O ex-ministro da defesa, que foi chefe de gabinete no primeiro mandato de Rui Moreira como presidente da câmara do Porto – desde final de novembro de 2013 até novembro de 2015 – afirmou que, “ao fim de tantos anos” em que o processo Selminho estava na câmara, parecia-lhe “evidente” que “toda a gente soubesse” que a imobiliária era da família de Rui Moreira.
“Era um caso que estava há bastante tempo dentro da câmara. Para mim, era evidente que toda a gente sabia. Ao fim de tantos anos, não era concebível que não se soubesse”, disse Azeredo Lopes, admitindo agora que os serviços jurídicos desconhecessem essa ligação familiar.
Rui Moreira está a ser julgado no Tribunal de São João Novo, no Porto, no processo Selminho, onde é acusado de prevaricação, por favorecer a imobiliária da família (Selminho), da qual era sócio, em detrimento do município, no litígio judicial que opunha a autarquia à imobiliária, que pretendia construir um edifício de apartamentos num terreno na calçada da Arrábida.
Em 28 de novembro de 2013, poucas semanas após tomar posse como presidente da câmara, o autarca passa essa procuração ao advogado Pedro Neves de Sousa, por indicação do seu então chefe de gabinete, o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, com a justificação de que, só assim, estariam salvaguardados os interesses do município.
Azeredo Lopes contou ao tribunal que, menos de um mês após tomar posse, Rui Moreira entrou no seu gabinete a perguntar se podia assinar uma procuração “urgente” para representar o município numa audiência preliminar, dando conta de que envolvia a Selminho, propriedade da sua família.
O também professor de direito internacional revelou que só nesse momento é que soube da ligação familiar do autarca à imobiliária, classificando o comportamento de Moreira como “diligente” ao procurar saber se podia assinar uma procuração para um processo em que uma das partes era a empresa da família.
À pergunta de Moreira, o então chefe de gabinete respondeu que este devia assinar a procuração, pois, só assim, poderiam salvaguardar os interesses do município.
Azeredo Lopes admitiu, contudo, que partiu de um pressuposto errado: de que se tratava apenas de uma procuração exclusiva para representação do município, sem qualquer poder de controlo ou de decisão, como era o caso desta procuração, em que eram atribuídos poderes especiais.
A procuração permitiu ao advogado Pedro Neves de Sousa, em nome do município, chegar a acordo com a Selminho, que previa o reconhecimento da edificabilidade do terreno em causa, por alteração do Plano Diretor Municipal (PDM), ou, caso isso não fosse possível, indemnizar a Selminho num valor a ser definido em tribunal arbitral.
Ouvido minutos depois de Azeredo Lopes, o então diretor municipal do departamento jurídico do município, entre fins de setembro de 2013 e 11 de dezembro de 2013, afirmou desconhecer “em absoluto” a procuração em causa.
“Desconheço em absoluto essa procuração. Se ela é de 28 de novembro [de 2013] como é referido, eu ainda estava em funções e não conheço essa procuração. O departamento jurídico e contencioso devia estar envolvido neste processo e não foi”, declarou Miguel Queirós.
Na primeira sessão de julgamento, realizada na segunda-feira, o presidente da Câmara do Porto admitiu que foi “incauto” ao assinar uma procuração a um advogado para representar o município no litígio que mantinha com a Selminho, sublinhando que o fez por indicação de Azeredo Lopes.
O julgamento prossegue na quinta-feira, com a inquirição de mais testemunhas, entre as quais a antiga vice-presidente da câmara Guilhermina Rego, que foi quem assinou o acordo entre o município e a Selminho.
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