"Eu vejo a ausência de um programa de modernização, a ausência de um plano de ambição, que acho que deve andar a volta daquilo que é uma questão vital no nosso país, que é o salário. O salário tem de subir no nosso país e através do salário virá tudo”, disse o antigo primeiro-ministro, numa entrevista transmitida no domingo à noite na CNN Portugal, na véspera do regresso da Operação Marquês aos tribunais.

Na entrevista, refere, que espera que a esquerda, “agora que o país voltou à direita”, não queira transformar-se “numa direita 2” e considerou que, durante anos, o que o PS fez quanto ao investimento público foi "adotar o discurso da direita".

O antigo primeiro-ministro considerou ainda a atitude do partido com o ex-secretário-geral Pedro Nuno Santos, "mesquinha e confrangedora", ao querer atribuir-lhe a responsabilidade pela derrota eleitoral.

José Sócrates deixou igualmente criticas ao ex-primeiro-ministro António Costa, que acusa de ter chegado ao Governo pela "porta dos fundos", numa referência a William Pitt, até hoje o mais novo primeiro-ministro de sempre no Reino Unido, que depois de muitos ataques pela falta de experiência respondeu: "Eu fui eleito pelo povo e nomeado pela rainha. Não cheguei aqui pela porta dos fundos".

Deixou também críticas ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que vê como uma "personagem sem consequência".

Sobre o passado recente da relação entre PS e o Presidente da República, afirmou: “O PS fez uma aliança com Marcelo de forma não explícita: nós não apoiamos nenhum e tu, como Presidente, apoias-me como primeiro-ministro. Foi feito de forma manhosa, escondida. O PSD já apoiou um candidato socialista, quando Mário Soares se candidatou — mas foi à frente de toda a gente.”

“Foi muito mau. Em primeiro lugar, porque este Presidente revelou ser quem sempre foi e termina assim, desta forma que estamos a ver: uma personagem sem consequência — como sempre foi, nunca foi outra coisa. Espero que o próximo Presidente não faça da intriga a ação política”, acrescentou.

Quanto ao atual primeiro-ministro, Luis Montenegro, diz que "ganhou esporas" e, através da "resiliência e combatividade", se transformou "num personagem político respeitável"

Sócrates lembrou que algumas das reformas que o novo Governo quer implementar são ideias anunciadas por si há 20 anos, como é o caso do TGV, da localização do novo aeroporto ou da terceira travessia sobre o rio Tejo.

“O Governo retomou estes projetos, enquanto o PS parecia que tinha vergonha deles, por ventura por serem do Sócrates e, portanto, nem sequer fala neles”, afirmou.

Questionado sobre um eventual regresso à vida política, recusa e acrescenta: “Tudo isto [a Operação Marquês] foi feito para me afastar da vida política”.

"O objetivo sempre foi político: impedir-me de me candidatar a Presidente. Mas não pondero, isso colide com o meu ponto de vista. Não consigo ver na política uma arma para combater judicialmente. Não quero usar a política, quero travar a batalha judicial. Quero que se respeite a lei", diz, citado pelo Expresso.

Quanto às presidenciais, diz que não vota nem em Gouveia e Melo, nem em Marques Mendes, nem em António José Seguro, mas que “votaria em António Vitorino, se ele fosse candidato”.

Sobre a subida do Chega nas últimas eleições legislativas, afirma: “Os partidos democratas o que têm de fazer é combatê-lo. Não vejo que se possa fazer de outra forma”.

Entende que os portugueses votaram "num partido que tem implícito um apelo à violência política, à agressão, ao insulto, à boçalidade política e ao primarismo da política" e diz não acompanhar a ideia de que quem votou no Chega se equivocou ou votou no partido por outro motivo que não seja as suas propostas e o discurso político do Chega.