e as respostas serão cronometradas. Trump encerrará o debate.
Se as regras forem respeitadas, será evitada a tensão do último debate, em 2020, quando Biden deixou escapar: "Quer calar a boca, pá?", quando Trump o interrompia continuamente.
O milionário republicano de 78 anos continua com os comícios. A sua equipa diz que ele não precisa se preparar.
Os dois políticos vão tentar convencer os eleitores indecisos, cujos votos serão determinantes em alguns estados.
Pontos fracos
"O ponto fraco de Trump é a sua retórica extremista", afirma Kathleen Hall Jamieson, professora de Comunicação na Universidade da Pensilvânia (leste).
Biden diz ser o último bastião da democracia americana, contra um rival acusado em vários processos criminais e que declarou ao canal Fox News que atuará como "ditador" durante um dia para "fechar a fronteira" com o México caso ganhe as eleições.
O democrata tentará tocar na questão do direito ao aborto, sobre a qual o magnata republicano tem uma posição ambígua.
Mas Biden terá de convencer na forma. Nos seus comícios, Trump costuma ridicularizar as suas gafes e a sua falta de jeito ao caminhar.
"O ponto fraco de Biden é o de se perceber se ele tem a acuidade mental necessária para o cargo", diz Kathleen Hall Jamieson.
Trump sugeriu publicamente que seu rival poderia estar "dopado" durante o duelo de quinta-feira.
O republicano é apenas três anos mais novo e faz discursos difíceis de compreender, mas, segundo as sondagens, os americanos estão mais preocupados com o estado físico e intelectual do democrata.
"Trump beneficiaria se seguisse um guião, destacando as fraquezas de Biden em relação à inflação e à imigração e atenuando a linguagem enfática", disse Nieman.
O republicano garante que não "subestima" o democrata. Em 2020, a atitude extremamente agressiva do ex-magnata do mercado imobiliário voltou-se contra ele.
Direito ao aborto torna-se tema central
O aborto tornou-se um tema incontornável no duelo eleitoral entre Donald Trump e Joe Biden, dois anos depois de o Supremo Tribunal dos Estados Unidos ter anulado o direito constitucional à interrupção à gravidez.
A 24 de junho de 2022, esse tribunal, reformado durante o mandato presidencial de Trump, revogou a sentença que garantia o direito federal das americanas a interromper a gravidez e deixou que cada estado legislasse sobre a matéria.
Nesse mesmo dia, os primeiros estados proibiram o aborto no seu território, fazendo com que clínicas encerrassem as suas atividades ou se mudassem para um estado onde a interrupção da gravidez ainda é permitida.
Agora, o país está dividido entre os vinte estados que decretaram proibições ou restrições, principalmente no sul e no centro, e os costeiros, que consolidaram ou fortaleceram.
A decisão do Supremo Tribunal teve fortes repercussões políticas: os conservadores perderam quase todos os referendos ou votações sobre o direito ao aborto, inclusive em estados como Ohio, Alabama e Kansas, em votações surpreendentes.
Nos últimos dois anos, "o movimento pró-aborto descobriu que os americanos se importam com o direito ao aborto muito mais do que tinham previsto", afirma Mary Ziegler, professora de direito da Universidade da Califórnia.
Kamala Harris na linha de frente
Os democratas esperam que esse tema traga votos, sobretudo entre as mulheres e os jovens, com vista às eleições presidenciais de novembro.
O presidente Biden, um católico praticante que durante muito tempo se mostrou prudente sobre o tema, tornou-se um defensor do direito ao aborto.
"Donald Trump é o único responsável por este pesadelo", afirmou Biden num comunicado nesta segunda-feira.
A sua equipe de campanha divulgou um vídeo no qual uma mulher culpa Trump por terem lhe negado tratamento no Louisiana depois de um aborto espontâneo com 11 semanas de gravidez.
A companheira de viagem de Biden, Kamala Harris, primeira mulher a tornar-se vice-presidente dos Estados Unidos, percorre o país há meses para mobilizar os democratas sobre o assunto.
Nesta segunda, estará no Arizona. Um dos Estados que mais pode influenciar as eleições presidenciais. Nos últimos meses, viu-se envolvido em intensos debates em torno de uma lei de 1864 que praticamente proibia o aborto e que finalmente foi revogada pela sua governadora democrata.
Os democratas também promovem minireferendos sobre o aborto em vários estados em todo o país, para que ocorram no mesmo dia das eleições presidenciais.
A razão é simples: podem mobilizar eleitores possivelmente pró-democratas que, de outro modo, não se viam tentados a ir votar.
A ambiguidade de Trump
As sondagens apoiam-no. Segundo uma songaem da Fox News publicada na quarta-feira da semana passada, 47% dos eleitores considera que o tema do aborto é "extremamente importante" na hora de decidir entre Biden e Trump.
