A escritura desta instituição sem fins lucrativos foi assinada a 12 de abril de 2002 e em outubro de 2003 a Raríssimas foi reconhecida oficialmente como Instituição Particular de Solidariedade Social de utilidade pública, com o objetivo de partilhar experiências e defender os portadores de doenças mentais e raras e suas famílias.
A associação presta “serviços diferenciados, de excelência técnica e científica, que permitem ao utente a melhoria significativa da sua qualidade de vida”, segundo se lê no site da instituição.
“Existimos porque existem cerca de 800 mil portugueses que precisam de nós e milhões de cidadãos pelo mundo fora que fazem do nosso ‘know-how’ a sua bandeira”, prossegue a apresentação da Raríssimas.
O prestígio de uma associação que serve quase 200 utentes atraiu a atenção de várias personalidades, como a antiga primeira-dama Maria Cavaco Silva, que foi madrinha da instituição e levou à Raríssimas a rainha de Espanha, Letizia.
Mas também figuras da esfera política como o ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, José Vieira da Silva, como membro da assembleia-geral da Raríssimas, e o ex-secretário de Estado da Saúde Manuel Delgado, consultor da associação a troco de mais de três mil euros mensais, e que se demitiu na terça-feira, após a denúncia do alegado uso por Paula Brito e Costa de dinheiro da Instituição Particular de Solidariedade Social para fins pessoais.
Entre as irregularidades apontadas, conta-se a compra de vestidos de alta costura, de bens alimentares caros e o pagamento de deslocações, apesar de ter um carro de alta gama pago pela Raríssimas. Além disso Paula Brito e Costa terá também beneficiado de um salário de três mil euros, de 1.300 euros em ajudas de custos e de um Plano Poupança Reforma que rondava os 800 euros mensais.
Paula Brito e Costa anunciou na terça-feira que se afastava da liderança da instituição que fundou há 15 anos e à qual mantém um vínculo de trabalho, como diretora-geral, tal como o marido da ex-presidente e o filho, ao qual chamava “o herdeiro da parada”.
A Casa dos Marcos, na Moita, que tem “um modelo assistencial único e de dimensão transnacional”, segundo a apresentação do projeto no site da associação, é o maior projeto da associação, que beneficia quase 200 utentes, servidos por cerca de 150 funcionários.
A Casa dos Marcos constitui “uma resposta inovadora às manifestações de necessidades comunicadas por doentes portadores de patologia rara, respetivas famílias, cuidadores e amigos, através da disponibilização de um conjunto de serviços especializados que incluem unidade de lar residencial, unidade de residência autónoma, centro de atividades ocupacionais, Clínica dos Marcos, centro de desenvolvimento e reabilitação, Trace-RD, unidade de cuidados continuados integrados e campos de férias”.
Uma assembleia-geral foi marcada a 03 de janeiro para eleger os titulares dos órgãos sociais em falta, após a saída da sua presidente.
Mas o escândalo já foi transportado para o centro do debate político, que não se confinou à situação do antigo secretário de Estado da Saúde, mas também ao próprio ministro Vieira da Silva, chamado ao parlamento na próxima semana para explicar o seu envolvimento com a Raríssimas, o conhecimento que teria sobre a gestão da associação e de denúncias que já existiram nos serviços da Segurança Social
Elementos da Inspeção-geral do Ministério do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social iniciaram esta semana uma inspeção a pedido do ministro do Trabalho, Solidariedade Social e Trabalho.
O Ministério Público também começou a investigar a instituição, após uma denúncia anónima.
A par do escândalo, os trabalhadores da Raríssimas estão apostados em manter a funcionar a instituição, enquanto o trabalho dos terapeutas e cuidadores continua, mas com preocupação assumida por funcionários e familiares.
Com a demissão da presidente da instituição, o acesso às contas bancárias está para já bloqueado e os funcionários pedem uma comissão de gestão ou uma direção temporária que tenha poder e possa tomar decisões.
Pais de utentes da Casa dos Marcos, que preferiram não ser identificados, afirmaram à Lusa que estão preocupados, sobretudo “com os funcionários e com os meninos, que lhes faltem os cuidados de que precisam”.
A mãe de uma criança utente da instituição afirmou que “os terapeutas são pessoas muito capazes”, pelo que mantém confiança total ao entregar o seu filho na Raríssimas.
“Quando isto se soube, os responsáveis pelos terapeutas tiveram o cuidado de falar com os pais, porque são excelentes profissionais, e fizeram questão de separar as águas”, contou.
No entanto, os pais estão preocupados porque, se alguma coisa acontecer à Raríssimas, “não há alternativa”.
“Não enterrem isto”, é o apelo final de uma das mães que depende da Raríssimas para dar qualidade de vida a uma filha com incapacidade total.
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