A notícia referente ao processo de candidatura de Alexandre Guerreiro ao Conselho Científico no Centro de Investigação de Direito Público da Faculdade de Direito (CIDP) da Universidade de Lisboa veio a público nesta sexta-feira, 25 de março, primeiro através de uma notícia da revista Visão e, horas mais tarde, pelo Expresso.
Em causa estava a reunião do Centro de Investigação de Direito Público da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, órgão que tutela a investigação no domínio do Direito Público nas áreas de Ciência Política, Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito Europeu e Direito Internacional, em que teria sido decidido não integrar, por agora, o comentador de política internacional no lugar de investigador para que tinha sido convidado.
Os termos em que a notícia foi conhecida não foram exatamente coincidentes. A Visão começou por falar de "exclusão" de Alexandre Guerreiro, sendo que o Expresso, citando uma conversa com o coordenador científico do CIDP, Carlos Blanco de Morais, referia que a candidatura estava suspensa para "posterior análise".
Em reação à notícia, na própria noite de sexta-feira, Alexandre Guerreiro começou por afirmar na sua conta de LinkedIn desconhecer a situação relatada, manifestando o seu repúdio pela forma como está a ser tratado pela comunicação social. "Isto é insanidade pura de órgãos de comunicação social na tentativa desesperada de fazer um linchamento público de alguém com um discurso desalinhado com a narrativa oficial!", escreveu, acrescentando que vai "levar esta gente toda a responder nos tribunais".
Já este sábado, Alexandre Guerreiro fez uma nova publicação, desta vez na sua conta no Twitter, em que afirma ter sido "atualizado" sobre o que aconteceu na reunião do Centro de Investigação de Direito Público da Faculdade de Direito, mas não adianta qualquer informação sobre o que se passou, apenas diz que "como esperava, não fui expulso. Nem sequer rejeitado".
Em declarações ao SAPO24, Alexandre Guerreiro afirmou que "não fazia ideia que a reunião ia ter lugar, nem quando estava prevista a votação". "A minha adesão ficou suspensa porque alguns investigadores eram contra. Sem razões oficiais, mas causa estranheza ver um professor dizer à Visão que nunca me ouviu falar mas votou contra. Não devia ter-se abstido?", adiantou em resposta à questão sobre a informação que lhe teria sido dada sobre o que se passou .
As posições em defesa da Rússia no atual contexto da invasão da Ucrânia são referidas como a causa provável da decisão de suspender a integração de Alexandre Guerreiro no CIDP, mas nenhum dos presentes na reunião confirmou formalmente essa indicação.
"Compreendo que ainda há muita gente a tentar perceber como deve gerir um fruto da casa que tem uma posição dissonante da maioria da doutrina ocidental. Será um golpe terrível à ciência se, afinal, for mesmo uma sanção por delito de opinião. O Professor Oliveira Ascensão uma vez tomou posição dura e agressiva contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Todos na Faculdade de Direito de Lisboa bateram pala. Agora eu seria um problema? Seria desonesto", afirma.
A integração no Centro de Investigação de Direito Público da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa não se processa por candidatura, mas sim por convite, segundo adiantou Alexandre Guerreiro. "Não fui eu a fazer a proposta. Não se processa por candidatura. Fui convidado após o doutoramento, depois sugerido e proposto com o apoio de alguns professores da casa. Naturalmente que eu tenho interesse em afiliar-me a um centro de Investigação que não só é o da minha alma mater como é o único de Direito com nota excelente da FCT. Devemos estar agregados a um centro para nos apresentarmos no exterior".
Na reunião que decidiu a suspensão da integração de Alexandre Guerreiro, todos os outros nomes convidados a integrar o centro foram aprovados por unanimidade.
O episódio traz a público a discussão sobre a liberdade de expressão, uma vez que o comentador tem sido criticado pelas suas opiniões pró-Rússia, mas, nas declarações ao Expresso, Carlos Blanco de Morais fez questão de sublinhar que não há delito de opinião na universidade.
Quem é Alexandre Guerreiro
Alexandre Guerreiro foi durante mais de seis anos anos oficial de informações no Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), tendo cessado funções em 2014. Nos termos da Lei n.º 50/2014 que estabelece a orgânica do SIED, após seis anos de serviço ininterruptos, todos os funcionários ou agentes com contrato administrativo ou dirigente em comissão de serviço no SIED, no Serviços de Informações de Segurança (SIS) ou nas estruturas comuns adquirem automaticamente vínculo definitivo ao Estado, salvo se cessarem funções por passar a exercer a sua profissão noutra entidade ou organismo, público ou privado.
No caso de Alexandre Guerreiro, com mais de seis anos de serviço, foi exonerado de funções pelo despacho n.º 6141/2015 , com efeitos a partir de 17 de outubro de 2014.
O vínculo ao Estado foi mantido, como prevê a lei, com a criação, no mesmo despacho, de um posto de trabalho na Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros, na categoria de técnico superior.
Paralelamente, manteve um percurso académico e, em 2021, apresentou uma tese de doutoramento na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa em que defendia a legalidade jurídica da invasão e posterior anexação da Crimeia pela Rússia em 2014, em que foi, segundo informação prestada pelo próprio, "aprovado com distinção por unanimidade".
A sua adesão às posições russas é anterior à invasão da Ucrânia, tendo participado inclusive numa conferência realizada pela Universidade do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia para partilhar, segundo referiu nas suas redes sociais, "a minha investigação à intervenção dos EUA e da NATO na Ucrânia".
Após a invasão da Ucrânia, a 24 de fevereiro, tornou-se uma presença regular nas televisões, nomeadamente na SIC Notícias, tendo as suas posições face à invasão gerado polémica devido à defesa da Rússia.
Artigo editado às 10h00 de 28 de março para eliminar menção à nota em tese de doutoramento, uma vez que o sistema de avaliação é outro.
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