Trump repete diversas vezes que a sentença do Supremo Tribunal foi possível graças às nomeações de juízes feitas por ele, mas se mostra deliberadamente ambíguo sobre o tema.
"Deve seguir o seu coração nesse assunto, mas lembre-se também que se deve ganhar eleições", disse Trump numa mensagem de vídeo no início de abril.
Como exemplo, o candidato republicano não está a fazer campanha com a promessa, muito impopular, de proibir o aborto em todo país mediante uma lei federal, como gostaria a direita religiosa.
"O melhor que pode fazer se a sua postura é impopular (...) é não esclarecê-la", afirma a professora Mary Ziegler.
Por tudo isso, é muito provável que Biden ataque seu rival com esse tema durante o primeiro debate entre os dois, previsto para a noite de hoje.
Migração, uma arma explosiva no debate entre Biden e Trump
A política migratória deve inflamar o debate. Donald Trump acusa os migrantes de "envenenar o sangue" dos Estados Unidos, e Joe Biden fará o possível para se distanciar de seu adversário republicano.
Ambos estão certos de que, segundo as sondagens, boa parte do eleitorado se preocupa com a segurança na fronteira com o México e com o fluxo de migrantes.
Estas são as principais propostas de ambos os candidatos às presidenciais de novembro.
Donald Trump
A migração é o eixo central do programa eleitoral do magnata republicano, cujo discurso anti-imigração aumenta à medida que se aproxima a data das eleições.
Durante o seu mandato, de 2017 a janeiro de 2021, aplicou uma política de "tolerância zero", que tratava como criminosos os migrantes que tentavam entrar ilegalmente nos Estados Unidos, levando muitos a perder a guarda dos filhos. Também começou a construir um muro na fronteira com o México (onde antes existiam cercas).
Trump mantém a linha dura e promete medidas "tão draconianas quanto necessárias", como "fechar a fronteira" com o México, retomar a construção do muro e deportar "em massa".
"Será a maior deportação da história do nosso país", repete.
Nos seus comícios, Trump afirma que os migrantes "envenenam o sangue do país", o que lhe valeu comparações com Adolf Hitler, e "vêm de prisões e cadeias", "de instituições psiquiátricas e asilos".
"Estão a matar o nosso país", são "criminosos", diz, embora as estatísticas do FBI mostrem uma redução de 1,7% dos crimes violentos e 6,1% dos homicídios no país em 2022 em relação a 2021.
Nos últimos dias, surpreendeu ao propor autorizações de residência permanente a estrangeiros que se formem em universidades americanas.
Se voltar à Casa Branca, o republicano de 78 anos ameaça impor taxas aos países que não controlarem o fluxo de migrantes com destino aos Estados Unidos.
Joe Biden
Os republicanos culpam as políticas de Biden por favorecerem o direito de asilo aos migrantes, muitos latino-americanos.
Biden acusa Trump de sabotar uma tentativa bipartidária de encontrar uma solução.
"Não vou demonizar os imigrantes", "não vou separar famílias", afirma o democrata de 81 anos, que garante não "politizar" a questão.
Chegou à Casa Branca com a promessa de promover uma política migratória "mais humana" e um caminho para a cidadania a 11 milhões de migrantes sem documentos, mas encontrou oposição dos conservadores no Congresso e a sua proposta nunca foi votada.
Agora está entre a espada e a parede: satisfazer a ala mais à esquerda do Partido Democrata ou impedir a entrada de migrantes.
Tenta convencer o eleitorado de que é pró-ativo em relação aos migrantes que chegam fora das "vias legais" promovidas pelo seu governo, como agendar uma consulta por aplicação, cumprir os trâmites nos países por onde passam e tentar um asilo humanitário.
Nas últimas semanas, Biden assinou um decreto que restringe a entrada de migrantes pela fronteira com o México enquanto houver mais de 2.500 travessias irregulares em sete dias e endureceu as normas para os pedidos de asilo.
O seu governo também impulsionou uma lei que acelera a recusa de asilo aos que representam perigo para a "segurança nacional ou pública".
O presidente concedeu proteção migratória a quase meio milhão de venezuelanos e vai simplificar o processo para estrangeiros casados com americanos obterem uma autorização de residência, o green card, sem precisar sair do país.
Afirmou ainda que irá acelerar a concessão de vistos a graduados no ensino superior americano, desde que "tenham recebido uma oferta de emprego altamente qualificada".
Esta medida beneficiará os "dreamers"(sonhadores), que migraram para os Estados Unidos ainda crianças e estão protegidos por um programa federal (Daca), que lhes permite viver e trabalhar legalmente no país.
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