São quarenta sinos, um por cada um dos 33 passageiros e sete membros da tripulação do Boeing 757 do voo 93 da United Airlines que se despenhou naquela região do Nordeste dos Estados Unidos há 20 anos, depois de ter sido sequestrado por quatro terroristas da Al-Qaeda.

Trata-se do quarto avião dos atentados de 11 de setembro de 2001, que se distinguiu dos outros três por não ter atingido o alvo em Washington, presumivelmente o Capitólio (sede do congresso, que estava em sessão nessa terça-feira de manhã) ou a Casa Branca.

Os atentados de 2001 mataram 2.977 pessoas em três locais distintos: nas Torres Gémeas do World Trade Center de Nova Iorque, no Pentágono, sede do Departamento de Defesa em Arlington (Virgínia), e em Shanksville (Pensilvânia).

Também morreram os 19 terroristas que sequestraram e pilotaram os quatro aviões usados na operação: cinco em cada um dos três aparelhos que atingiram as Torres Gémeas e o Pentágono, e quatro no que se despenhou a 20 minutos de voo de Washington.

Além da Torre das Vozes, adicionada ao memorial em 2018 e completada em 2020, o complexo naquele parque na Pensilvânia inclui uma parede de blocos de mármore branco polido com o nome de cada uma das vítimas, um centro educativo e uma calçada de granito preto que segue a trajetória do avião até ao ponto de impacto, assinalado por uma pedra de arenito de 17 toneladas.

O arquiteto principal do projeto, Paul Murdoch, disse à agência Associated Press que o memorial foi concebido com a ideia de que tinha de “funcionar de uma forma diferente” para poder resistir durante um longo período de tempo.

"Agora temos uma geração de pessoas que nem sequer tinha ainda nascido no 11 de Setembro. Então, como é que se fala com as pessoas desta nova geração - ou das gerações futuras?", disse o arquiteto de Los Angeles.

Uma das formas é através da Torre das Vozes, no sítio onde se calaram as vozes do voo 93.

As gravações da “caixa negra”, cruzadas com comunicações de controladores aéreos e chamadas telefónicas para familiares, permitiram concluir que passageiros e tripulantes, todos ou alguns, decidiram enfrentar os quatro sequestradores.

Treze pessoas fizeram 37 chamadas telefónicas a partir do Boeing 757 e ficaram a saber que dois aviões tinham sido lançados contra as Torres Gémeas.

Esse desfasamento deveu-se a um atraso de 25 minutos na partida do voo 93 provocado por problemas de tráfego aéreo.

A fita do tempo do 11 de Setembro mostra que o avião descolou de Newark às 08:42 locais (13:42 em Lisboa), quatro minutos antes de o Boeing 767 do voo 11 da American Airlines chocar com a Torre Norte do WTC, em Manhattan.

A segunda torre foi atingida às 09:03, e o Pentágono às 09:37.

Às 09:25, a autoridade federal de aviação encerrou o espaço aéreo dos EUA a todos os voos civis por se desconhecer a dimensão do ataque.

Os quatro terroristas, que seguiam na primeira classe, entraram no ‘cockpit’ às 09:28.

Foi quando controladores aéreos em Cleveland ouviram uma voz gritar “Mayday”, o código para emergências, com um ruído de luta em fundo.

Trinta e cinco segundos depois, ouviram uma voz dizer – ou ordenar? – “saiam daqui!”.

Os controladores não sabiam de que avião chegavam as vozes, mas um deles suspeitou que fosse do voo 93 devido a uma mudança de altitude não autorizada.

Em terra, às 09:30, o Presidente George W. Bush confirmou que os Estados Unidos enfrentavam uma “tragédia nacional” depois de dois aviões terem explodido contra as Torres Gémeas.

Dois minutos depois, os controladores em Cleveland e aviões na mesma frequência ouviram a voz de um dos terroristas: "Senhoras e senhores, aqui o comandante. Por favor, sentem-se e permaneçam sentados. Temos uma bomba a bordo. Por isso, sentem-se”.

O avião mudou então de rumo sem autorização dos controladores, que desviaram outros aviões da direção que o voo 93 tinha tomado.

Pelas 09:35, ouviu-se uma voz de mulher a suplicar três vezes “eu não quero morrer”.

Depois, uma assistente de bordo usou um telefone do avião para comunicar a situação à United Airlines em São Francisco e disse que os sequestradores tinham matado uma das suas colegas com uma faca.

O funcionário que atendeu a chamada notou uma voz “chocantemente calma”.

Este foi o primeiro dos 37 telefonemas feitos do voo 93, a maioria a partir de telefones de bordo instalados nas últimas nove filas de lugares.

Em pelo menos dois telefonemas, familiares foram informados de que os passageiros iam tentar atacar os sequestradores e um deles disse mesmo que estava a ser feita uma votação sobre o plano.

Numa chamada iniciada às 09:44, um passageiro comunicou que o comandante e o copiloto estavam feridos ou mortos, que um dos terroristas tinha um cinto vermelho com uma bomba à cintura e que outros dois estavam fechados no ‘cockpit’.

Disse também que o avião estava a subir e a descer e tinha mudado de direção, e que ele e outros passageiros estavam a planear fazer alguma coisa.

Colocou o telefone no chão, mantendo-se a ligação até ao fim do voo, o que permitiu à operadora ouvir uma voz a dizer mais tarde: “Estão prontos? OK, vamos a isto!”.

Em telefonemas seguintes, alguns admitiram que o avião também deveria ser usado para um ataque como nas Torres Gémeas e vários passageiros despediram-se.

A evacuação do Capitólio e da Casa Branca iniciou-se às 09:45.

O ataque aos sequestradores começou às 09:58, e durou cinco minutos.

Ouviram-se ruídos de luta, gritos, ordens, conversas entre os terroristas sobre o que fazer, com o avião sacudido por manobras repentinas antes de mergulhar de nariz a cerca de 900 quilómetros por hora.

Às dez horas, três minutos e nove segundos, a transcrição da “caixa negra” registou uma voz a dizer em árabe “Alá é grande, Alá é grande” e um suspiro.

Depois, as vozes do voo 93 calaram-se.

Já só se ouvem quando o vento as ressoa na Torre das Vozes.

*Por Paulo Alves Nogueira, agência Lusa