Na comissão eventual de revisão constitucional, o coordenador do PSD André Coelho Lima fez questão de começar a sua intervenção por “uma pedagogia” sobre o tema e de se dirigir até ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
“O ponto que aqui se discute é apenas e só permitir o acesso a metadados pelos serviços de informações e não para investigação criminal, porque isso já é permitido”, frisou.
Aludindo a declarações recentes do chefe de Estado na cerimónia dos 40 anos do Tribunal Constitucional, André Coelho Lima referiu que, perguntado se a questão dos metadados constitui um desafio para a justiça portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu ser “um tema que pode ser tratado em matéria de revisão constitucional”.
“Estas declarações devem da nossa parte, Assembleia da República, respeitando o principio da separação de poderes, levar à necessidade e urgência deste esclarecimento”, contrapôs o deputado do PSD.
Coelho Lima salientou que as várias decisões anuladas em tribunais nos últimos meses pela inconstitucionalidade da lei dos metadados “nada têm a ver” com os trabalhos que estão em curso na revisão constitucional, que apenas irá decidir se os serviços de informações devem ou não ter acesso a estes dados de contexto (que podem incluir informações sobre tráfego ou de localização do equipamento, mas não conteúdo das comunicações).
Na mesma linha, o coordenador do PS na comissão, Pedro Delgado Alves, lamentou também “alguns equívocos” nesta discussão, frisando que a forma de acesso e conservação dos metadados das comunicações para efeitos de investigação criminal está a ser discutido num grupo de trabalho parlamentar específico.
“Aqui o que abordamos é a possibilidade de acesso a metadados no âmbito da atividade dos serviços de informações”, disse, salientando, tal como o PSD, que Portugal é dos poucos países em que os serviços de informações não têm acesso a este tipo de dado.
Neste artigo, relativo à inviolabilidade do domicílio e da correspondência, PS e PSD têm formulações diferentes, mas manifestaram-se disponíveis para convergências, sendo suficientes para os dois terços necessários à revisão constitucional.
Entre os restantes partidos, apenas o Chega manifestou abertura para apoiar esta alteração, com o deputado Rui Paulo Sousa a frisar que, sobretudo numa altura em que a Europa enfrenta uma guerra, os serviços de informações devem ter acesso a mais meios.
Muito crítico, o deputado da Iniciativa Liberal João Cotrim Figueiredo alertou que PS e PSD, “com textos supostamente virtuosos”, querem limitar direitos individuais e ameaçou, se esta alteração for aprovada, ir “até ao fim para provar que viola os limites materiais da revisão constitucional”.
Também o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, se manifestou frontalmente contra e criticou em especial o PS por incluir na sua proposta, entre as razões que podem justificar o acesso das ‘secretas’ aos metadados, a “proliferação de armas de destruição maciça”.
“É de mau gosto, no mínimo, que o PS tenha incluído esta referência, quando passam 20 anos da malfadada cimeira das Lajes [que antecedeu a guerra do Iraque]”, disse.
Pelo PCP, Alma Rivera manifestou-se igualmente contra as propostas de PS e do PSD, considerando não ser aceitável “aumentar os poderes dos serviços de informações”.
A deputada única do PAN, Inês Sousa Real, considerou que, para que fosse possível a consagração constitucional deste princípio, o acesso das ‘secretas’ teria de estar “o mais balizado possível”, o que considerou não acontecer nas formulações propostas.
Rui Tavares, pelo Livre, considerou não haver justificação para alterar a Constituição neste ponto, e acabou a intervenção a “rogar a PS e PSD que tenham muito cuidado e coloquem trancas à porta na limitação de direitos fundamentais”.
Nas propostas hoje discutidas, o PSD opta uma formulação mais genérica, determinando que “a lei pode autorizar o acesso do sistema de informações da República aos dados de contexto resultantes de telecomunicações, sujeito a decisão e controlo judiciais”.
Já o PS, mantendo a proibição de “toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal”, introduz uma exceção a este princípio geral: “O acesso, mediante autorização judicial, pelos serviços de informações a dados de base, de tráfego e de localização de equipamento, bem como a sua conservação, para efeitos de produção de informações necessárias à salvaguarda da defesa nacional, da segurança interna de prevenção de atos de sabotagem, espionagem, terrorismo, proliferação de armas de destruição maciça e criminalidade altamente organizada, nos termos a definir pela lei”.
Os socialistas pretendiam ainda incluir uma nova alínea neste artigo da Constituição para consagrar que “a vigilância eletrónica do domicílio só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstos na lei”, com o PSD a dizer “não ver vantagem” nesta modificação.
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